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Lógica invertida

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Francisco de Sales Matos
(Procurador do Estado, Professor da UFRN)

Em minhas andanças pelo interior do Estado, terminei meu último sábado em Parelhas, após uma semana extenuante (em Parelhas é um perigo o cabra falar que estava estressado) indenizando terras da Barragem Oiticica. Tive a honra de ser  distinguido com um convite para fazer-me presente ao casamento de um ex aluno, convite esse estendido à comemoração festiva, única parte do evento que pude prestigiar, por culpa que não me coube. O fato é que fui brindado com uma noitada maravilhosa, porque pude privar do convívio de pessoas de bem, dentre elas o pai do noivo, o Dr. Antonio Petronilo, médico e político de nomeada da região do Seridó.

Em que pese o ambiente festivo, colóquios maravilhosos fizeram da noite uma criança e se não resolvemos os problemas do Brasil andou muito perto. Mas, de todo aquele bate papo dois temas sobressaíram de modo especial e seriamente: o primeiro concernente à regularização jurídica dos bens públicos e o segundo acerca das cerâmicas de Parelhas versus meio ambiente.  O velho líder ficou de queixo caído quando lhe disse que o Estado do Rio Grande do Norte perdera, num passado recente, uma verba de quase duzentos milhões de reais, para aparelhar as escolas públicas, porque os prédios públicos escolares do Estado encontravam-se, como se encontram irregulares juridicamente, ou, simplesmente, não passam de meras posses.

E, mais, asseverei que a resolução do problema estaria em se aprovar uma lei nacional ou junto ao governo da República, como sugeri à época, visando simplificar os procedimentos inerentes. Outrossim, que este escriba, na condição de Procurador Geral do Estado de então, já havia produzido uma minuta do texto legal a pedido do então secretário da educação Rui Pereira, na verdade uma proposta de medida provisória, para ser encaminhada ao governo federal. Em havendo a previsão legal, desafiei, regularizaria juridicamente os prédios públicos escolares do Estado num prazo de seis meses, salvo se não contasse com a boa vontade do Judiciário e dos Cartórios do Registro de Imóveis. Deu a lógica invertida. O Estado perdeu a grana, se não toda, mas quase tudo.

Quanto ao segundo assunto, as cerâmicas e o meio ambiente, esta intriga de verdade. Hoje Parelhas conta com 36 cerâmicas aproximadamente. Se incluirmos a região de Carnaúba dos Dantas esse número sobe para 60 cerâmicas. Tudo queimando lenha. De todas elas não mais que 10% estão trabalhando sustentavelmente. Então, estão indo pro pau o aluvião dos rios, que sustentariam as matas ciliares, e a cobertura florística da região em decorrência do manejo inadequado e criminoso, desertificando. O IDEMA faz um esforço hercúleo para fiscalizar e os ceramistas; por outro lado, o mesmo esforço fazem os mesmos ceramistas para burlar a fiscalização. Enfim, em meio a essa briga de rato com gato há vidas humanas que precisam sobreviver. São centenas, quiçá, milhares de empregos, de famílias, que estão sobrevivendo direta ou indiretamente daquelas atividades.

Sociologicamente, portanto, aquelas relações de produção agressivas, em que pesem artesanais, há muito justificam uma intervenção efetiva do Estado, não somente do poder de polícia para coibir e punir, mas de políticas públicas compatíveis para libertar e desenvolver. E aí a pergunta que não quer calar: por que no Rio Grande do Norte a Petrobras tão exuberante na produção de petróleo e gás, eficiente na queima deste último (estima-se que “queimou” em 2009, aproximadamente R$ 1,5 bilhões de reais), não consegue conceber um programa para promover a utilização desse gás na produção das cerâmicas, por exemplo? Será que a empresa que gasta bilhões de dólares queimando gás, não poderia gastar uns milhõeszinhos de dólares para resolver esse problema grave das cerâmicas do RN, salvando o que resta de nossa cobertura florística? Enfim, será que esse custo seria maior que o custo de desertificação que estamos vivenciando? Penso que essa lógica com relação às questões suscitadas, anda invertida, na contramão da história. Com a palavra os senhores gestores e os que pretendem sê-lo, pra começo de conversa!

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