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Educação tropeça em busca das metas

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Desde as primeiras letras, noções de matemática e ciências até – e para – bater às portas da universidade e adentrar o mercado de trabalho, a formação intelectual e social de estudantes trilha um caminho acidentado. A qualidade da educação básica no país – da pré-escola ao ensino médio – persegue  picos de excelência estabelecidos pelo Ministério da Educação, enquanto tropeça em rasos resultados apontados pelos indicadores.

Especialistas na área são unânimes: a universalização qualitativa da educação básica é a única via para o desenvolvimento do país.

No Rio Grande do Norte, nenhum dos níveis de ensino atingiu a nota 5 no Ideb 2011. No ensino fundamental, a média nos anos iniciais foi de 4.1 e nos finais 3.4. O ensino médio teve o pior desempenho 3.1.

Criados para avaliar o nível de aprendizado dos estudantes da educação básica e estabelecer metas para que municípios e estados invistam e ampliem a oferta e a qualidade nas escolas, os indicadores da educação no país servem como parâmetro do que precisa ser alterado – frente ao mau desempenho constatado por eles. 
O RN atingiu, pelos dados do Ideb, as seguintes notas: ensino fundamental, a média nos anos iniciais foi de 4.1 e nos finais 3.4. O ensino médio teve o pior desempenho: 3.1
Esta tem sido considerada o desafio de gestão para o ministro da Educação Aloísio Mercadante que – após investimentos maciços no ensino superior ao longo dos últimos dez  anos e catapultou a oferta de vagas  – se volta para a educação básica e o ensino profissionalizante .

Questionada sobre se os alunos que saem das escolas da rede municipal de ensino atendem as exigências mínimas de aprendizagem, a secretária de educação do Natal Justina Iva admite: “pelo desempenho de indicadores como o Ideb, acredito que não”.

Quando a base do sistema não é muito bem estruturada gera um desequilíbrio, analisa Betânia Ramalho, secretária estadual de Educação, “não dá a sustentabilidade requerida’. Além de mais investimentos, acrescenta ela, é necessário  redefinir métodos, currículos e novos perfis de professores.

Para o deputado federal Gabriel Chalita, o Ideb também contribuiu para que a escola “se enxergasse dentro do sistema de educação”. “O gestor hoje sabe como está o desempenho dos seus alunos diante de outras escolas, do município, do estado e do Brasil”, avalia Chalita.

O ensino no país apresenta “avanços com políticas e programas, mas também grandes distorções país afora”, pondera a pedagoga e diretora do Instituto de Desenvolvimento da Educação (IDE) Cláudia Santa Rosa.

Avanços e desafios

Políticas governamentais de alfabetização aos 8 anos, leis que obrigam os pais a matricular filhos a partir dos quatro anos, indicadores e avaliações do sistema educacional, além de programas de qualificação de professores e financiamento para  merenda, transporte e estruturação da rede física, por parte do Governo Federal, são apontados como avanços para viabilizar o acesso às escolas.

O deputado federal Gabriel Chalita destaca melhorias após a aprovação do Fundeb, que ampliou em dez vezes os recursos para a Educação básica e também estabeleceu uma distribuição mais justa desse dinheiro, levando em conta, além do tamanho da rede e do número de alunos, a situação social e econômica de cada região

“A melhoria na qualidade passa a melhora do financiamento, a valorização dos profissionais da educação e a qualificação da gestão”, observa.

Por outro lado, o Plano Nacional da Educação (PNE) – que estabelece metas para universalização e qualidade do sistema educacional – permanece emperrado há dois anos no Congresso. E a educação básica atinge uma parcela pequena da população em idade escolar.

No Rio Grande do Norte, 32,8% da população residente e em idade escolar estavam inseridos no ensino básico, frequentando creches e escolas da educação infantil ao ensino médio. Os dados são do Censo 2010, do Instituto Brasileiro de Geografia e  Estatística (IBGE).

