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Esnobando a natureza (II)

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Francisco de Sales Matos
Advogado e Professor da UFRN

Caríssimos leitores, a um tempo atrás escrevi um artigo sob o título “Esnobando a Natureza”. E assinalei, exemplificando, a força avassaladora com que destruímos os nossos recursos naturais. O nosso extenso litoral, as lagoas da Capital, o exuberante Rio Potengi, o potencial hídrico dos nossos vales úmidos, a nossa Mata Atlântica e por aí vai. Agora resolvi me voltar para o Seridó, começando pela Serra de Santana onde estive final de semana passado para a assistir ao casamento do filho de um casal amigo, e lá aproveitando a temperatura de dezesseis graus, acompanhado por um grupo de amigos da melhor qualidade, aproveitei também para especular com o pessoal do lugar acerca do novo momento vivenciado pela turma da Serra. Na verdade, reportava-me aos municípios de Lagoa Nova, Cerro Corá, Tenente Laurentino e Bodó.

A um tempo atrás a Serra de Santana era conhecida como produtora de farinha de mandioca, macaxeira, pinha, fava e caju. Em Lagoa Nova centrava-se a grande produção de caju. Falei centrava-se porque a dinâmica econômica da Região pautou outras vertentes. Pude constatar que o cenário da economia está se redesenhando mediante algumas atividades verdadeiramente empolgantes. As eólicas, por exemplo, com suas mega torres de captação de vento e geração de energia, mudam até o visual e a paisagem do local; as pousadas, incrementadas em grande parte por esse novel momento, formam a estrutura que segmento turístico precisa para se desenvolver. A latere os condomínios fechados começam a aparecer e o segmento imobiliário avulta complemento a perspectiva turística, sobretudo com o fenômeno da segunda residência. No aspecto da produção, a criação de frangos em larga escala começa a dar sinais de vida. Enquanto a produção da farinha de mandioca já não é tão representativa.

A despeito de toda essa evolução positiva lamentavelmente uma delas vem se revelando extremamente negativa, porquanto destrutiva. E é sobre esta que carrego minhas tintas. Na verdade, havia naquele território serrano uma verdadeira floresta natural de cajueiro, o que o tornava singular. Mas, hoje o que se vê é a destruição implacável dessa floresta. Há muito venho observando, e achando estranho, um sem número de caminhões transportando madeira. Em colóquio com o amigo Gilberto, da Pousada do Cajueiro, pude colher que mais de uma dezena de caminhões descem a Serra todos os dias carregados com a madeira dos cajueiros. E para cada carga desses caminhões, no mínimo, quatro cajueiros são sacrificados. Perguntado qual o destino dessa madeira disse-me ele, que se destinam principalmente às cerâmicas de Parelhas e Carnaúba dos Dantas.

Por tudo que foi dito, e visto, deduz-se que esses carregamentos de madeira, se não todos, mas em grande parte são ilegais e clandestinos e não há sequer um olhar do Estado sobre tal transporte, muito menos sobre a dizimação da floresta. Os fornecedores, destruidores dos cajueiros, nativos, diga-se de passagem, argumentam que são plantas velhas, improdutivas. Portanto, não se justifica sua existência. Os argumentos contrários vão no sentido de que sendo uma floresta natural, a poda ou o seu extermínio haveria de ser controlado. Doutro modo, também não se sabe os efeitos de tal devastação. Dizem que o clima, sobretudo, já não é o mesmo de outrora. E, por fim, vem a pergunta que não quer calar: cadê o Ibama, o Idema, o Ministério Público? Será que não é hora de se abrir o debate, de uma tomada de posição? Estão esnobando a natureza!

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