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Ao sugerir venda de ativos, presidente do TJ inclui a Caern

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» ENTREVISTA » Cláudio Santos  – Presidente do Tribunal de Justiça

Aldemar Freire e Vicente Neto

O presidente do Tribunal de Justiça, desembargador Cláudio Santos, apresenta uma sugestão para o governador Robinson Faria repor os recursos que foram sacados da Previdência Estadual: a venda de ativos do Estado, entre o quais empresas públicas — como a Caern (Companhia de Águas e Esgotos do Rio Grande do Norte) —, terrenos ou outros órgãos que poderiam ser privatizados.
O fundamental, destaca o desembargador, é fazer essa reposição dos valores retirados, porque o governo do Estado, após os sucessivos saques, não pode deixar a Previdência sem os recursos. Cláudio Santos lembra que a preocupação com o assunto não é de hoje. Ainda no governo Rosalba Ciarlini ele tomou uma decisão judicial que impedia o saque antecipado para cobrir gastos com folha de pagamento dos servidores ativos ou aposentados. O dinheiro teria que ficar, como previsto originalmente, para pagamento de aposentadorias e pensões futuras. “A se permitir que os gestores do Estado usem esse valor financeiro (…) estar-se-ia compactuando com verdadeira malversação de recursos”, disse, na ocasião. Uma lei estadual, logo depois, aprovada na Assembleia, autorizou os saques para complementar o pagamento da folha de aposentados.

Nesta entrevista, o desembargador avalia como positivo o ano no Tribunal, um período de corte em gratificações e enfrentamento com sindicalistas . Ele considera que houve um arrefecimento do ambiente e conta com uma retomada do diálogo com o Sindicato. Mas continua enfático ao afirmar que é preciso mudanças na estrutura do Estado. Refere-se à necessidade de dificultar o acesso à Justiça para demandas que considera irrelevantes e poderiam ser resolvidas por policiais e órgãos como o Procon. E reconhece que é preciso mudar também a “cultura interna”.
Cláudio Santos defende a reposição de recursos do Fundo da Previdência
Qual avaliação o senhor faz das atividades deste ano no Tribunal?
Foi um ano muito positivo. Desde o meu discurso destaquei a necessidade de fazer economia e respeitar o dinheiro público. Não e um desafio apenas o Judiciário do Rio Grande do Norte, mas o Poder Judiciário brasileiro. O Judiciário entrou neste discurso de que todos têm direito a tudo de graça, inclusive o acesso à Justiça. Isso terminou por formar uma cultura no sentido de que estamos à disposição para resolver tudo, inclusive questões pouco importantes. No mundo civilizado, vão para o juiz questões importantes. Mas venderam a ideia político-ideológica de que todo o povo tem acesso à Justiça e de forma muito aberta. Isso, lamentavelmente, não é possível.

Por quê?
Essa demanda exagerada, insuflada por tal política, essa ideologia, é muito cara aos cofres do Estado, ao Poder Público e redunda em uma despeça que a população não tem condição de arcar com o pagamento dos tributos.

E o senhor conseguiu implantar medidas para efetivar uma tendência diferente desta “cultura”?

Pela minha pessoalidade, não. Eu sou integrante de um colegiado e tenho limites. Inclusive os próprios limites que são impostos pela estrutura. Mas meu objetivo, como está no meu discurso de posse, é mudar um pouco essa trajetória, essa tradição, de se buscar sempre mais dinheiro para o Judiciário para fazer mais, atender mais. Há uma busca muito grande por mais funcionários, mais juízes, mais serviços, mais fórum, por juízes leigos, por conciliação. Enfim, o Poder Judiciário no Brasil é exageradamente grande para as possibilidade e para um Estado moderno. Eu defendo um enxugamento do Judiciário brasileiro. Na relação custo benefício, todos os ramos do Judiciário estão se agigantando. Basta ver a Justiça eleitoral, trabalhista e estadual. A Justiça Estadual tem 80% das ações que tramitam no Brasil. Há um custo enorme por Estado. Tudo isso vai ser revisto, inevitavelmente, como foi em outros países, a exemplo de Portugal, Espanha, Grécia. Países que tiveram governos socialistas e reverteram. Fecharam tribunais, diminuíram a quantidade de juízes, que passaram a decidir questões importantes.

