sábado, 20 de abril, 2024
25.1 C
Natal
sábado, 20 de abril, 2024

Há muito o que fazer com o Hotel Internacional dos Reis Magos

- Publicidade -

Nivaldete Ferreira
Escritora e professora aposentada pelo Departamento de Artes da UFRN

O “não” que se dá à demolição do Hotel Internacional dos Reis Magos-HIRM não é de ordem sentimental, mas fruto de consciência cidadã.  Foi vendido, é o que se sabe, e desativado em 1995. Está em franca decadência.  O Ministério Público-RN dá como certo que “não há nem nunca houve qualquer interesse coletivo em tornar perene uma estrutura que não tem, para Natal e para o Rio Grande do Norte, apelo histórico, turístico, paisagístico, arquitetônico ou de outra ordem” (Tribuna do Norte, 11/03/2015). Se a comunidade não foi consultada, não parece correta essa inferência. E aquele edifício tem valor histórico, sim, independentemente do período governamental em que foi construído (o mesmo vale para as velhas construções da Junqueira Aires, muitas reduzidas às suas fachadas, e todas as construções antigas deste mundo). O HIRM participa da paisagem natural de maneira harmônica, basta observar o ondeamento de sua arquitetura, em franco namoro com as ondas do mar, logo ali pertinho. Apelo turístico? Como está, realmente não tem, mas pode vir a ter e muito, pelo menos se não reduzirem o edifício ao seu andar térreo e se não criarem aí uma coleção de lojinhas, coisa que há en todo el mundo, nenhuma novidade. Ou se não permitirem a construção de espigões… Espigões é que não têm mesmo apelo arquitetônico especial (deixemos isso para Dubai). E por que pensar sempre e só nos que têm maior poder aquisitivo? E a violência? A redução da maioridade penal não resolve, já disseram os mais entendidos no assunto.

O que se poderia, então, fazer de socialmente bom e diferente ali?… Sonhar é grátis ainda… Então sonhemos: primeiro, a recompra do hotel pelo governo… Para quê?… Para se criar lá algo que abrace as urgências da realidade social e que se faça com razão-arte-e-cultura, de forma que Natal possa dizer a si mesma, ao país e ao mundo que está, de fato, promovendo mudanças para melhorar a vida de seus habitantes. Turistas preferem visitar um lugar assim, um lugar feliz e seguro, é óbvio. E há muito o que fazer naquela “estrutura”…  Um centro de fazeres múltiplos para a comunidade, por ex., e que abarque da criança ao idoso. Para as crianças, biblioteca e contadores de história; atividades criadoras, teatro de bonecos, educação ecológica (absolutamente indispensável hoje), entre outros. Os jovens –principalmente os considerados em “situação vulnerável”- aprenderiam ofícios de acordo com suas preferências: música e artes em geral; luteria; informática, marcenaria de pequeno porte, artesanato, produção de vídeos, xadrez, estamparia de camiseta…  Para os idosos, yoga, jogos, oficinas literárias que os ajudassem, por ex., a escrever suas memórias e a se reconhecerem como pessoas que, de formas diferentes, atuaram (e atuam) no mundo, e até como descarga de emoções, o que significa saúde e menos gasto do governo nessa área. Dança também para eles, alegria, sem esquecer que poderiam ensinar também, como voluntários.  E para quem escreve: uma editora cooperativa, que permitisse aos autores daqui a publicação de seus livros a baixo custo, que seriam vendidos lá mesmo, também a baixo custo, numa livraria-café! E uma galeria… Sim, e a transferência, para lá, do Instituto de Música Waldemar de Almeida, que funciona de forma precária numa dependência da Fundação José Augusto… Ufa! Muita coisa a ser sugerida, mas fico por aqui (na verdade, já sugeri isso tudo em relação a uma possível ocupação daquele prédio que fica no cruzamento da Capitão-Mor Gouveia e Jaguarari e que, diz uma placa já desbotando, se destina ao comércio familiar de frutas e vegetais, mas continua de portas fechadas)…  Parece que o que mais falta, para uma coisa assim, não é recurso financeiro (convênios podem ser feitos), mas vontade arrojada de acertar, de produzir uma cidade cultural, formadora no melhor sentido da palavra, capaz de engendrar um presente e um futuro mais seguros para os seus habitantes, num tempo sabidamente de grandes desafios –e justamente por isso. A não consideração dessas urgências sociais ajuda em muito a expansão da violência. Principalmente a juvenil, em parte certamente porque falta a tantos jovens o acesso a espaços onde possam desenvolver aptidões e respeito pela própria vida e a dos outros. Onde seja possível uma engenharia das subjetividades capaz de se antecipar às seduções das práticas criminosas, que se multiplicam sem cessar e levam a sociedade a se dividir, mais uma vez, em torno da questão da maioridade penal, sem, contudo, apontar uma saída.

É sonho demais?… Demais é perder uma oportunidade tão boa de presentear Natal com um espaço maravilhoso para coisas maravilhosas. É só fazer uma reforma. Penso que arquitetos e engenheiros aceitariam colaborar numa causa que tem tudo a ver com o equilíbrio social. Principalmente os aposentados. É, não tenho vergonha de sonhar e de pensar que outros sonharão junto, como queria J. Lennon.

- Publicidade -
Últimas Notícias
- Publicidade -
Notícias Relacionadas