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Lembrança que o tempo não desfez

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Valério Mesquita – Escritor

Não há melhor maneira de visualizar a eternidade que de uma janelinha aberta sobre a imensidão dos campos. Mas, pra mim bastaria o simples repouso contemplativo sobre o jardim ou as árvores do quintal de nossa antiga casa em Macaíba. Elas têm a força do resgate das estações. Quantos fatos idos e vividos não presenciaram? Quantos olhares perdidos no tempo não posso recolher do velho jardim, impregnados nas folhas, nas rosas, nas pétalas dos “dedais de ouro” ou no jasmim debruçado há mais de cinquenta anos sobre o muro da calçada, cansado de dá boa noite? A estátua da Deusa Minerva, de louça portuguesa, chantada no centro do jardim e chegada com a casa há mais de cem anos passados, ainda guarda ciumenta e sobranceira a beleza e o perfume das rosas. A maior e a mais antiga das rosas não está mais no jardim. Ela o fez. Dona Nair, do alto da sua longevidade, não o cultivando mais, associou-o a sua vida através do doce mistério da contemplação das manhãs de ressurreição. Câmara Cascudo imerso nas brumas dos oitenta anos dizia que “era uma saudade em vida agarrada ao sonho de continuar a viver”.

Não há força mais dramática na passagem do ser humano pela vida do que a do senso trágico da sua própria brevidade. Partilhou com a minha mãe todas as emoções de sua velhice. Os seus repentes, as suas fragilidades e, acima de tudo, o patrimônio indescartável de suas lembranças. “Meu filho, a velhice é um fracasso”, queixava-se sob o peso de suas deficiências. Ao me ver cercado de amigos, conversando política, arriscava um prognóstico incontestável: “O Partido Social Democrático (PSD) nunca perdeu uma eleição. Eu e Mesquita demos aqui em Macaíba brilhantes vitórias. E como está esse ano?”. Era a heroína política anônima, ainda crédula na grandeza do último milagre do velho PSD de 1947, revivendo  e reinventando as emoções limpas e as ilusões que um dia viajaram com ela.

A vida nunca é longa demais. Dou-me conta de que os mortos vivem mais em nós do que os vivos. É essa a impressão que me ficou. No dia passado quando revisitei a casa que fora dos meus pais em Macaíba. O jardim pareceu-me rejuvenescido. As roseiras infundiam um viço turbador como se quisesse me convencer que a sua antiga pastora estava li. O velho “dedal de ouro” explodia o seu amarelo vivo. As “espirradeiras” floriam festivamente acompanhadas das “onze horas”, do “boa noite”. O jasmineiro, ao portão, recordava as idas e as vindas de dona Nair e se ofereciam em buquet como dantes. O jardim, afinal, permanecia o mesmo numa suave e terna liturgia de saudade.

Dentro da casa, os objetos inanimados confundiam-me. Passavam-me a impressão desesperada de que ali ainda morava a vida, com vozes, cuidados, espanadores, vassouras. O óleo de peroba ainda não enxugara de todo. Tudo estava em seu lugar. Nada havia sido mexido. A cadeira de dona Nair, a mesa grande da copa, os sofás das conversas políticas, o alpendre – passarela dos notáveis e mendigos – tudo era ressurreição de ambiente. Os quartos, as salas, a cozinha, nada se modificara nem depois do velho Mesquita nem depois de dona Nair. Dali, fui rever a minha antiga biblioteca. Revirei livros e adicionei alguns. Detive-me nos quadros, passagens da vida, momentos felizes, tudo tão fugaz mas sempre verdadeiro. Lágrimas furtivas regaram alguns instantes pontuais de profundidade vital.

Certa vez, fazia com a minha irmã Nídia um “levantamento” dos bens materiais deixados pelos nossos pais, após longa atividade política. Não tivemos nenhum trabalho. Todo espólio se resumiu na velha residência da rua Francisco da Cruz nº 39, centro, herdado do nosso avô. Tal declaração, em vez de nos envergonhar, muito nos orgulha. Chegamos a conclusão cômica, mas cômoda, para não dizer trágica: a família Mesquita em Macaíba não detém nenhuma referência de bens imobiliários. Restou apenas, como imóvel, o túmulo no cemitério. Mas, a nós, filhos de Alfredo Mesquita Filho e de Nair de Andrade Mesquita, basta-nos o legado de honradez, de amor telúrico e de honestidade com que abraçaram a vida pública.