Para fechar a equação e reverter o quadro, acrescenta Santa Rosa, são muitos os desafios. A começar pela melhor definição da divisão de competências dos entes federativos (veja box), considerada não condizente com o nível de investimentos necessários para cada nível de ensino.

Nesse sentido, a secretária de educação de Natal Justina Iva defende a “federalização” da educação básica, de forma que a União assuma os vencimentos dos professores. “Dessa forma, sobraria recursos para investimentos, manutenção, hoje 90% é comprometido com a folha (de pessoal)”.

Qualificação ajuda nos resultados

As mudanças na legislação, bem como a distribuição dos recursos do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE) e programas federais, como o Alfabetizar na idade certa e de qualificação de professores, tem mudado a cara do ensino infantil.

Em Natal, o quadro de educadores infantis tem nível superior, sendo 80% com especialização na área. O resultado é fruto do esforço empregado nos últimos anos em programas de qualificação do professor (graduação, pós-graduação e educação continuada) do Ministério da Educação, por meio de parcerias com universidades públicas.

Para Justina Iva qualificar deixou de ser uma preocupação, no sentido de financiar. Desde 2005, convênios com o instituições de ensino superior tem suprido a demanda de cursos e a formação continuada é assegurada pelo MEC via universidades públicas. “Essa é uma questão resolvida”,  diz.

Contudo, observa a pedagoga e coordenadora do NEI, Andreia Diniz, o professor está formado, mas as condições de trabalho não permitem que ele use amplamente todo o conhecimento. “Não é uma questão pedagógica, precisa de um suporte político, de gestão”, avalia.“Os pais já entendem a necessidade de ensinamento desde cedo”, explica a pedagoga e coordenadora do Núcleo de Ensino Infantil (Nei/UFRN), Andreia Diniz.

“A metodologia tem se reinventado”, diz a coordenadora. Os professores estão menos tradicionais, abandonando as antigas cartilhas, os manuais, para trabalhar mais na perspectiva do letramento, da inserção da literatura na escola, com outras linguagens e artes.

Ensino infantil engatinha

De competência dos municípios, o ensino infantil  no país engatinha para tentar se erguer e ser tratado como gente grande. Os primeiros anos da vida escolar  amarga uma herança de descaso – sem atenção ou investimentos como visto no ensino superior e profissionalizante – e é considerada por especialistas um dos principais gargalos do sistema educacional brasileiro. Educadores e gestores consentem: é preciso apertar o passo para acompanhar o desenvolvimento das crianças e do país.

Somente, 5,51% dos 3.168.027 alunos matriculados em escolas e creches da rede pública  e privada do Rio Grande do Norte, estavam na educação infantil. Os dados são do Censo 2010, do Instituto Brasileiro de Geografia e  Estatística (IBGE). O valor está dentro da média do país.

Para acelerar o ritmo, o conceito das antigas creches mudou nos últimos anos. As escolas de educação infantil não atendem meramente a necessidade de espaços onde os filhos devem ser deixados, enquanto os pais precisam trabalhar, mas passarão a cuidar e educar.

Tal mudança impôs um desafio a administração pública: universalizar o acesso à educação, estruturar a rede física, capacitar professores. Até 2016, de acordo com a Emenda Nacional 59, aprovada em 2009 pelo Congresso Nacional, todas as crianças a partir dos quatro anos de idade deverão ter vagas garantidas nas escolas de educação infantil da rede pública do país. 

A medida foi reforçada no último dia 5 de abril, quando a presidenta Dilma Roussef sancionou  alterações da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, em que consta a obrigatoriedade de educação para essa faixa etária. Com isso, os pais ficam obrigados a matricular os filhos e os municípios passarão a contar com uma fatia maior de recursos para oferecer as vagas.

 Governo e educadores ainda não fazem projeções de incremento com a mudança da lei, mas deve melhorar o desempenho de 2011, quando 90.057 crianças com 4 a 5 anos estavam matriculadas, na rede pública e privada, em todo o Estado.

