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Estado faz caça aos ‘desaparecidos’

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No funcionalismo estadual, as secretarias identificaram, em levantamentos recentes, casos de servidores “desaparecidos”.O caso mais emblemático é o da Fundação Estadual da Criança e do Adolescente (Fundac). Até 2004, o quadro era composto por 1.700 funcionários. Em 2013, esse número baixou para 1.105. Atualmente é composto por 823 servidores.

“Eu considero uma anomalia o corpo de servidores daqui. Como a missão da Fundac é específica, lidar com medidas socioeducativas, as pessoas deveriam ter formação voltadas para isso. Só que isso nunca aconteceu”, conta a interventora da Fundac, Kalina Leite. A delegada assumiu a fundação por decisão judicial em março deste ano. “No caso daqui, o Estado não pergunta ao servidor se ele tem aptidão ou trabalhar com adolescentes.”

Outra peculiaridade da Fundac é a carga horária de 24h trabalhadas e 96 horas de descanso para todos os funcionários. “É uma escala absolutamente ilegal que eu nunca vi em nenhum lugar, de 24 horas por 96h. Não atende a demanda dos adolescentes”, acrescenta Kalina. Ela baixou uma portaria modificando a carga horária para 12hx36h para diurnos e 12hx48h para noturnos.
Tanto a gestão municipal quanto a estadual afirmam que os funcionários resistem à implantação do ponto eletrônico. Tentativas ainda são isoladas
“Descobrimos gente que não trabalhava há anos, que tinha abandonado o trabalho. Mesmo com essa carga horária, eu paguei só hora extra a um servidor neste mês. Há três meses, eram 300 pessoas”, salienta.

Já para as maiores secretarias do Estado – saúde e educação – o problema é controlar os servidores. Levantamento da Secretaria Estadual de Educação e Cultura (Seec), em julho, mostrou que 550 servidores estavam “desaparecidos”. Até quinta-feira passada, 340 não haviam prestado esclarecimentos à secretaria e enfrentariam processo administrativo por abandono de emprego.

Na Secretaria Estadual de Saúde Pública (Sesap), foram abertos 440 processos de exoneração em 2013 por abandono de emprego. Apenas 138 pessoas foram exoneradas no ano passado, e outras 25 em 2014. Mesmo assim, outros PADs serão abertos pela secretaria: dos 145 funcionários que estavam afastados por licença pessoal – para fazer algum curso, por exemplo – desde o ano passado, 61 não retornaram. Apesar de estarem sem receber, eles terão o vínculo  com a secretaria cortado.

A instituição do ponto eletrônico foi um dos maiores desafios enfrentados pela Sesap. Somente no primeiro mês do ponto, em agosto de 2013, 80 servidores pediram exoneração. Atualmente, as 39 unidades de saúde de referência possuem a máquina.

“Hoje há uma resistência mais maquiada. É uma minoria que mantém a cultura de que servidor público não precisa cumprir a jornada inteira de trabalho”, avalia o coordenador do ponto eletrônico, Carlos Carvalho.

O ponto ajudou a controlar a folha. Em 2012, os gastos com pessoal eram de R$ 59 milhões. No ano passado, fechou em R$ 53 milhões. “A folha neste ano  subiu para R$ 64 milhões por causa do aumento salarial dos médicos”, justificou Carvalho. Somente na folha do mês passado, os descontos por falta foram contabilizados em R$ 111 mil.

A TRIBUNA DO NORTE entrou em contato a assessoria de comunicação e chefia de gabinete do secretário estadual de administração, Alber da Nóbrega, todos os dias desde a última terça-feira (22). Todos os pedidos de entrevista e de acesso aos dados foram negados.

Legislação

Lei 122/1994 da Constituição Estadual – Cria o regime jurídico dos servidores do RN
– Sobre faltas injustificadas
Art.149. Configura abandono de cargo a ausência intencional do servidor ao serviço por mais de 30 dias seguidos.
Art.150. Entende-se por inassiduidade habitual a falta ao serviço, sem causa justificada, por 60 dias, interpoladamente, durante o período de 12 meses.
Art.151. O ato de imposição da penalidade menciona sempre o fundamento legal e a causa da sanção disciplinar.
– Sobre atestado médico
§ 1º É admitida inspeção por médico do setor de assistência do órgão de pessoal, se o prazo da  licença não exceder a 30 dias, exigindo-se a de junta médica oficial se o prazo for superior.
Lei 1.517/1965 do Município – Cria o Estatuto do Servidor Público municipal
– Sobre licenças
Art. 96 – A licença dependente de inspeção médica será concedida pelo prazo indicado no laudo. Findo o prazo, haverá nova inspeção e o laudo médico concluirá pela volta ao serviço, pela prorrogação da licença ou pela aposentadoria.
Art. 100 – A licença concedida dentro de 60 (sessenta) dias contados do término da anterior será considerada prorrogação desta.
Art. 101 – O funcionário não poderá permanecer em licença por prazo superior a 24 meses
Art. 102 – Expirado o prazo do artigo anterior o funcionário será submetido a nova inspeção médica e aposentado, se for julgado inválido para o serviço público.
– Sobre faltas
Art. 158 – sem prejuízo do vencimento, qualquer direito ou vantagem legal, o funcionário poderá faltar ao serviço até 8 dias consecutivos por motivo de casamento ou falecimento do cônjuge.
Art. 162 – Ao funcionário estudante será permitido faltar ao serviço, sem prejuízo do vencimento e vantagens, nos dias de exames parciais ou finais, mediante atestado fornecido pelo respectivo estabelecimento de ensino.
– Sobre abandono
§ 1° – Considera-se abandono do cargo a ausência do funcionário (sem causa justificada), por mais de 30 (trinta) dias consecutivos.
§ 2° – Incorrerá ainda na pena de demissão, por falta de assiduidade, o. funcionário que, durante 12 meses faltar ao serviço 60 dias intercaladamente, sem causa justificada.

