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A redução da maioridade penal

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> ponto contraponto <

Quase unanimidade entre a população brasileira, a redução da maioridade penal gera controvérsia no meio jurídico. Advogados e juristas divergem. Estabelecida na legislação brasileira em 1940, a maioridade penal aos 18 anos pode sofrer alterações. Com a divulgação de crimes violentos cometidos recentemente por jovens, o país retomou a discussão em relação à  da maioridade penal para 16 anos. Ministros do Supremo Tribunal Federal, como Gilmar Mendes e Marco Aurélio Mello, já se manifestaram contra a alteração das regras. Eles defendem, no entanto, uma aplicação mais efetiva do Estatuto da Criança e Adolescente (ECA), seja com o estabelecimento de melhores condições de educação, de saúde e de pleno emprego aos jovens, para evitar infrações, seja com tratamento adequado nas unidades de internação, reduzindo a  reincidência e facilitando a ressocialização. Essa é também a opinião do juiz de Direito José Dantas de Paiva, convidado pela TRIBUNA DO NORTE para opinar sobre o tema. “O que ocorre, hoje, é que o adolescente ao ser apreendido cometendo um ato infracional, grave ou não, é apresentado ao sistema de justiça, que o julga, aplicando a medida socioeducativa mais adequada e ela não é executada, simplesmente, porque o Estado não se preparou para recebê-lo”, afirma o juiz. No campo oposto, o advogado criminalista, Paulo César é favorável à redução da maioridade para 16 anos e afirma que “é um contrassenso afirmar que menor infrator não tem discernimento para responder pelos seus atos, uma vez que ele detém discernimento para assumir a autoria dos delitos praticados em conjunto com maiores delinquentes”. Confira os artigos na íntegra:

Uma resposta à sociedade
Paulo César Costa, advogado Criminalista e presidente da Comissão Criminal da OAB-RN
É notório o clamor social em busca da redução da maioridade penal, uma vez que a sensação de impunidade cresce, seja pelo não cumprimento das medidas sócio educativas, seja pela não submissão do adolescente infrator ao crivo do Código Penal brasileiro. Segundo o instituto MDA, 92,7% dos brasileiros são a favor da redução, o que revela quase uma unanimidade na opinião nacional.
Marcos Pereira, considerado grande especialista do direito penal, é favorável à medida redutora e entende que deve ser implementada por meio de uma emenda constitucional, sem alterar o ECA, seguindo o exemplo da legislação de outros países, que submetem o adolescente de 16, e até mesmo de 14 anos, às sanções do Código Penal. Marcos ressalta ainda que o Brasil é um dos poucos países que mantêm a idade em 18 anos para que haja responsabilização penal.

Já expressei em diversas entrevistas e comentários, bem como em debates sobre o tema, que sou a favor da redução para 16 anos, pois entendo que a permissão para o voto a partir dessa idade admite a posse de maturidade para escolher os representantes do país, sendo assim, o jovem não está isento da responsabilidade pelos seus atos. Entre outros argumentos favoráveis à redução estão os avanços no comportamento dos jovens, os quais com menos de 18 anos já constituem famílias, buscam emancipações e querem toda liberdade. Ademais, o adolescente de hoje não pode ser comparado ao da década de 1940 (ano em que foi elaborado o Código Penal Brasileiro). As mudanças entre os períodos foram notáveis, menos o direito de punir jovens que cometem crimes brutais.

É um contrassenso afirmar que menor infrator não tem discernimento para responder pelos seus atos, uma vez que ele detém discernimento para assumir a autoria dos delitos praticados em conjunto com maiores delinquentes, para liderar quadrilhas, planejar assaltos e, na hora da abordagem, lembrar perfeitamente de informar à autoridade policial que é menor de 18 anos, ficando, dessa forma, impune, independente do delito cometido, principalmente pela falência do sistema sócio-educativo. Sendo assim, além de não ser detido, esse jovem é usado como estratégia para delitos pelos maiores que são submetidos ao crivo do Código Penal.

Outro paradoxo é defender que inserir o adolescente no sistema prisional fará com que ele tenha contato com criminosos de alta periculosidade e o aproximará das escolas do crime. Por isso, defendo a redução com algumas ressalvas, nas quais os adolescentes na faixa etária entre 16 e 18 anos seriam custodiados em pavilhões específicos e que, apenas para os crimes de maior gravidade, os jovens a partir de 16 anos responderiam pelo Código Penal, ressaltando ainda que, para uma maior eficácia com a redução da maioridade, seria preciso que o ECA seja aplicado ao adolescente com idade inferior a 16 anos, e assim, com essas medidas, a criminalidade diminuiria consideravelmente, haja vista que o índice de criminalidade entre os jovens de 16 a 18 anos é acentuada.

