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Falta de armas compromete segurança em CDP

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Marco Carvalho – repórter

Uma baladeira. O galho envolto com elásticos é a “arma” que o Estado dispõe para combater as fugas e oferecer segurança para o único agente penitenciário do Centro de Detenção Provisória (CDP), em São Paulo do Potengi. As ligas pretas e vermelhas do objeto são comumente utilizadas no interior do Estado para abater passarinhos e atingir lagartixas. Para a Secretaria de Justiça e Cidadania (Sejuc) e a Coordenação da Administração Penitenciária (Coape), a baladeira é o que existe disponível para garantir a defesa do agente e intimidar os detentos que superlotam as celas do local. O caso foi registrado no município localizado a cerca de 80 quilômetros de Natal e denunciado ao Conselho Nacional de Justiça (CNJ) em relatório enviado durante esta semana pela comarca da cidade.
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O descaso constatado através do fato inusitado foi registrado pelo juiz da comarca de São Paulo do Potengi, Peterson Fernandes Braga. Durante a segunda-feira passada, ele esteve na unidade prisional da cidade com objetivo de preencher um formulário a ser enviado ao CNJ. Quando chegou ao local, uma das perguntas buscava esclarecer qual o armamento disponível para a manutenção da segurança. “Lá só tem um agente penitenciário por plantão. Quando perguntei sobre as armas que ele dispunha, o agente respondeu que não tinha nada. Tudo o que havia no CDP era uma baladeira”, disse o magistrado em entrevista à TRIBUNA DO NORTE durante a manhã de ontem.

O CDP de São Paulo conta hoje com 33 detentos, em um espaço previsto para menos da metade dessa quantidade. O prédio apresenta vulnerabilidades como a exposição das celas para a rua. “Ali só não foge quem não quer. O espaço da garagem é utilizado como solário. Com a deficiência de agentes, a qualquer momento pode acontecer uma fuga”, afirmou o juiz Peterson Fernandes. Para a guarda dos presos, há quatro agentes penitenciários que se dividem em um homem por turno de 24 horas.

Desses quatro, dois possuem armas particulares e as utilizam no serviço. Os demais trabalham sem qualquer tipo de armamento na guarda dos presos. O Estado não oferece qualquer tipo de arma para os servidores.

A equipe de reportagem da TRIBUNA DO NORTE esteve no local e flagrou a baladeira. Com receio de represálias pelas denúncias, os servidores se resumiram a dizer que não possuíam armamento adequado e quando o juiz realizou a inspeção acabou constatando a baladeira. Os presos do local se dividem em duas celas, onde a superlotação é latente. No local, chega a se formar três “andares” de redes para acomodar os detentos. Problemas com abastecimento de água e alimentação também são registrados e relatados no CDP.

O juiz Peterson se disse surpreso com a situação. “Comuniquei à Corregedoria do Tribunal de Justiça e à Coape. A estrutura do local é frágil e os agentes ficam à mercê da sorte”, disse. Para o magistrado, o problema se repete em outras unidades do Rio Grande do Norte. “Falta vontade política para mudar essa situação”, pontuou.

Assim como em outras unidades prisionais do Estado, presos já sentenciados permanecem em unidades provisórias. Isso também foi registrado em São Paulo de Potengi. O apenado Adriano Alves de Lima está há dois anos e um mês na cela com outros 15 detentos. Interrompeu a partida de baralho para conversar com a reportagem. “Fui condenado a nove anos e quatro meses por tráfico de drogas. Mas ainda estou aqui. Não sei como faço para mudar isso. Já devia ter ido para um presídio”, reclamou o detento.

Coape planeja remanejamento de armas

O coordenador da administração penitenciária, coronel Severino Reis, encarou com ceticismo a informação da presença de uma baladeira nas instalações do CDP de São Paulo do Potengi. “Não tenho conhecimento disso e não acredito que o objeto seja utilizado pelos agentes”, disse à TRIBUNA DO NORTE durante a tarde de ontem.

Apesar disso, ele reconhece a deficiência de armamentos nessa e em outras unidades do interior do Estado. O coronel informou que está sendo planejado um remanejamento dos armamentos à disposição da Sejuc para que possa atender às demandas dos agentes penitenciários. Hoje, existem 10 CDPs na capital e outros 16 no interior do Rio Grande do Norte.

Para o coordenador da administração penitenciária, as condições de estrutura e efetivo são similares tanto em Natal quanto em outras cidades do Estado. “Os CDPs enfrentam problemas similares, como superlotação e estrutura. O que você imaginar aqui em Natal, também ocorre no interior. São as mesmas condições”, afirmou.

Presídios da capital serão inspecionados pela Justiça

Durante o mês de março, as unidades prisionais provisórias da capital do Estado passarão por uma inspeção da Justiça. O serviço será realizado pelo juiz de Execuções Penais, Henrique Baltazar Vilar dos Santos. “Farei um relatório aprofundado sobre as condições de cada unidade e as informações serão remetidas para o CNJ [Conselho Nacional de Justiça]”, disse.

O magistrado antecipou uma visão do que acredita que encontrará nos CDPs e cadeias públicas de Natal. “Essas unidades funcionam como gambiarras. Com algumas poucas exceções, nenhuma tem a estrutura adequada. A segurança é precária. Pretendemos identificar e relatar esses problemas”, afirmou o juiz Henrique Baltazar.

Durante essa semana, o juiz já havia enviado relatórios sobre outras penitenciárias. Destinado a presos que cumprem o regime semi-aberto, o Complexo Penal João Chaves comporta aproximadamente três vezes mais do que deveria, além de abrigar presos provisórios, o que não seria o ideal. Outra ponto que preocupa,  na avaliação de Henrique Baltazar, é a falta de vagas adequadas no hospital de custódia, que recebe os detentos com problemas mentais. Segundo ele, não há vagas para mulheres e há uma lista de 29 presos aguardando a remoção.

Bate-papo

Cláudio Alexandre de Melo Onofre, Promotor de Justiça da comarca de São Paulo do Potengi

Como o senhor enxerga os problemas do Centro de Detenção Provisória (CDP) em São Paulo do Potengi?

A estrutura é bastante frágil. Quando você chega ao local percebe um clima de abandono. Os servidores que trabalham lá contam com a sorte para que nada ocorra contra eles. Aquilo ali é um caos.

O que está ao alcance do Ministério Público para alterar essa realidade?

O que podemos fazer é trabalhar e cobrar para que os processos sejam concluídos rapidamente. Dessa forma, os detentos podem ser transferidos para unidades prisionais destinadas a presos sentenciados. Lá, onde eles ficam, são tratados como bichos pelo Estado.  Não há condições para mantê-los lá.

O senhor enxerga mudanças a curto prazo no local?

Falta vontade política para alterar aquela realidade. Vemos muitos discursos da Sejuc, mas pouco é feito. Outro fator que poderia nos auxiliar seria a criação de um núcleo da Defensoria Pública aqui em São Paulo do Potengi – já há demanda para isso. Quando há a necessidade hoje em dia, tem que vir de Parnamirim e isso atrasa todo o processo.

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