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Hipocondria: doença ou sofrimento imaginário? (2)

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Hilton Marcos Villas Boas – psiquiatra

Dando continuidade ao artigo da semana passada, vale ressaltar que o transtorno hipocondríaco, é conhecido também como a neurose de doenças. Ou seja, o que acontece neste tipo de transtorno, é que o indivíduo possui uma sensibilidade corporal exacerbada, devido estar sempre muito voltado para o seu próprio corpo (olhando sempre para o seu umbigo). O hipocondríaco, na verdade, tem uma ansiedade enorme, aliada a uma grande dificuldade de fazer contacto com pessoas e com situações onde o mesmo não se sente no controle, passando assim, cada vez mais, a centrar a sua percepção e atenção no seu próprio corpo. Daí é que o mesmo, a vigência de qualquer alteração fisiológica (respiração Alterada, ritmo cardíaco diferente, uma maior sudorese, formigamento de extremidades, ruídos digestivos e outros) rapidamente é percebido, e como o mesmo, por ser controlador e pessimista, não consegue controlar tais situações, começa a dar uma interpretação a esses fatos, como um risco iminente de estar com alguma doença séria, a qual pode levá-lo a morte ou conseqüências muito graves e irreversíveis.

Da situação relatada acima, advêm o fato do hipocondríaco na maior parte do tempo estar tomando remédio, ou buscando algum remédio para usar, por se achar apavorado com o risco de estar doente, normalmente de uma doença grave, da qual quer fazer de tudo, o mais rápido possível, para eliminar a mesma, ou sintomas da mesma (causadores de toda esta gama de sentimentos).

Podemos comparar a cabeça do hipocondríaco com um circo de horrores, onde o mesmo tem a capacidade de elaborar os pensamentos mais mirabolantes, acerca das piores doenças que alguém possa imaginar (de uma simples dor de cabeça, pode imaginar que esta tendo um acidente vascular hemorrágico, ou um tumor e irá morrer).

O raciocínio do hipocondríaco acontece mais ou menos dessa forma: “estou aqui pensando de onde pode ter surgido essa dor de cabeça, até hoje de manhã eu não estava sentindo nada, será que é uma enxaqueca? Não, não pode ser eu nunca tive enxaqueca, deve ser algo bem mais grave, quem sabe eu não estou tendo um AVC (acidente vascular cerebral)? O melhor mesmo é ir a um Pronto Socorro, pois os exames que eu fiz a semana passada, todos foram normais, sinal que essa dor deve ser algo grave. Após ser avaliado clínica e laboratorialmente, e descartado os diagnósticos de enxaqueca e AVC, o mesmo imediatamente aventa a possibilidade de estar acometido por outra doença, por exemplo, ummm, na verdade devo estar acometido de um tumor no cérebro. E a partir daí, novamente começa uma via sacra de medico em médico, enquanto ele não descarta esta possibilidade a cabeça fica o tempo todo pensando em coisas ruins, e quando descartar esta possibilidade, outra tomará o seu lugar e assim por diante”.

A hipocondria faz com que o seu portador não encare a realidade, ele desvia o foco, não percebe, não vê, e nem tão pouco se importa com os problemas do cotidiano, da vida real, passa o tempo todo ruminando e centrado em seus sintomas e pensamentos pessimistas. Ocorre nesse momento, aquilo que já conhecemos de outras patologias, o indivíduo se acomoda, e como se se entra em uma zona de conforto, em um mundo que ele já conhece, sabe como administrar o mesmo, não sente entusiasmo e nem tão pouco necessidade de evoluir e crescer na vida.

A Hipocondria, assim como o Transtorno Obsessivo Compulsivo, tem uma ligação direta principalmente com os quadros de depressão e ansiedade. Os indivíduos acometidos por tal transtorno, geralmente são por essência pessimista, possuem uma visão sombria de tudo e têm um enorme sentimento de culpa (conscientes ou inconscientes), daí sempre se achar merecedores de castigos (que na verdade seria a própria doença).

Com relação ao tratamento desse tipo de neurose, e fundamental que o portador da mesma esteja disposto a investir firmemente em um trabalho de psicoterapia, objetivando que o mesmo possa visualizar os sentimentos e conflitos, que na verdade são os fatores desencadeantes de toda a sua sintomatologia e de suas desconfianças. A avaliação de um bom profissional da psicologia, de acordo com a gravidade do caso, pode determinar que o mesmo tenha que encaminhar o portador do transtorno, para uma avaliação do psiquiatra, o qual de acordo com o quadro clínico do paciente poderá lançar mão do uso de antidepressivo, ansiolítico ou uma associação de antidepressivo com ansiolítico, em conjunto com a psicoterapia.

O uso de antidepressivo, no transtorno hipocondríaco, deve-se ao fato do antidepressivo tratar a ansiedade, e também porque é comum a hipocondria estar associada a quadros depressivos, situação essa que pode levar ao paciente a apresentar o chamado delírio hipocondríaco. Outra associação muito comum, que pode ocorrer com o portador de hipocondria, e o mesmo também ser portador de TOC (transtorno obsessivo compulsivo). 

Quanto ao prognóstico, os estudos existentes mostram uma possibilidade de até 10% de cura para o transtorno, 66% dos pacientes poderão ter recaídas do transtorno e 24% dos pacientes não apresentarão melhora.

Quanto aos fatores de risco para a hipocondria, podemos dizer não existir causas que, por si só, justifiquem-na, no entanto podemos citar alguns fatores de risco: um dos mais importantes é quanto o indivíduo, a despeito de exames, consultas e demais meios indicarem que o mesmo se encontra perfeitamente saudável, ele insistir na existência de que tem uma doença e passa a sofrer com isso; convívio com pessoas da família ou próxima acometida de doença grave; pessoas excessivamente metódicas, com baixa auto-estima, e que se sentem culpadas por desacertos na família, na vida pessoal ou profissional; preocupação exagerada com o físico; a proximidade com doenças graves; o paciente deprimido; os ciberhipocondríacos (indivíduos que investigam por conta própria, na net doenças que acreditam ter ou que possam desenvolver) e outros.

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