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Desapropriações emperram projetos

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Roberto Lucena – repórter

Boa parte das obras que irão compor o legado da Copa do Mundo 2014, tão festejado e propagado pelas administrações municipal e estadual, está travada, até o momento, em brigas judiciais que aparentemente não têm data para serem resolvidas. Em curso desde 1996, o processo de desapropriação da área onde está sendo construído o aeroporto de São Gonçalo é exemplo do que pode acontecer com as obras de mobilidade urbana de Natal. Há dois anos, a Prefeitura tenta desapropriar centenas de residências e comércios no bairro das Quintas para então começar as intervenções.  Proprietários e entes federativos disputam na Justiça enquanto o tempo para a realização das obras expira.

O processo de desapropriação do terreno em São Gonçalo do Amarante é o mais longo na Justiça potiguar. Há 16 anos, o Estado começou a pagar indenizações a 313 expropriados do local. De acordo com Francisco Sales, procurador do Estado responsável pelo setor de desapropriações, 220 pessoas já receberam o valor devido e o Estado já desembolsou cerca de R$ 3 milhões. “Ainda resta pagar cerca de 76 pessoas que tinham terreno num loteamento e cinco expropriados que contestaram o valor oferecido pelo Estado”, diz.

A contestação do valor é justamente o entrave nesse tipo de processo. O ente que deseja desapropriar uma área envia engenheiros que fazem a avaliação do imóvel ou terreno [veja info]. “No caso do Município, a avaliação dos imóveis é feita por três engenheiros da Semopi [secretaria Municipal de Obras Públicas e Infraestrutura]. A avaliação é justa. Não é valor especulado por corretor”, explica o procurado do Município, Thiago Tavares. “Esse valor é depositado em juízo e o juiz defere ou não a emissão de posse prévia”, acrescenta.
Há 16 anos, o Estado começou a pagar indenizações a 313 expropriados do local. Cerca de 220 pessoas já foram indenizadas e o Estado já desembolsou R$ 3 milhões
O procurador explica que a Lei de Desapropriação é, via de regra,  favorável aos entes federativos porque os proprietários só podem contestar o valor da indenização. O cidadão não pode questionar, por exemplo, se a obra que se pretende construir é realmente necessária ou se não há outros projetos que possam substituí-lo. “A lei, de fato, beneficia o Órgão Público. O cidadão só permite contestar o valor. O Município demonstra a utilidade e pronto. Só resta impugnar o valor”, coloca.

No caso do aeroporto de São Gonçalo, o embate começou quando expropriados o valor da indenização pago à época.  De acordo com o advogado Igor Steinbach, o Estado oferece R$ 0,08 por cada metro quadrado na área. Os proprietários querem, no mínimo, R$ 6,00. Até o momento, o Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte (TJRN) solicitou três perícias técnicas. A última perícia, concluída em outubro de 2011, aponta que as terras, incluindo as benfeitorias encontradas, estariam valendo R$ 2,5 milhões. Na primeira perícia, realizada em 1996, ficou acertado que o governo do Estado pagaria R$ 380 mil.

Os clientes de Igor  Steinbach (cinco que ao todo somam mais de um terço do total da área) querem o pagamento de R$ 30 milhões. O último capítulo dessa novela aconteceu em março passado. Na ocasião, a Procuradoria Geral do Estado (PGE) aguardava autorização expressa da governadora Rosalba Ciarlini para fechar acordo com um dos expropriado. O governo estava disposto a pagar R$ 2,5 milhões. “Mas, não sei o motivo, eles desistiram dessa proposta”, diz Igor. Agora, o advogado pretende utilizar outro argumento para tentar provar que a área, de fato, é bem valorizada. “O leilão de concessão da Anac [Agência Nacional de Aviação Civil] em favor do grupo Inframerica. O valor, inicialmente, era de R$ 57 milhões, mas terminou em R$ 170 milhões. Você já vê que há lucro de 120 milhões. Ninguém se preocupou com os donos da área. Só existiu isso tudo porque tem a área. Vamos usar essas informações sobre o leilão para contestar os valores do Estado”, dissse.

Em contrapartida, o procurado  Francisco Sales afirma que os expropriados não podem direcionar para essa lógica. “Uma coisa é você ter um terreno no meio do mato. Hoje, temos o aeroporto. Querer transferir para o terreno uma valoração que foi financiada pelo Estado é uma iniquidade para a sociedade”, diz.

Sedes da Copa assinaram pacto com União

A Advocacia Geral da União (AGU) não participa de processos de indenização referentes à intervenções previstas para Copa do Mundo 2014. A AGU informa que os governos envolvidos assinaram um documento com as cidades-sede chamado “Matriz de Responsabilidades”. Em síntese, constitui um pacto entre governo federal e governos locais quanto à divisão de responsabilidades – recursos financeiros e de execução da obra – para cada uma das obras da Copa. Cada cidade-sede tem uma Matriz de Responsabilidades, referente às obras das arenas, portos, aeroportos e mobilidade urbana. Os responsáveis pelas desapropriações são Estados ou Municípios.

