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Morre major Cleantho, um dos heróis da II Guerra

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Leandro Cunha – Repórter

O semblante de admiração e respeito no rosto dos amigos foi maior que as lágrimas derramadas no velório do major Cleantho Homem de Siqueira. O ex-combatente das Forças Expedicionárias Brasileiras (FEB) na Segunda Guerra Mundial morreu na manhã de ontem, aos 89 anos, na Unidade de Terapia Intensiva da Policlínica do Alecrim, em Natal, em consequência de infecção generalizada que gerou falência múltiplas dos órgãos. Em uma página de rede social, algumas pessoas deixavam mensagens de agradecimentos a um dos heróis do exército brasileiro.
Major Cleantho (ao centro da foto), com os ex-combatentes Severino Gomes e Geraldo Seabra
Durante a parte da tarde, parentes e amigos que se fizeram presentes no Centro de Velório São José mostraram a afeição e respeito que tinham pelo ex-militar da FEB. Pai de oito filhos, seis homens e duas mulheres, 12 netos e um bisneto recém-nascido, Cleantho de Siqueira era tão rígido na educação quanto no quartel. Segundo Carlos Homem de Siqueira, filho mais velho, o maior legado deixado pelo pai foi os ensinamentos sobre religião e moral. “A nossa família vem de uma tradição católica implantada por ele e os preceitos morais eram baseados no respeito ao próximo, principalmente aos mais velhos”, disse. Já o também filho Everardo Homem de Siqueira, compactou com a fala do irmão em tom de emoção: “Ele era um guerreiro em tudo que fazia; o nosso guerreiro em todas as ações de sua vida”. A mulher de Cleantho Siqueira, Maria de Lourdes Siqueira, 81, bastante emocionada não quis falar com a reportagem da TRIBUNA DO NORTE. O casal se conheceu em 1944, na cidade de São João Del Rey, Minas Gerais, onde Cleantho era incluído no 11º Regime de Infantaria de Exército.
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Das histórias da 2ª Guerra Mundial contadas aos filhos, a que mais chama a atenção deles é a de uma família italiana que abrigava em sua casa durante o inverno os 10 soldados brasileiros que Cleanto comandava. “Meu pai contava que durante o inverno rigoroso na Itália entre o final de novembro de 1941 e início do ano de 1942, uma família de lá abrigava os soldados brasileiros quando eles não estavam em combate. A tropa como uma forma de agradecimento dividia com a família a única refeição do dia. Primeiro eram as crianças daquela família, depois os adultos e por último os soldados”, recordou Carlos Siqueira. Cleantho contou ainda sobre essa família que tinha um carinho especial com uma menina chamada Silvana, de apenas dois anos, já que todas as noites cantava a música “sertaneja”, sucesso na época do brasileiro Orlando Silva, até a menina adormecer e depois colocá-la no berço.

Dos “pracinhas” potiguares, 25 ainda estão vivos

Dos 301 “pracinhas” potiguares componentes da FEB na Segunda Guerra Mundial, atualmente devem estar vivos 25 deles, segundo o ex-combatente e amigo de Cleantho de Siqueira, Severino Gomes de Souza. “Montamos a Associação dos Veteranos da Força Expedicionária Brasileira (ANVFEB) e nesses últimos anos constatamos que poucos estão lúcidos e andando com as próprias pernas”, comentou.

Sobre a amizade com o major Cleantho, o capitão Souza afirmou: “Cleantho era meu irmão, ele ia a Recife quando eu era lotado lá e eu vinha a Natal para vê-lo. Quando vim de vez para Natal há poucos anos eu ia em sua casa duas vezes na semana”. Cleantho Homem de Siqueira estava morando atualmente na rua Manoel Dantas, número 428, em Petrópolis.

Outro companheiro potiguar de Cleantho, na guerra, foi Joaquim Hipólito de Medeiros, atualmente, com 91 anos e sem parte da audição. Ele destacou que Cleantho era gente boa e resumiu o sentimento que estava no momento na frase: “Ele não era para ter morrido”. Já Alcindo Arnaldo da Silva disse que Cleantho era um cara que apesar de ser rigoroso com suas coisas, não gostava de armar confusão com ninguém, evitando muitas delas.

“Era um homem de bem, sem falar que era muito culto”, falou. Alcindo Arnaldo da Silva fez referência ao livro escrito por Cleantho Homem de Siqueira sobre a participação de norte-riograndenses em guerras.

Luta de soldados potiguares ganha registro

Cleantho Homem de Siqueira tinha o sonho de lançar um livro sobre a participação na Segunda Guerra Mundial para 2012. Foi além e escreveu sobre a luta de soldados potiguares pelo Brasil desde a Guerra do Paraguai entre 1864 e 1870 e lançou o material coletado em 2007 pela Editora da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (EDUFRN).

“Guerreiros Potiguares – o Rio Grande do Norte na Segunda Guerra Mundial” é mais didático do que um relato de experiência na maior guerra já vista pela humanidade. O livro passa desde a noção inicial do que seja uma guerra, passando por Guerra do Paraguai, criação da FEB e participação do órgão na Segunda Guerra Mundial enfatizando Natal como praça de guerra e a ação de sua tropa na Itália na conhecida Batalha de Monte Castelo, em que ficou marcado por barrar o avanço nazista no norte da Itália.

Para Alcindo Arnaldo da Silva, o livro serve como uma fonte de pesquisa importante para o estado, para professores e estudantes. “Conhecer a história de um país é um passo para planejar e desenvolver o futuro. Infelizmente nem os professores de História sabem o que se passou com soldados brasileiros na guerra. Só as pessoas que estiveram lá são capazes de detalhar o que foi vivido por nós”, disse. Cleantho estava na metade de seu segundo livro, desta vez mais autoral de sua participação na guerra.

Sobre Cleantho Homem de Siqueira

Cleantho Homem de Siqueira é natural de Natal e nasceu no dia 20 de dezembro de 1922. Em 1939, com 17 anos, tornou-se reservista com atirador da Companhia Quadros. Em 1942 tornou-se cabo e sargento da mesma unidade após realização de curso. No mês de novembro do mesmo ano foi convocado para o serviço ativo do Exército, sendo incorporado no 16º Regimento de Infantaria em Natal. Dois anos depois, incluído no 11º Regimento de Infantaria de São João Del Rey, o então 3º sargento Cleantho partiu em 22 de setembro de 1944 para o Teatro de Operações da Itália, integrando a Força Expedicionária Brasileira na Segunda Guerra Mundial.

Cleantho voltou ao Brasil em 17 de outubro de 1945. Despediu-se do Exército no ano de 1973 por atingindo a chamada “compulsória por tempo de serviço quando exercia a função de Capitão do Quadro de Oficiais de Administração.

A partir de então passou a colaborar na Pró-Reitoria de Assuntos Estudantis da Universidade Federal do Rio Grande do Norte até o ano de 1991. Nesse período implantou a Divisão de Atividades Desportivas, foi coordenador do Restaurante Universitário e participou da equipe administrativa da Editora Universitária.

Depois no campo social realizou por muito tempo palestras em escolas, clubes e organizações militares sobre civismo e Segunda Guerra Mundial.

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