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Construindo

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Dácio Galvão
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A coisa vai se processando podendo ser conclusa ou não nos labirintos da criação artística. Isso já se sabe, seja que linguagem for. Da vídeoarte a litogravura. As ferramentas racionais nas quais os pensamentos se entrechocam se alargam ou diminuem no campo perceptivo, sensório, sentimental. A designação pouco importa. Do pulo de um insight que no plano consciente ou do inconsciente amalgama uma idéia provoca uma matriz e seu posterior desenvolvimento. Algo que pode se tornar arte. Em sua eternidade como no Jardim das Delícias de Bruegel ou na efemeridade como nas Capas-Parangolés de Hélio Oiticica. Nas iluminogravuras de Ariano Suassuna numa mitologia armorial, nas xilogravuras heráldicas de Gilvan Samico ou nos hapennings de Nam June Paike ou ready mades desconstrutivos de Marcel Duchamp. Pinturas Cegas de Tomie Ohtake.

Ação no vasto do simbólico no horizonte do sensível. Remodelando comportamentos abrindo porteiras e quebrando fronteiras. Tudo é possível. De John Cage a Hermeto Paschoal. Aprender para desaprender. Depois da apreensão o desabamento de fórmulas cristalizadas que não mais impulsionam. Alienam e aprisionam. No Engenho de Dentro, onde Torquato Neto esteve internado, habitou o criativo Emídio e o Bispo do Rosário. Descobertas impulsos estelares da psiquiatra rebelde Nise da Silveira. Experiências com esquizofrênicos a desmoronar conceitos e tradições. Desaparelhou o figurativismo no depois cinético Abraham Palatnik sob o olhar do artista gráfico Almir Mavignier e cristalizações no crítico ensaísta Ferreira Gullar que é tarado no trabalho de Emídio.

A inquietação ou a tal “coisa” que é silenciosa estridente água e sal se derrama também no prazer e no deleite.  Digamos que abrindo mão de não ser tão demolidora e mais concessiva se situando num repertório mediano. O vocábulo gênio por demais desgastado abre fendas para outras nomenclaturas das inventividades menos exigentes mais acomodadas menos transgressoras. Como na cartilha de Ezra Pound né? Cabe tudo. De beletristas a inventores. Há lugares ao sol. Sim, há lugares vários. Ainda mais nesse sol de Natal, claríssimo. Cidade nominada diamante nordestino carinhosamente por Caetano Veloso. Incandescente, o poeta marinheiro W. Salomão chamou-a cabralinamente: “Natal: Agulha de Luz”!!

Meu amigo disse: tem um mote que José Carlos Capinan aquele que participou do tropicalismo com Gilberto Gil, Tom Zé, Os Mutantes Nara Leão, Rogério Duarte, Rogério Duprat e Gal Costa fez para um bolero falando “Da janela do meu quarto / subitamente vejo a lua flutuando no espaço”… E aí parou. Você não gostaria de gerar uma parceria? – Eu disse sim! Me lancei na ponta da proa de barco singrando mares: “…Lança de aço riscando no asfalto / tordilho russo de Jorge fogoso, andamento a passo. / Imagem assim  a saudade eu disfarço. / Você não me aparece e a noite desaba no apartamento / como canção. / Atéia descrente a solidão / Os jarretes, ancas / Balança corpo coração.” Falei então que havia vislumbrado um apelo urbano. Metáforas: Santo Guerreiro e a Mulher. A espera. Amor não correspondido. Cavalo garboso lança de São Jorge contra o Dragão desenho na lua saltando e cavalgando no asfalto. Sinestesia surreal. Certa frustração passional guiando o repertório vocabular. E nessa triangulação eis o que o parceiro-mor se coloca e acentua. Generoso, Capinam fala desse modo para Gereba Barreto: “Parceiro, tudo bem. Só invoquei uma palavra -“jarrete”- que eu não conheço e soa forçado para mim. Eu sugiro “Enluaradas ancas”. Se o mestre aí concordar, mandem bala da forma que preferir. E a melodia? Mande. Vamos ganhar o festival da vida.” Acento absolutamente aceito. Fato consumido e consumado.

Melodia composta ficou então titulada “Ancas Enluaradas”. No primeiro momento acordes apontando para um samba canção. Podendo migrar perfeitamente para um boleraço como fora pensado inicialmente na linha de João Bôsco /Aldir Blanc. Bolero de Platão de Tom Zé. Zum Zum (Um Instant de Vie) e Velhos Ciúmes de Fausto Nilo. Elegia poema de John Donne na tradução de Augusto de Campos, no Cinema Transcendental, de Veloso. La primera vez (Em El Instituto Y Em La Universidad) poesia de Federico García Lorca com Geraldo Azevedo.

O plano de vôo foi traçado como descrito. Entropia de neurônios. A plataforma whatsapp. Depois vai pintar novos desenhos sonoros instrumentação falando se expressando nas timbragens características sobrecarregando cores próprias. E nas incontáveis loas nas noites enluaradas novos desenhos belicosos do cavaleiro da Capadócia a propagarão e provocarão, como disse o melodista de Canudos-BA, novas e mais milhões de “imagens que são viagens”.

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