No Rio Grande do Norte, o Município do Natal também é o responsável pelas desapropriações para as obras do Corredor Estruturante – Zona Norte. O Governo do Estado tem pela frente as desapropriações para o acesso ao novo aeroporto de São Gonçalo do Amarante como também a reestruturação da avenida Engenheiro Roberto Freire. Segundo a titular da secretaria de Estado da Infraestrutura (SIN), Kátia Pinto,  para estas obras, as desapropriações serão realizada em alguns pontos comerciais. “Mas é pouca coisa, somente algumas calçadas. Não devemos ter grandes problemas”, disse.

PAC

No Sistema Integrado de Controle das Ações da União (SICAU/AGU) há, atualmente, 8.609 processos judiciais relacionados aos empreendimentos do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC). Desse universo de processos, 5.405 são relativos às ações de desapropriação propostas pela União, suas autarquias ou empresas públicas, ou seja, dizem respeito ao ajuizamento de ações do Poder Público para viabilizar a instalação desses empreendimentos.

Governo pode assumir mobilidade

O Governo do Estado pode assumir os processos de desapropriações das obras de mobilidade urbana de Natal. A possibilidade foi levantada pelo procurador estadual Francisco Sales, responsável pelo setor na PGE. “Atualmente, só temos a desapropriação do aeroporto e outra de um terreno nas dunas de Jenipabu. Não fomos acionados com relação a outras, mas pode vir acontecer porque estamos vendo que o Município está em situação crítica do ponto de vista operacional”, diz. O Município do Natal aponta as desapropriações de imóveis residenciais e comerciais como o principal entrave para as obras no Complexo da Urbana, no bairro das Quintas.

Faltando menos de dois anos para a Copa do Mundo 2014, a  Prefeitura pavimentou apenas algumas ruas que servirão de via alternativa no bairro das Quintas e iniciou o processo de desapropriação de imóveis no mesmo bairro. O prazo para iniciar as intervenções em ruas e avenidas da cidade é setembro deste ano. A data, anunciado pela Semopi no início do mês, atende recomendação do Ministério das Cidades que estipula o mês de outubro para início das obras nas cidades-sedes do Mundial. Segundo Jean Valério, as obras do lote 1 devem ser iniciadas um pouco antes do previsto pela Semopi. “As obras não estão aceleradas. Não podemos ultrapassar os ritos legais que a Legislação nos impõe. Até o final de agosto, início de setembro, as obras do lote 1 serão iniciadas”, afirmou. O principal empecilho para o andamento das intervenções em Natal, segundo Jean Valério, são os processos de indenização de imóveis. O Município já depositou em juízo a quantia de R$ 1.363.217,20. No entanto, ninguém recebeu nenhum centavo. “O Município já tem a posse de alguns imóveis, mas aguarda ter de todos os imóveis para poder começar a trabalhar. Ninguém recebeu o valor ainda. A quantia está apenas depositada”, explica o procurado municipal, Thiago Tavares. Para o representantes da PGE, a proximidade do evento esportivo e o fato da mudança de administração no próximo ano são fatores que podem sinalizar para o repasse dos processo de indenização para o Estado. “Já que o calendário está apertado e diante do cenário político que se apresenta, pode ser que sejamos chamados para esse processo, dado que as desapropriações são em grande quantidade e complexas”, explica.

Acompanhe:
Principais processos de desapropriações para obras no Estado e município do Natal

1. Obras de Mobilidade Urbana em Natal
Início do processo – 2010
Valor depositado em juízo – R$ 1.363.237,20
Nenhum valor foi sacado até o momento

– Complexo da Urbana
56 imóveis residenciais
36 proprietários
Os imóveis comerciais ainda não foram avaliados

– Avenida Felizardo Moura
41 imóveis
30 proprietários

– Avenida João Francisco da Mota
109 imóveis
82 proprietários

– Avenida Mor Gouveia
A caracterização dos imóveis não foi finalizada. Não se sabe ainda quantos imóveis serão desapropriados

Com relação às obras do lote 2, em volta da Arena das Dunas, a PGM estima que será necessário fazer “poucas desapropriações”. Não se sabe o valor a ser pago.

2. Aeroporto de São Gonçalo do Amarante
Início do processo – 1996
Total de imóveis – 316
Quantidade total de expropriados – 313
Área total – 15 milhões de metros quadrados
Valor depositado em juízo inicialmente – R$ 1,5 milhão
Valor sacado até o momento – cerca de R$ 3 milhões
Valor que ainda falta ser pago – por volta de R$ 4 milhões
Quantidade de expropriados indenizados até o momento – 220
Expropriados que contestaram o valor da indenização – 5

Fontes: PGM e PGE

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