Alguns juristas e entidades defendem que a solução é trabalhar na origem do problema, que é social; todavia, é praticamente utópico acreditar que apenas isso resolveria uma questão tão grave.  Ademais, quantas décadas seriam necessárias para a resolução de todos os problemas sociais? A aplicação da redução seria uma medida imediata, uma resposta urgente à sociedade.  Logo, deve ser amplamente considerada e discutida, visando a restituição do sentimento de segurança pelos cidadãos, não desconsiderando as medidas de resolução dos problemas sociais a longo prazo.

Não há porque mudar

José Dantas de Paiva, juiz de Direito e Coordenador Estadual da Justiça da Infância e da Juventude
Indagado pelos redatores do Jornal Tribunal do Norte “se seria favorável a redução da idade penal, para punir adolescentes autores de atos infracionais”, respondi que não. Continuo defendendo a manutenção da lei como está, tanto a Constituição Federal quanto o Código Penal e o Estatuto da Criança e do Adolescente, mesmo contrariando a maioria dos brasileiros. Em recente pesquisa, divulgada pelos meios de comunicação social, 93% (noventa e três por cento) dos brasileiros quer a alteração legislativa, para atingir adolescentes em plena fase de desenvolvimento.

Alegam os defensores da redução da idade penal, como principal argumento, é que o adolescente, hoje, já pode ser eleitor, a partir dos dezesseis anos de idade, com a responsabilidade de votar e escolher os seus representantes no Congresso Nacional, por que não responder pelos seus atos?

Na verdade, existem vários mitos, no imaginário social, que levam a sociedade a pedir a punição penal para o adolescente autor de ato infracional. O primeiro deles é que ele fica impune em razão de sua conduta, “e que casa e batiza e não acontece nada”; depois, que toda violência contemporânea é provocada por ele; ainda, que o adolescente é violento e que se houvesse a redução da idade penal os índices de violência diminuiriam, dentre outros.

A vontade popular, nesse caso, reflete os equívocos que são noticiados. De fato, os adolescentes de hoje têm muito mais informações que no passado e sabem o que quer. Podem até votar e acessar as redes sociais. Porém, a realidade que cerca a maioria dos jovens brasileiros é muito diferente. O perfil do adolescente, infrator ou não, é de quem sequer tem a certidão de nascimento. Se não tem o documento básico, essencial, para se tornar cidadão, como ser eleitor?
Além disso, o argumento que o adolescente não é punido, é equívoco. A lei prevê sanções, sim, para o adolescente que venha a cometer ato infracional (crimes ou contravenções penais). Nesse aspecto, a legislação brasileira é considerada uma das melhores do mundo. O Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo prevê regras e princípios próprios que, se aplicados, dá a resposta necessária ao adolescente, à sua família e à sociedade. Não há porque mudar.

Agora, por outro lado, os Estados da Federação e o DF, inclusive os municípios, não acompanharam e se estruturaram para se adequar a evolução legislativa e, agora, querem mudar a lei, para retroagir a um passado já conhecido. O que ocorre, hoje, é que o adolescente ao ser apreendido cometendo um ato infracional, grave ou não, é apresentado ao sistema de justiça, que o julga, aplicando a medida socioeducativa mais adequada, que pode ser a internação (privação de liberdade), e ela não é executada, simplesmente, porque o Estado não se preparou para recebê-lo, sob o argumento que não tem vagas. E, realmente, não tem.
O CEDUC de Parnamirim está fechado; o de Caicó só tem dezoito vagas e o de Mossoró, somente vinte. Portanto, no Estado do RN só existem 38 (trinta e oito) vagas para os adolescentes sentenciados a medida socioeducativa de internação, por falta de prioridade do gestor estadual. E, agora, se questiona: é mudar a lei ou adequar o sistema de atendimento socioeducativo? Quanto à questão levantada, de que a violência é causada por adolescentes, também é outro equívoco. Dados do Conselho Nacional de Justiça – CNJ, mostram que eles respondem, apenas por 10% da violência de hoje, e, deste percentual, menos de 15% é de atos infracionais graves, com violência contra a pessoa. O que a criança, o adolescente e o jovem precisam são de políticas públicas, de promoção aos seus direitos fundamentais.

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