sábado, 20 de abril, 2024
25.1 C
Natal
sábado, 20 de abril, 2024

‘Há novos estados no mapa e o RN pode ficar para trás’

- Publicidade -

Andrielle Mendes – Repórter

A presidente da Associação Brasileira de Energia Eólica (ABBEólica), Élbia Melo, admitiu, que o Rio Grande do Norte pode ficar para trás na corrida pelos parques eólicos, se não houver os investimentos necessários para que se torne mais competitivo. A disputa pelos parques – e pelos investimentos – ficará cada vez mais acirrada, com o avanço da tecnologia e as mudanças nos leilões, segundo ela. Élbia destaca que novos estados, alguns com melhor infraestrutura, entraram na disputa – antes liderada pelo Rio Grande do Norte – e confirma que outros deverão competir no segmento onde o RN já foi líder em projetos por leilão e começa a perder espaço. “Não vejo o RN ficando para trás ainda. Pode ser que fique a partir de agora, se não fizer nada. Vento tem. Então, o que está faltando? Provavelmente, um sinal de investimento para o setor”, analisou. Em passagem por Natal esta semana, ela concedeu a entrevista a seguir à TRIBUNA DO NORTE:
Élbia Melo: O que você percebe é que no Nordeste o Estado com maior capacidade instalada é o Rio Grande do Norte, só que o RN não tem atraído os fabricantes de equipamento. Por que? Por questões de logística. Esse é um ponto que chama a atenção
A Empresa de Pesquisa Energética, responsável por habilitar projetos para os leilões, cadastrou mais de 600 projetos para o próximo leilão exclusivo de energia eólica – recorde no mundo. A que se deve isso?

O Brasil tem um potencial muito grande de geração eólica. Os estudos que estão sendo feitos agora e serão divulgados dentro do novo Atlas Eólico Brasileiro muito provavelmente no final do ano vão demonstrar que o Brasil tem 300 gigawatts de potencial eólico. Além disso, a eólica tem sido, de 2009 para cá, a fonte que mais está negociando energia nos leilões. A fonte vem vendendo, em média, por leilão 2 gigawatts.  Tem havido um interesse muito grande dos investidores. O Brasil investe bastante em energia. Os estudos são rápidos e os projetos saem rapidamente. Tudo isso justifica essa quantidade de projetos. Em 2001, quando foi feito o primeiro Atlas Eólico, o potencial eólico brasileiro era de 101 gigawatts. E agora vai ser de 300. O reflexo disso é que este ano apareceram estados que antes não participavam dos leilões, como Maranhão, Santa Catarina, Piauí e Pernambuco.

Mas porque o potencial aumentou tanto?

Por causa da mudança de tecnologia. Em 2001, os estudos foram feitos para torres de medição de 50 metros de altura e aerogeradores de menos de 1 megawatt. Agora são feitos para  torres de 100 a 120 metros e aerogeradores de até 3 MW cada. Essa máquina mais alta e mais potente permite captar ventos que não se aproveitava antes. Com a nova tecnologia, consegue-se aproveitar ‘ventos médios’ e começam a surgir projetos em outras regiões. A tendência é que o Brasil passe a fazer investimento também no estado do Rio de Janeiro, São Paulo, Minas Gerais, ou seja, quase o país inteiro vai poder aproveitar e fazer investimento  em energia eólica. Esse é um fator importante.

Esse potencial, estimado em 300 GW, pode então ser ampliado com o avanço da tecnologia…

Isso. Nós falamos que nosso potencial eólico estático hoje é de 300 GW, porque qualquer mudança em tecnologia permitirá mais aproveitamento e mudará esse potencial.

A tendência para os próximos leilões é que eles recebam mais projetos e fiquem ainda mais competitivos?

Sim. Quando você tem uma quantidade maior de projetos   inscritos e a demanda tende a ser a mesma, na média, os leilões tornam-se mais competitivos. Para esse ano, nós imaginamos que os leilões não seriam tão competitivos pelo fato das linhas de transmissão, porque agora os projetos que vão participar só podem ser projetos com linhas de transmissão.  No entanto a sistemática publicada essa semana pelo Ministério de Minas e Energia mantém a mesma competição, porque os projetos inscritos vão para habilitação e depois a leilão. E todos vão poder participar da primeira fase do leilão. Eu digo que o leilão vai ser extremamente competitivo.

O leilão a ser realizado em agosto atrela a contratação dos projetos à garantia de escoamento da energia. Que vantagens e desvantagens esse modelo traz?