Ainda cabe mais aperto, novos ajustes na Justiça do RN?

Não falo em aperto, mas precisamos perseguir a observância da Lei de Responsabilidade Fiscal. A Constituição e a Lei de Responsabilidade Fiscal dizem o que deve ser feito. Primeiro, o corte de gratificação, depois de cargo comissionado e até a exoneração de funcionários estáveis. Isso é o que está escrito na Lei de Responsabilidade Fiscal. Não inventei nada. Neste ano de 2015, não teve vencimento de funcionário que foi diminuído. Não posso diminuir vencimento em face do princípio de irredutibilidade de vencimento. Houve corte de gratificações,  que poderiam ser maiores, se fosse pela minha vontade, e de cargos comissionados. Tudo isso modificou um pouco nosso perfil. Como houve uma queda real da receita corrente liquida, não podemos, mesmo assim, diminuir tanto nosso posição acima do limite dos 6%. Isso parece que outros órgãos e poderes também estão acima. Estamos perseguindo a nossa adequação. Nos próximos tempos, se houver um crescimento do país, que não houve este ano, poderemos reinserir as despesas com pessoal, no limite de 6% que é estabelecido na Lei de Responsabilidade Fiscal.

Hoje está acima?
Não fechamos no último quadrimestre, que será no dia 31, No levantamento anterior, ficou em 6,4%.

Mesmo com os ajustes?
A grande economia foi porque se pagou muita coisa administrativamente. Eu não estou criticando o passado, nem os gestores anteriores, mas fazendo um comparativo. Em 2015, gastamos R$ 105 milhões a menos do que em 2014. Eu considero que, quem tem dinheiro a receber do Tribunal de Justiça, tem que ir para precatório como todas as pessoas do Rio Grande do Norte. Não pode ter uma preferência e receber administrativamente. Então  todos têm que ser tratados igualmente. Notícia boa não faz alarde, mas voluntariamente não paguei PAE (Parcela Autônoma de Equivalência). Tive que pagar algumas recentes por decisão judicial. Então, os funcionários do Judiciário, como os dos Executivo, do Legislativo e dos demais poderes, têm que ser tratados da mesma forma e, se tem dinheiro a receber, ir para fila de precatório. Antes pagava diretamente quando a pessoa tinha o direito. Então, essa mudança de paradigma é o objetivo da administração a que me proponho.

Nessa mudança de paradigma como se enquadra o auxílio moradia?
O auxílio moradia é uma decisão do Supremo Tribunal Federal. Eu acho o auxílio moradia, como está posto, imoral. Não concordo. Mas não  vou ser o único juiz do Brasil a não receber nem o único gestor a não pagar. Tem uma decisão do STF que determina o pagamento. Mesmo assim, pergunto-me como pode ter uma natureza indenizatória? O que indeniza? Qual o dano que repõe? O auxílio moradia acaba tendo outro caráter e como tal deveria ser incluído no subsídio e pago também aos aposentados, dado a paridade que existe entre os ativos e aposentados. Tenho este ponto de vista e espero que se encontre uma solução. Na última reunião do colegiado de presidentes dos Tribunais de Justiça, inclusive com a presença do ministro Ricardo Lewandowski [presidente do Supremo Tribunal Federal],  externei uma posição pessoal de que, como os magistrados brasileiros perderam até 35% dos adicional por tempo de serviço, algo que os funcionários do Tribunal de Justiça têm direito, seria possível resgatar até 15% de adicional por tempo de serviço [para os juízes], e haveria uma solução de um direito que está na lei, mas foi retirado quando se estabeleceu o subsídio, que define o pagamento em parcela única. Se tivesse condições políticas, estabeleceria subsídio único e subteto para todos os funcionários do Tribunal de Justiça, como outros estados já têm. Temos ainda a maior média [salarial] dos tribunais do Brasil.
Cláudio Santos afirma que o governo pode encontrar recursos com privatizações
Ainda no Tribunal de Justiça do RN a média salarial está entre as mais elevadas?
Ainda, mais ou menos igual ao da Bahia, outro que tem uma média salarial de R$ 16 a 17 mil.