Quanto mais cedo a criança tiver em contato com o universo escolar, observa a pedagoga e diretora do Instituto de Desenvolvimento da Educação (IDE) Cláudia Santa Rosa, melhor será o rendimento. “Influi na formação  intelectual, psicológica, social e física, pois a criança está mais aberta à estas experiências, nessa fase”, avalia Cláudia Santa Rosa.

O pacto da edução infantil e da educação básica é recente, lembra a secretária de educação do município, Justina Iva, a partir dos anos 2000. “Temos uma dívida histórica com a educação infantil, que hoje é prioridade”, afirma.

Ensino médio tem o pior desempenho

O ensino médio reúne os piores indicadores da educação brasileira. É nessa fase da educação que se encontram desafios difíceis de transpor: a alta evasão escolar, baixa oferta de vagas e os mais críticos  desempenhos no Ideb – indicador que avalia a qualidade das escolas.

A doutora em educação Martha Pernambuco é enfática ao afirmar: o gargalo da educação brasileira não é a entrada no ensino superior, mas no ensino médio.

No Brasil, em 2002, o número de vagas do ensino médio correspondia a 16% do número de pessoas com idade escolar, 15 a 18 anos, compatível para essa média. Dez anos depois, de acordo com dados do IBGE, essa cobertura no Rio Grande do Norte é de 14,15%.

E pior: somente 10% dos alunos concluintes do ensino médio deixam a escola sabendo o que deveriam em matemática. Os dados são do relatório da ONG Todos Pela Educação, que analisou o resultado de 2011 da Prova Brasil e do Sistema Nacional de Avaliação da Educação Básica (Saeb).

Estagnado e sem investimentos, a universalização do nível médio e a escola obrigatória até os 18 anos só passou a  ser colocado como meta, a partir de 2002. Durante muitos anos, o ensino obrigatório foram somente as quatro primeiras séries fundamentais.

O método de ensino “ultrapassado, engessado e pautado no século  XX” é considerado por gestores e especialistas em educação como um dos desencadeadores da alta taxa de abandono escolar. No ensino médio, o índice beira os 20%, no Estado. Se contar a baixa a entrada de alunos nesse nível de ensino – e o grau de aprendizagem – o quadro “é cada vez mais preocupante”, analisa a pedagoga e diretora do IDE Cláudia Santa Rosa.

O acesso deve ser  planejado, explica Pernambuco,  mediante a reestruturação do conteúdo de modo a dar significado ao que é ensinado. Cerca de 90% do que é dado em sala de aula, está voltado para acesso às universidades.

“O dilema básico não é só o acesso à escola pública, mas a qualidade e forma de organização. A escola precisa fazer sentido para o aluno”,  diz Martha Pernambuco.

A reestruturação deve considerar um novo currículo, enfatiza a  secretária de educação do Estado Betânia Ramalho, integrando o ensino propedêutico, que prepare para a academia, ao ensino profissionalizante, com vistas ao o mercado de trabalho, além de capacitar outras habilidades.  “O conteúdo enciclopédico do ensino médio é impossível de ser assimilado por inteiro. A reforma curricular é o grande desafio”, frisa.

A oferta e implementação do ensino médio cabe aos Estados, embora escolas federais também atendam esta demanda.

Bate-papo: Justina Iva, secretária de Educação de Natal

Como a senhora avalia a educação básica no município?
Temos escolas que caminham muito bem e outras que não conseguem caminhar. Não podemos generalizar.

Os alunos que saem hoje da rede municipal de ensino atendem às exigências de aprendizagem?
Pelo desempenho de indicadores como o Ideb, acredito que não. Mas não dá para generalizar e dizer de péssima ou de boa qualidade a educação básica.

E quais os desafios para mudar essa realidade?
Gestão é fundamental. Mas não podemos reduzir a único fator. A inserção em área de baixo índice de desenvolvimento humano, problemas sociais, situações de riscos, nível de qualificação dos professores também influencia. Nacionalmente, pesquisas sobre o avanço do  Ideb mostram ser preciso compromisso do gestor, do corpo docente e servidores com a escola, além de gostar do que se faz e ter amor pela profissão.