Acompanhado dos meus filhos Isabelle e Rodolfo, para a visita protocolar do dia de finados, retornei ao fio da meada das minhas relembranças. Os dois não chegaram a conhecer o avô. Apenas, a avó. Após caminharem comigo pelos compartimentos da casa, fomos fazer a visita ao túmulo. Procuro transmitir aos filhos a memória dos antepassados.  Sim, os nossos mortos não são estrangeiros. Não se extinguem pela ausência física. Eles vivem em nós porque o passado não morre como querem alguns. Saí de Macaíba em paz comigo mesmo. Contemplei os filhos e refleti que eles são frutos do tempo. Afinal, o tempo é obra de Deus.

II Taça Tribuna do Norte foi disputada por 30 jogadores

O segundo torneio de xadrez pensado promovido por Fama em parceria com a Academia Damasceno, disputado por 30 jogadores, foi vencido pelo veterno Neri Silveira, ex-campeão estadual, que já havia obtido o título em 2011. Repetido a ótima atuação do ano passado, Neri chegou ao final da competição invicto, com quatro vitória e um empate.

O vice-campeão, Rafael Albuquerque, também vice em 2011, fez a mesma pontuação (4.5 pontos) de Neri Silveira, mas, pelos critérios de desempates, ficou em segundo lugar. O vencedor da categoria Sub 20, Allysson Muniz, é uma das revelações da novíssima geração, tendo feito o aprendizado na Academia Damasceno.

Realizado no último fim-de-semana em cinco rodadas, a 2ª edição da Taça Tribuna do Norte registrou um aumento de 25% dos concorrentes em relação a 2011. Fama registra a excelente organização a cargo de Alécio Damasceno, diretor, e de Lênia Damasceno, professora de xadrez, que exerceu a função de árbitra.

Foi um torneio difícil e super-disputado, como se pode atestar pela pontuação. 16 jogadores alcançaram 50% do rendimento, isto é, a partir de 2.5 pontos:

Neri Silveira e Rafael Albuquerque (4.5 pontos); Tales Gomes, Alexsandro Lira, Antônio Barbosa, (4 pontos); Francisco Quarenta (3.5 pontos); Isac Dantas, Antônio Araújo, Alécio Damasceno, Átila Damasceno, Vitor Araújo Matheus Queiroz, Cardenas Damasceno, Bruno Uchoa (3 pontos); Allysson Muniz e Valério Andrade (2.5 pontos).

Periscópio Potiguar

PRESENÇA – Entre (os muitos) que foram prestigiar o lançamento (Bella Napoli) da segunda edição (Offset Editora) do livro de Isolda Lemos (“Do Ventre da Cordilheira”); o ex-prefeito Carlos EduardoAlves, o vice-governador Robinson Faria, o deputado José Dias, o escritor João Batista Machado, o jornalista Alex Medeiros, o personagem natalense favorito de Nei Leandro de Castro, Alex Nascimento.

AMIZADE – Sobrinha de Nilda Carneiro, conheço Isolda Lemos desde a adolescência. Ela sempre foi querida pelos familiares e os amigos. Elese estavam na Bella Napoli: Eimar Carneiro Marinho & Ana D’Arc; Luiz Alberto Marinho & Lai; José Roberto e Tânia; Eliane Marinho, Teresa Alves; Júnior, o editor do livro.

VÍTIMA – Ela nunca foi assaltante de banco, não queria derrubar o governo, nem sequer era politizada. Era apenas uma jovem esposa, com dois filhos pequenos (Yasmin & Rubinho), que fôram ao Chile para reencontrar o marido, jornalista potiguar Rubens Lemos. Essa sim, foi vítimada tirania militar, mas, apesar da tragédia que se abateu sobre a sua família, não foi indenizada pelo Estado – ao contrário, por exemplo, de membros da simpática e vivaldina esquerda festiva carioca.

MEMÓRIA – O livro de Isolda relata o calvário dela, do marido, do casal de filhos: “Episódios reais, que falam de alegria, tristezas, prisões e experiências no exílio. Tempo confuso que nunca entendi. Não é uma obra literária, é apenas uma carta para Yasmine” – uma carta de mãe para filha.