No TJ-RN está nesta faixa?
Está nesta faixa de R$ 16 mil [a média salarial]. Então, [subsídio em parcela única] seria muito bom, não só para o Tribunal de Justiça, mas para todo o Rio Grande do Norte, para todos os funcionários públicos. Esses penduricalhos, vantagens, repercussões, alinhamentos e vinculações desvirtuam a folha de pagamento.

Seria por emenda à Constituição estadual?

Não precisa. Basta ser através de lei. Não é necessário modificar a Constituição. Não há direito constitucional a adicional por tempo de serviço, por exemplo. A norma é infraconstitucional, bastava uma lei para modificar tudo isso.

Teria que ser uma lei aprovada no Congresso Nacional?

Não, aqui mesmo. O Estado tem autonomia para isso. Mas é uma posição pessoal.

Isso poderia ser para servidores?

Sim, mas poderia abranger todos [que estão nas diversas careiras do serviço público estadual]. Inclusive magistrados, Ministério Público, todos.

O senhor disse que não há condição política. Quais são essas condições que faltam?

Políticas… Dificuldades internas. Não sei ainda avaliar se seria possível transpor. É preciso, também, que o Poder Judiciário, faça o que precisa, mas sempre de forma dosada. Eu já ataquei muitos pontos. A questão arrefeceu um pouco, as coisas estão bem. No próximo ano teremos, provavelmente, uma retomada de relações com o Sindicato. É importante a posição do Sindicato, que não pode ser radical ou político-ideológica. Estamos tratando de recursos públicos. O contexto do Brasil propicia um ambiente favorável a uma busca de uma racionalidade nestes gastos. Eu digo sempre: É preciso que se tenha o Poder Judiciário que o povo possa pagar. E que a Justiça não seja a única prioridade, mas uma das prioridades da Administração Pública. Há outras áreas prioritárias também. O mundo não é só o Poder Judiciário.

Há dificuldades internas então? Isso envolve exigências de salários cada vez maiores, os auxílios, as vantagens, estrutura cada vez mais ampla. É preciso mudar a cultura interna do Poder Judiciário?

Essa tem que mudar e vai mudar lentamente. Alguém precisa mudar isso. É preciso que se acredite que essa mudança no Estado brasileiro, no qual se inclui o Poder Judiciário, se fará pela via democrática do Congresso Nacional. É necessário que isso se faça com a responsabilidade dos deputados e senadores. São medidas antipáticas. Mas me parece que as medidas antipáticas, tomadas por qualquer governo, depois se transforma em credibilidade e popularidade muito grande. É necessário alertar para alguns aspectos, que se diga a realidade. O Rio Grande do Norte tem quantos funcionários públicos? 150 mil? Isso em um Estado com 3 milhões e 500 mil habitantes. Nestes 150 mil você tem 50 mil privilegiados sustentados pelo povo todo. São estruturas que se criou ao longo de décadas. É isso na questão a situação previdenciária. Hoje temos uma norma constitucional que diz que quem entrar a partir de agora no serviço público vai ganhar o teto da previdência [ao se aposentar]. Têm o direito de fazer uma previdência complementar para receber mais. Mas será que o Brasil vai ter condições de esperar essa norma jurídica que só vai ser aplicada em 30 anos? Poderá esperar até lá pagando, no máximo, algo próximo de R$ 5 mil a quem está no INSS e R$ 30 mil a alguém que se aposenta pelo serviço público?

É possível que quebre antes…
Eu trabalho com o horizonte de 5 a 10 anos para se diminuir os proventos dos aposentados no Brasil. E isso pode ser feito hoje. Eu disse que iria acontecer através da tributação. Eles querem fazer o limite do aumento da idade. Não vai adiantar muito. O problema é que o Estado não suporta mais a conta da previdência. Venderam a ideia de que todo mundo tem direito a se aposentar. Foi o que houve como o fundo de pensão das estatais. Muita gente se aposentou com 48 anos de idade. Esses fundos terão condições de pagar mais 30 anos de benefício? Esses fundo das estatais estão todos quebrados, até pela má aplicação dos recursos. Mas esses fundos também foram financiados pela sociedade brasileira. Na hora em que se coloca um litro de gasolina, sai algum dinheiro para o Petros. Ou saiu muito, não sei como está hoje. Na hora em que se coloca uma carta nos Correios, sai um dinheirinho para o Postalis. Para quê? Para financiar a população? Não, para financiar uma parte da população que é empregada nos Correios ou na Petrobras.