O que está sendo feito para universalizar o acesso?
Temos uma dívida histórica com a educação infantil. O pacto da edução infantil e da educação básica é recente, a partir dos anos 2000. Trabalhar na perspectiva de cuidar e educar  requer um aparato bem maior do que em creches, há normatização sobre equipamentos físicos, qualificação profissional e tudo isso demanda investimentos. Hoje a educação infantil é uma prioridade.

Os investimentos dependem bastante de recursos federais…
A maior parte dos programas e ações são financiadas pelo governo federal para a construção, aquisição de equipamentos e recursos per capta aluno para a merenda, e agora esse recurso de primeira matrícula,  tem a contrapartida do município com muros, calçadas e a terraplanagem. O custeio e a manutenção é com o Município.

Os municípios têm condições de assumir inteiramente?
Há um envolvimento dos prefeitos defendendo a reforma tributária, para que a transferência da fatia da arrecadação seja maior, uma vez que os municípios ficam com a menor, 12%.  Esperamos também que seja aprovada a destinação dos 10% do PIB para a educação, previstos no Plano Nacional de Educação e a implantação dos recursos dos royalties do petróleo do pré-sal. Isso promoverá uma melhora significativa, mas a longo prazo. Para melhorar, a curto prazo, seria preciso que o governo federal assumisse.

Federalizar a educação básica?
Sim. Se o Governo Federal assumisse a remuneração dos professores da rede básica, assim como faz com o ensino superior, já que é quem demanda mais recursos.

Bate-papo: Betânia Ramalho, secretária de Educação do Estado

Como a senhora avalia a educação básica?
Quando a base do sistema não é muito bem estruturada gera um desequilíbrio, não dá a sustentabilidade requerida. A educação básica pública não corresponde ao tamanho do investimento feito pelo país nessa educação. Além de mais investimento, é necessário redefinir métodos, novos perfis de professores. Na hora que  conseguirmos estabelecer uma educação básica inclusiva com todos tendo acesso ao conhecimento, vai existir uma população culta, escolarizada, com autonomia suficiente para definir o que quer da vida. O cenário está sendo reorganizado, o resultado não surge de um ano para o outro.  Precisamos evoluir com o plano estadual de educação.

O Estado já tem um plano estadual de educação?
Temos um projeto estadual pedagógico com foco no ensino, aprendizagem e acompanhamento do estudante. Para a equação fechar, precisa de qualidade pedagógica que passa pela formação do professor, condições de trabalho e valorização do profissional.

O que preconiza esse projeto?
É o realinhamento de orientações curriculares, de rumo e objetivos. O prejuízo acumulado na educação do RN por falta de um projeto de educação levou-nos a ser quase lanterninha no Ideb, a uma rede física de escolas abandonada, que promoveu uma fuga de alunos das escolas públicas, nos últimos anos e tudo acaba centralizando mal na Secretaria, porque a escola não teve condições de fazer gestão.

Especialistas são enfáticos ao afirmar que a escola não atrai os alunos. Qual a sua opinião?
Um grande tema que se apresenta é a tecnologia da informação à serviço da pedagogia. O desafio de implementar o conhecimento em domínio psicológico e domínio tecnológico. Nesse sentido, estamos investindo em 4.310 tablets para professores do ensino médio, em lousas digitais, em rede de gerenciamento de pessoal e sistema informatizado de matrícula e de diário de classe. O acompanhamento escolar é palavra chave da educação básica. São recursos que colocam a escola muito próxima do que deve ser uma escola do século XXI.

A escola atual é antiquada?
Estudos mostram que as crianças não aprendem mais pelos métodos de antes, com  ênfase na escrita, na leitura impressa, em preto e branco, e que exigia uma capacidade excepcional de abstração das crianças. Hoje se tem tudo representado de forma tridimensional, todo conteúdo de física, química, biologia, até da língua portuguesa, que explora todas variantes e interligadas. É preciso investir mais.

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