BIOGRAFIA – Diógenes da Cunha Lima está – entre outras coisas – ultimando a biografia de Ronaldo Cunha Lima: “Ronaldo, o Natalense”. Além de suas múltiplas atividades como advogado, o Presidente da Academia Norte-Rio-Grandense de Letras ainda encontra tempo para sua intensa atividade literária. Desconfio que o seu dia não tem (apenas) 24 hora.

CASCUDINHO – A Secretaria Municipal de Cultura de São Paulo vai distribuir “Cascudinho, O Menino Feliz” na rede escolar. Enquanto isso, em Natal…

FILME – Agradeço ao colecionador José Delfino Neto a cópia de “Estranho Encontro”, o filme-revelação do talento do diretor paulista Walter Hugo Khouri, que, como tantos outros títulos brasileiros, não foi lançado em VHS, nem, até agora, em DVD.

AGRADECIMENTO – Ao deputado José Dias pelas generosas palavras sobre o meu trabalho jornalístico, até porque, entre nós, esse tipo de reconhecimento é raríssimo.

XADREZ – Gente com quem convivi no Clube de Xadrez de Natal, na época em que funcionava na sede na Cruz Vermelha (Av. Rio Branco), anos 50: Dr. Sérgio Guedes. Amigo íntimo de meu pai, Clidenor Andrade, tinha uma pecularidade: gostava de assistir as partidas dos amigos. Sentava-se ao lado do tabuleiro, torcendo silencioso como um budista, e, mesmo quando percebia o lance errado, sua fisionomia não se alterava. Jamais tirava o paletó do terno de linho branco, nem afrouxava a gravata. Vez por outra, acendia um cigarro. Sizudo, somente falava quando o jogo terminava, aí, então, mostrava a combinação vitoriosa.

INTERVALO – Tempos diferentes, tempos difíceis, esses que venho vivendo – ou, sobrevivendo. Por recomendação médica, é também sugestão de amigos, vou até o meu refúgio carioca, voando nas asas do crediário. Lá não sou Rei, mas, pelo menos…, deixa pra lá. Fama, porém, não sairá de cartaz, salvo se houver algum acidente de percurso.

AVISO – Além do site do FestNatal, o blog Refletores da Fama também foi desativado. Correspondência para Fama: Av. Dom Joaquim de Almeida, 45, Bloco F./104. Lagoa Nova. Cep: 59056-140.

Filmes que não esqueci

MÚSICA E LÁGRIMAS, 1954, biografia. Direção: Anthony Mann. Anna Maria Cascudo Barreto, escritora membro da Academia Norte-Rio-Grandense de Letras.

As Férias do Sr. Hulot, 1953, França, comédia. Diretor e protagonistsa: Jacques Tati. Arnóbio Fernandes, crítico de cinema.

AMACORD, 1973, Itália, comédia. Direção: Federico Fellini. Anchieta Fernandes, pesquisador cinematográfico.

O ANO PASSADO EM MARIENBAD, 1961, França. Drama. Direção: Alair Resnais. Bené Chaves, crítico de cinema.

AMOR NA TARDE, 1957, comédia. Direção: Billy Wilder Cláudio Emerenciano, membro da Academia Norte-Rio-Grandense de Letras

MINHA BELA DAMA, 1964, musical. Direção: George Cukor. Ernani Rosado, médico, membro da Academia Norte-Rio-Grandense de Letras.

M, O VAMPIRO DE DUSSELDORF, 1931, Alemanha. Policial. Direção: Fritz Lang. Francisco Sobreira, crítico de cinema.

AMOR SUBLIME AMOR, 1961, musical dramático. Direção: Robert Wise.Franklin Capistrano, médico, vereador.

AURORA, 1927, drama. Direção: F.W. Murnau. José Delfino Neto, médico.

O SOL POR TESTEMUNHA, 1959, França, policial. direção: René Clement. Rubens Lemos Filho, jornalista, cronista.

O OURO DE MACKENNA, 1970, Western. Direção: J. Lee Thompson. Tony Rocha, cinéfilo.

PINÓQUIO, 1940, desenho animado de longa metragem dos estúdios de Walt Disney.Valério Andrade, crítico de cinema.

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