E envolve os outros problemas nas estatais?
Nessa crise toda se pergunta: Se a Petrobras fosse privada teria acontecido isso? Não. Estão mantendo essas empresas estatais, esses grandes grupos, essas grandes estruturas, que são estruturas de poder, de nomeação de liderança, de financiamento de campanha. É para isso que serve. Se não diminui o Estado, não diminui a corrupção. Em alguns anos, começa tudo novamente. É preciso diminuir o tamanho do Poder Público, só tem essa saída para reduzir a corrupção.

E os juízes não precisam contribuir também? Há alguns estados que magistrados reivindicam até auxílio para financiar a escola particular de filhos de juízes…
Tem no Rio de Janeiro.

Já tem em algum estado, então. Não é hora de rever essas situações também?

Eu tomara que essas mudanças sejam feitas pelas vias democráticas, como deve ser feito. Ou vem amanhã um ditador e acaba com isso tudo de cima para baixo. Por isso defendo o subsídio único. Abra a página do Tribuna e está lá os ganhos brutos de cada um. É necessário dizer publicamente quanto se ganha no serviço público. Não adianta dizer que ganha X e ter trinta coisas embutidas indiretamente. Isso ofende o princípio da transparência do serviço público. A cultura do Judiciário tem que mudar muito. Todos os dias chega aqui um juiz pedindo mais funcionários. Todo dia chega pedido de diárias para fazer cursos, congressos, inclusive no exterior. Os juízes ficam com raiva de mim, porque não dou. Não autorizo diária assim. Só autorizo em último caso. É tanto que diminuímos as diárias em certa de 45% de 2014 para 2015. Mas há uma cultura. Veja, o Tribunal de Contas disse que não posso contratar juízes leigos. Para decidir o quê? Briga de vizinho? O Poder Judiciário não é para isso. Fico com muito pena, porque tem juízes que ficam decidindo besteira o dia todo. Não conseguem decidir o que é importante. Tem que acabar com isso. Tem que dificultar o acesso. Não é para decidir coisas menos importantes. Quem tem que decidir coisas menos importantes é o delegado de polícia do bairro. Como tem uma mulher na Zona Norte com oito ações na Justiça? Brigou com o motorista do ônibus, o lixeiro, uma vizinha, uma prima, o caixa do supermercado e outras pessoas. Então ela tem oito ações, porque acha bom brigar, tem uma Justiça à disposição. E o custo disso tudo? É preciso pensar sempre na relação entre custo e benefício.
O presidente do Tribunal de Justiça afirma que o Estado não pode mais adiar reformas que corte as despesas
Com relação à remuneração deve ser adequada à carreira dos magistrados, afinal decidem sobre a liberdade e o patrimônio das pessoas, mas não poder ter abuso que coloque em risco a credibilidade…

Claro, a respeitabilidade do magistrado é tudo. Acho que precisamos mudar. E os juízes devem decidir questões importantes, mas hoje decidem sobre muitas coisas sem futuro nenhum, questões miúdas, que deveriam ser resolvidas, com todo respeito pela função que exercem, pelo soldado, pelo agente de polícia, uma instituição como o Procom, ou um órgão público à disposição destas querelas. Mas um magistrado? Deveria pagar uma multa muito elevada quem entra com uma ação temerária.

Recentemente houve um ajuste, um projeto para remanejamento que atingiria os poderes e contingenciamentos. Nesta situação como está o relacionamento e o diálogo com o Governo do Estado?