Eu acho que esse modelo e essa escolha de fazer um leilão com garantia de linhas muito importantes, porque linha hoje é um gargalo no Brasil, não só para energia eólica, mas para energia elétrica de uma forma geral. Então, não faz muito sentido fazer um leilão sabendo que não vai ter a linha. Embora estejam sendo remunerados mesmo com os parques parados, os investidores não têm interesse em construir um parque eólico e o parque ficar parado. Eles querem produzir energia. É claro que o modelo é ruim por um lado, porque acaba deixando muitos projetos de fora. Muitos estados reduzem muito os projetos. Mas isso é uma questão de curto prazo, porque no médio e longo prazo, isso será solucionado com o leilão de linhas estruturais e planejadas. É claro que o setor vai ser penalizado no curtíssimo prazo, mas haverá uma solução de longo prazo.

Esse novo modelo não acaba penalizando estados como o Rio Grande do Norte, que não tem linhas e subestações suficientes para escoar energia eólica, mesmo que no curto prazo?

É, na realidade ele penaliza todos os estados. Todos os estados estão com esse problema – em maior ou menor grau. Os 665 projetos de parques cadastrados no próximo leilão têm restrição de linhas. Ainda assim não será tão prejudicial, porque há mais oferta que demanda. Acredito que vamos ter muito mais restrições regionais do que restrições quanto a quantidade de energia eólica vendida. Vamos continuar vendendo  no patamar que a gente vendia. A diferença é realmente regional e isso você só vai perceber depois do resultado do leilão, porque a gente não sabe exatamente onde estão essas linhas.

Embora ainda lidere em oferta de energia contratada no país, o RN já não é o estado que mais apresenta projetos por leilão. Isso se deve a dificuldade de escoamento de energia eólica?

Eu acho que são infinitos fatores que explicam isso. Não é um fator isolado. Este ano a gente tem a questão das linhas. Há casos de empreendedores que estavam com projetos para regiões muito distantes, olharam e disseram: “sem condições, não podemos nos inscrever no leilão, porque não vamos conseguir escoar energia”. Então, a linha afetou também. Agora o que é importante, que eu estou percebendo, principalmente neste leilão, é que, de fato, estão aparecendo outros estados no mapa eólico brasileiro. E se os estados detentores dos recursos eólicos, do vento de boa qualidade, não fizerem uma política destinada ao setor, tendem a perder a competitividade. O vento é um fenômeno da natureza que o estado tem, mas não é só isso que basta. É importante que haja uma preocupação do governo estadual de fomentar essa indústria. E eu não estou falando em dar subsídios para  a indústria, retirar ICMS, ISS, mas sim do governo do estado prestar atenção naquele potencial de investimento e dar as condições para esse investimento, e isso está associado à logística, seja de transporte seja de transmissão, está associado a celeridade na liberação das licenças ambientais, entre outras coisas.
Élbia Melo: O vento é um fenômeno da natureza que o Estado tem, mas não é só isso que basta. É importante que haja uma preocupação do governo estadual de fomentar essa indústria
Outros estados já despertaram para esse mercado…

Isso. E os investidores já estão olhando para esses outros estados. E aí você percebe que os estados que estão aparecendo tem uma estrutura boa, principalmente no que se refere a portos, estão crescendo muito e atraindo as fábricas de equipamentos. Porque uma coisa é atrair o parque eólico. Outra é atrair as fábricas. O que você percebe é que no Nordeste o estado com maior capacidade instalada é o Rio Grande do Norte, só que o RN não tem atraído os fabricantes de equipamento. Por que? Por questões de logística. Esse é um ponto que chama a atenção. Os estados têm que realmente estar atentos para entrar nessa corrida de captação de investimentos e atrair a cadeia produtiva e os seus benefícios.  Tudo isso tem que ser pensado.

Ainda dá tempo de o RN recuperar o espaço perdido?

Não vejo o RN ficando para trás ainda. Pode ser que fique a partir de agora, se não fizer nada. Pelo menos, a minha leitura é diferente. Se você observar os projetos que foram leiloados de 2009 para 2017, vai observar que o RN é o líder e está lá na frente. Mas a partir de agora tem que ficar atento e criar as condições – ou manter as condições que tinha – para trazer os investimentos para cá. Vento tem. Então, o que está faltando? Provavelmente, um sinal de investimento para o setor, e isso é um papel importante do governo estadual.

Representantes de quatro estados nordestinos vieram no início do ano até o RN participar de uma reunião sobre o setor. Eles discutiram a construção de um linhão que interligasse os parques em todos os estados e escoasse energia. Esse projeto seria elaborado com base em estudos da ABBEólica. A associação já concluiu os estudos?

A gente está de fato trabalhando no estudo desse linhão, mas independente disso existe um pacote a ser leiloado pelo Ministério de Minas e Energia que vai trazer toda a infraestrutura básica para esses estados. Ele não substitui nosso projeto, mas alcança em grande grau o que pretendíamos, tanto que o estudo que vamos continuar elaborando vai ser adaptado a partir desse projeto para aprimorá-lo.

- Publicidade -
Últimas Notícias
- Publicidade -
Notícias Relacionadas