Bate-papo Eliel Elias Bezerra – Sindicato dos Servidores Públicos da Administração Indireta do RN

O que justifica tanta falta no serviço público?
O que a gente vê nos serviços público é a falta de responsabilidade do Governo do Estado com os servidores, principalmente com os salários, fazendo com que os funcionários se sintam prejudicados. Os servidores estão adoecendo. O prejuízo é do ponto de vista econômico e da estrutura do Estado, que não existe nos estabelecimentos. Os últimos governos não deram nenhum critério de reajuste salarial a não ser para as categorias que conseguem pressionar o governo. No caso da administração indireta, nós conseguimos pressionar para a implantação de reajustes que já existiam.

Como essa falta de estrutura afeta os servidores?
O Governo não deu a mínima atenção para a estrutura, está tudo sucateado. Por exemplo, alguns servidores da Emater têm que levar os trabalhos para casa para fazer porque simplesmente não tem internet nem telefone para fazer, pois o Estado não dá condições para fazer. No caso da Fundac, em que os servidores trabalham com adolescentes infratores, o agente ganha um salário-mínimo para trabalhar. Este governo desmantelou o serviço público.

Mas os servidores que trabalham da Fundac são de outras secretarias, não?
Um percentual mínimo vem cedido de outras secretarias, o quadro é da Fundac. O problema é que o Estado não qualificou esses servidores, então o pessoal não tem o mínimo interesse de prestar um bom serviço pela questão salarial e da estrutura. Os servidores estão em casa não porque fizeram essa opção, mas porque eles não tem mais interesse em trabalhar.

Há uma grande quantidade de servidores e não se tem um grande controle da folha. Como vocês veem o ponto eletrônico?
A responsabilidade do ponto é do gestor. Nós somos favoráveis que quem receba o salário do Estado vá trabalhar, mas não pode só penalizar o pequeno trabalhador, o que não tem apadrinhamento político. Há muitos trabalhadores que estão cedidos e não vão trabalhar. Nós acreditamos que todo servidor do Estado têm a obrigação de trabalhar.

Bate-papo Tânia Inagaki – coordenadora do curso de Gestão Pública da Universidade Potiguar

Qual é a dificuldade que o Estado enfrenta para organizar os seus funcionários?
Nós sabemos que existe uma diferença gritante entre o controle público e o privado. A atividade pública fica aquém porque não se sabe quem está trabalhando, dependemos da consciência do funcionário ou da responsabilidade e controle do gestor. Mas sabemos que já existe interesse em trabalhar um serviço público mais moderno. A instalação de ponto eletrônico, por exemplo, vai depender de como a secretaria trabalha.

O sindicalismo parece ter uma resistência ao ponto eletrônico…
Nós sabemos que essa resistência se dá porque o ponto eletrônico é uma forma de controle. Na hora que é instituído o ponto para a rede pública, nós que estamos gerindo saberemos quem são os funcionários. E nós sabemos que ainda há essa política do fantasma, não é resistência de sindicato. Ponto eletrônico é para dizer o que o funcionário faz, quem ele é, que ele não existe apenas na folha de pagamento. É acabar com essa cultura do servidor que existe na folha, mas não na atividade.

O serviço público possui muitos comissionados. É uma prática correta para o funcionalismo?
O cargo comissionado ele jamais vai ser extinto. No privado também existe, se coloca como cargo de confiança. Por exemplo: eu enquanto gestor, na hora que sou chamado para assumir uma secretaria, eu quero pessoas em que eu confie. Existe a necessidade de relacionarmos a questão do comissionado com a atividade que cada um desempenha.

Termos quase metade do orçamento público comprometido com pessoal mostra que temos uma máquina “inchada”?
Cada secretaria tem o que responde por ela, e cada um precisa acompanhar o desenvolvimento da sua secretaria. Não é que o Governo não tenha controle, cada um tem uma responsabilidade. Além disso, imagina o tamanho do Estado, às vezes nem esse número de funcionários é o suficiente para a demanda. Na realidade, é a forma como quem está no contexto está trabalhando ou organiza a forma de trabalho. Às vezes nós olhamos de fora e não enxergamos a demanda que existe.

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