O governador, pessoalmente, é um gestor muito bem intencionado. Respeito o modo dele pensar, é um politico, vive da politica, precisa de voto. É bem mais especialista nesta matéria do que eu. É de relação afável, de fácil diálogo. Mas eu acredito que o Estado, da maneira que está, não vai ser conduzido desta forma por muito tempo. Terão que ser tomadas medidas duras, muito duras de ajuste. A questão previdenciária é muito relevante, até porque em dezembro do ano passado, neguei a autorização para que fosse utilizado o Fundo Previdenciário para pagar pessoal e os inativos, em uma iniciativa no então governo Rosalba. Considerei esse Fundo Previdenciário sagrado, minha decisão foi bem didática. Depois desta decisão, tiveram a iniciativa de um projeto de lei, que autorizou esse saque em recursos da previdência, que estavam próximos de R$ 1 bilhão. Houve o gasto do dinheiro, aumentou muito a despesa pública. Onde está o dinheiro do Fundo de Previdência? É preciso verificar também os recursos que sobram [proveniente dos ganhos do que estava aplicado]. Será que estão rendendo, foram bem aplicados? Essa é uma pergunta a se lançada à população do Rio Grande do Norte. É preciso ver essa aplicação. Tínhamos certa de R$ 1 bilhão, hoje R$ 300 milhões?

Estão praticamente esgotados…

Mas há esta parte que não pode vender, porque estão aplicados em um prazo.

E um aspecto preocupante, este recurso do fundo de previdência que foi sacado?

O governador tem que vender alguma coisa: a Caern, ou terreno ou outros órgãos públicos e repor a esse do Fundo da Previdência. Tem que ser reposto. Se não for imediatamente, cada dia que passa fica mais difícil a reposição. Na própria máquina administrativa é preciso ver as despesas ao que o povo pode pagar. Não adianta criar mais serviço, aumentar a quantidade de escolas nem de hospitais, se o Estado não tem condições de manter. Acho que a sociedade vai se deparar com esse problema e quanto mais demorar, mais drástica e mais profunda será a solução.

As medidas de economia e ajuste do governo do Estado foram tímidas até agora?

Tivemos, pelo que se sabe, o aumento da despesa de pessoal, que saiu de 48 a 49 para 54%, segundo os dados divulgados ultimamente pelo Executivo, superando o limite da Lei de Responsabilidade Fiscal. E se deu um aumento a várias categorias no momento em que não se podia. Embora considere que nos órgãos essenciais, nos serviços essenciais, os funcionários ganhem pouco. Por quê? O dinheiro está muito diluído em setores que não são prioritários para a administração pública. É preciso o governo se despir disso e atender ao básico. Assim como as prefeituras, que devem cuidar bem das vias públicas, coletar o lixo, manter a estrutura urbana bem organizada, a autorização para construção de casas, as ruas limpas.

O pessoal que trabalha na saúde reclama muito da judicialização na área de medicamentos, que obriga a distribuição que nem sempre está prevista e onera o serviço, como vê essa reclamação?

Criamos um grupo que está selecionando e orientando os juízes nestas questões. Há um grupo de apoio à saúde, que acompanha os pedidos de pagamento de medicamentos, de internações e cirurgias. É integrado por juízes e apresenta orientação dos custos médios. Temos uma anteparo de ordem administrativa para que isso seja melhor solucionado. No entanto, ninguém pode proibir um juiz de dar uma decisão favorável ao pagamento de um procedimento ou medicamento.

Há o problema no sistema que foi estabelecido?
O problema todo se reduz a um dispositivo constitucional que afirma que saúde é um direito de todos. Eu interpreto que saúde gratuita, como está entendido, é um direito de todos, mas daqueles que são miseráveis. Quem pode pagar, deve pagar. Em nenhum país civilizado do mundo, a não ser a França, e lá o sistema está quebrado, se dá saúde de graça para todos o tempo todo. Aí sempre vai ter alguém que, com dor na canela, procura o hospital e quer se internar e fazer um check-up. É da natureza humana. Sempre vai se procurar um serviço de graça e exigir qualidade. E nessa situação haverá os que vão tentar curar uma dor na canela não em casa, com um unguento qualquer. Nunca autorizei internação ou medicamento para alguém que possa pagar. Isso tem que ser feito com cuidado. Eu determino que o secretário de saúde interne e procede a cirurgia da pessoa que está para morrer. A pessoa pobre. Como faço com relação à Unimed. Que o gestor resolva como e onde ser feito. Não mando um paciente para São Paulo, nem para os Estados Unidos. Isso não seria direito. O direito é tratar aqui com o que for possível. Essa questão precisa ser melhor pacificada na jurisprudência da Justiça brasileira.

Pelo que o senhor afirmou, considera a privatização da Caern para o governo ter recursos disponíveis à reposição do fundo de previdência e até para investimentos como uma solução adequada?
É apenas um exemplo que estou dando, como existem outros órgãos que são desnecessário [que fiquem com o Estado].

Um exemplo ou uma sugestão?

Uma sugestão… Acho que há outros órgãos [que poderiam ser vendidos]. O mais importante é o Fundo da Previdência ser reposto. Isso, sim. Se não mudar isso, não adianta aumentar tributo, como aumentou. Não vai resolver.

O Estado precisa se desfazer de estatais, de ativos?
Sim, de alguns ativos.

A Caern poderia ser um deles, mas tem outros [que poderiam ser privatizados]?
Sim, poderia ser um. Tem outros.

A Potigás…
Exatamente, e outros setores que precisavam ser vendidos para repor o fundo dos aposentados do Rio Grande do Norte. O fundo de previdência foi criado para financiar os proventos de aposentadoria.

O importante é não deixar descoberta a previdência?
Sim, é muito importante isso. Não sei exatamente o que vão fazer. Parece que o governador se dispõe a uma reforma do Estado, segundo eu soube. Antes tarde do que nunca.

É inadiável essa reforma?

É inevitável. Não podemos colocar 3 milhões e 500 mil pessoas para pagar a estrutura do Estado, a ineficiência. O povo tem que pagar Justiça, Saúde, Educação e Segurança. Isso, sim. Segurança para todos, saúde de graça para miseráveis — quem puder pagar, precisa dar a contrapartida —, educação de graça para todos, no ensino básico e médio – o básico da Prefeitura, o médio do Estado e a universidade federal. Não tem motivo para o estado financiar universidade.

O Estado deveria desistir da Uern?
Deveria federalizar a universidade estadual, porque não é objetivo constitucional do Estado membro financiar universidade. Como tínhamos da prefeitura, um incentivo fiscal, do ISS, para as universidade privadas manterem alunos gratuitos. Não é objeto das funções constitucionais da Prefeitura financiar universidade. Não sei se ainda tem. Acho que o prefeito Carlos Eduardo tomou uma iniciativa revogando isso, porque as universidades privadas terminavam sem pagar o ISS, dando bolsas de estudos para alunos. Isso era uma desvirtuação total das atribuições constitucionais da municipalidade.

A ideia de privatização dos presídios é salutar?
Eu já conversei sobre isso várias vezes com o governador. Sou defensor deste ideia desde 2003, quando fui gerente do sistema penitenciário, como secretário de Segurança. Vi, no Paraná, uma penitenciária sob administração privada e, vizinha, uma sob administração pública. A privada é um hotel e a pública uma pocilga, como temos tantos exemplos no Rio Grande do Norte. Eu disse: “Governador faça a administração privada de um presídio, entre os tantos que temos no Estado, para servir de exemplo”. O diretor, nestes presídio privados, é um funcionário público designado pelo governador para acompanhar e fiscalizar, mas a administração fica na mão de uma empresa. É mais barato, não produz aposentado para o Estado, não há fuga, tem assistência médica e disciplina para os presos. E ainda teleconferência. Hoje temos toda a estrutura para fazer as audiências com os presos pela internet, mas não há sequer uma sala nos presídios do Rio Grande do Norte para instalar os equipamentos e o preso ficar com o advogado e ser ouvido pelo juiz. Tivemos, neste ano, 800 presos que não foram ouvidos por falta de transporte, e isso termina com a prescrição da pena. É um problema sério. Investimos um valor significativo, em termos de informática, para compra de equipamento, inclusive o que vai para lá, e nas linhas de transmissão. Estamos com tudo pronto, mas não teve a contrapartida. Tivemos uma reunião com a estrutura de segurança do Estado e esperamos que o Poder Executivo faça a parte dele para pudermos diminuir as despesas e trabalhar no sentido de celeridade dos processos.
O presidente do Tribunal de Justiça afirma que o Poder Público deve ficar limitado à saúde para pobres, educação e segurança
E se funciona administrado pela iniciativa privada, por que não como estatal?

É muito difícil um agente penitenciário ser punido por levar telefone ou droga para o presídio, para ficarmos em um exemplo. Isso falo em tese. Se for um funcionário contratado pela CLT já sai dali preso e demitido. Mas para exonerar um funcionário público, o trabalho que dá… E a empresa privada tem mais facilidade da compra de comida, de veículo. Se um carro apresenta um problema, baixa um pneu, quem vai pagar o conserto? Tem estrutura para resolver no serviço público? Na empresa privada isso se resolve rápido. A contratação de um médico é demorada no serviço público, no presídio feminino não há ginecologista. Não há um médico para atender um preso com um dor, um dentista para arrancar um dente. Nada, a atenção a saúde é zero. Mas, em uma estrutura privada, teria, porque a lei de execução penal manda. E o privado cumpre. O Estado não cumpre. Pode falar sobre isso quem conhece, viu. Quem não viu, fica apenas opinando. Isso é importante para o sistema penitenciário e até para tratamento digno ao preso.

Há um projeto para construção do tribunal e recentemente houve até a aquisição das novas cadeiras para o pleno, que repercutiu. Não preocupa que a construção da nova sede, que terá ainda a ambientação, acabe tendo repercussão negativa para o Tribunal por causa do custo?
Somos o único Estado do país que não construiu sede para o Poder Judiciário. No Rio Grande do Norte, a sede do Tribunal de Justiça funciona em um prédio onde foi Secretaria da Fazenda, outros órgãos e depois doado ao Tribunal. E nossas instalações são muito ruins, não temos banheiros nos gabinetes dos desembargadores. São muito ruins as instalações elétricas, hidráulicas, trabalhosas. Temos muito receio de que aconteça um acidente. E a condição é bem menos confortável do que o próprio fórum, inaugurado no Governo Garibaldi. Os fóruns do interior, de Mossoró, de Caicó, de Parnamirim, que estamos terminando, o de Nova Cruz também, são muito superiores nas instalações. Esse dinheiro que está pronto, economizado há dez anos, em várias gestões, e continua para construir o prédio, é um projeto extremamente razoável. Não há como dizer que é um disperdício. Inclusive vai ser em uma região muito pobre, na Cidade da Esperança. Levará desenvolvimento para a região, além da valorização para as casas que estão naquela situação lá. Quanto à questão das cadeiras, acho isso, algo extremamente simplório, primeiro porque foi feita uma licitação, a determinação para que as cadeiras fossem confortáveis foi minha, da presidência, acho que temos uma duzia de órgãos públicos no Estado que usam cadeiras mais caras do que as nossas, e se for para os tribunais superiores, em Brasília, aí sim. Tem cadeiras dessas que custam R$ 20 mil. Outra coisa, desde 2002 que não tinhamos cadeiras [novas] e elas são muito desconfortáveis. Trabalhamos em dois expediente aqui e precisamos de algum conforto, com a garantia de doze anos. Enfim, não são cadeiras extraordinária, nem suntuosas. O custo é alto, porque o produto é bom.

Em muitos momentos vemos juízes, magistrados, se pronunciando sobre assuntos diversos em redes sociais. Isso pode prejudicar?
A Lei Orgânica da Magistratura diz que um magistrado precisa ter um comportamento na vida pública e privada compatível com a magistratura. Agora cada um cuida de si. Acho, particularmente, que um magistrado não pode se expor, em nenhuma situação. Um magistrado não pode, absolutamente, ter um comportamento que não seja em consonância com as altas atribuições do cargo. Isso falo em tese.

A função do magistrado é diferente de muitas atribuições dos demais servidores, porque se trata de uma função de Estado, isso exige alguns cuidados?

É o “Estado-juiz”, exerce uma função de Estado.

E pode, em algum pronunciamentos, se colocar sobre uma situação que terá que julgar mais adiante, ou semelhante?
Exatamente. Veja, é difícil. Um magistrado, por exemplo, pode estar em um restaurante com amigos, sai nota no jornal. Daqui a um mês, dois meses, ele está como desembargador e aparece um processo no qual o nome de uma daquelas pessoas ou a pessoa jurídica da qual esse amigo é sócio está envolvido. E o desembargador, às vezes na Câmara, vota até 200 processos. O advogado do lado contrário, não só leu a nota, como soube da decisão. Como justificar isso? É muito difícil. Uma sessão de Câmara chega a julgar 150 a 200 processos em uma manhã. Aparece uma construtora, por exemplo, que estava naquela relação da notícia com o desembargador. É uma situação difícil.

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