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“Nós não conseguimos decolar”

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Andrielle Mendes – Repórter

Natal foi a capital brasileira onde os investimentos públicos mais caíram, segundo a pesquisa Multi Cidades: Finanças dos Municípios do Brasil, divulgada na última semana de dezembro de 2011, pela Frente Nacional dos Prefeitos (FNP). O quadro não mudou nos anos seguintes. “Não conseguimos decolar”, confidencia André Macêdo, secretário municipal de Tributação, se referindo ao orçamento. Em 2010, um ano após o atual gestor assumir a Prefeitura, a queda dos investimentos na capital potiguar  (recursos próprios e transferências do Estado e União) chegou a 60,5% em relação a 2009. Nas outras capitais, não ultrapassou 42%. A situação em 2011 foi semelhante a retratada pela pesquisa, afirmou na época o então secretário de comunicação de Natal, Jean Valério. “A maioria dos investimentos aguardados para 2011 não se concretizou por uma série de motivos econômicos”, disse. A Frente Nacional de Prefeitos, por sua vez, preferiu não comentar a situação de Natal, mas deixou claro que não havia razão aparente para uma queda tão brusca. Para André Macêdo, que não comenta a evolução do nível de investimento do Município, a culpa é do Estado e da União, que reduziram os repasses e convênios – que juntos representam até 70% do orçamento do Município. O repasse do FPM, principal fonte de receita do Município, em agosto de 2012, foi 4,74% menor que o registrado no mesmo período do ano passado.
André Macêdo: os convênios pararam de vir a partir de 2009
Quanto o município espera arrecadar este ano?
R$ 360 milhões, considerando os impostos (ISS, IPTU e Itive) e as taxas controladas ou não pela Secretaria Municipal de Tributação.

Esse valor é maior que o arrecadado no ano passado?
Sim. No ano passado arrecadamos R$ 335 milhões.

Que avaliação o senhor faz dos primeiros meses do ano?
Arrecadamos R$ 296 milhões entre janeiro e setembro. Faltam três meses de arrecadação. Estamos bem próximos dos R$ 360 milhões. Espero ultrapassar 4% ou 5% o orçado. Mas vou aguardar o final do ano. Só conto com o dinheiro quando está no Caixa.

Então a previsão é aumentar em 4% o orçado?
Isso. Agora, com certeza, a queda nos repasses anulará este incremento. Nossa participação no orçamento está cada vez maior. Estamos arrecadando mais. No entanto, os repasses do Estado ou União, que representam cerca de 70% do nosso orçamento, ou estão estagnados ou estão caindo.

A arrecadação tem subido, como senhor mesmo diz. Onde está o nó? Trata-se de um problema de gestão?
As receitas de Natal ainda dependem de repasses do governo do Estado e da União. Nós não conseguiríamos sobreviver somente com nossas receitas. Nossas receitas não devem chegar a 30% do orçamento. Os outros 70% vem de transferências ou convênios, operações de crédito. Toda cidade tem um limite de arrecadação. Pouquíssimas cidades são capazes de se sustentar. É muito raro não depender de FPM e de ICMS. A gente já diminuiu muito essa dependência. O problema é que esses dois impostos vem caindo drasticamente. O peso das isenções que o governo federal está dando está recaindo nos municípios. Se analisar os números de 2009 e 2010, você verá que a queda é muito significativa. Tivemos queda da atividade econômica também. Quem acompanha as notícias vê que as empresas não estão atingindo o lucro esperado. Qualquer portal de economia vai dizer isso. O governo continua com o programa de desoneração para que o quadro não se agrave. Obviamente que o governo federal continua arrecadando com outros tributos. Então ele não sofre tanto quanto os Municípios.   Isso é preocupante para gente, que gere uma prefeitura – principalmente uma de médio porte. A grande cidade consegue se sustentar e a pequena está tão abalada sem recursos que o que vem é lucro. Mas a média não. Eu penso desta forma.

O percentual este ano deve ficar em torno de 30%. Qual foi o peso da arrecadação própria no orçamento municipal em 2009?
22%.

A arrecadação própria passou de R$ 335 milhões para R$ 360 milhões. O senhor saberia dizer, na outra ponta, em quanto caíram os repasses e transferências?
Não, eu não sei informar.

Em percentual?
Seria leviano se repassasse algum número.

Dá para dizer se a queda dos repasses e transferências anulou a alta na arrecadação própria?
Mais do que anulou, apesar do nosso esforço.

O município apresentou o orçamento de 2013. O incremento, no entanto, foi muito pequeno, em termos percentuais…
É. Nós estamos muito receosos. Não sabemos ainda como a economia vai se comportar. Supervalorizar o orçamento tem seus riscos.  Apesar da economia dar sinais de melhora, a arrecadação ainda é uma incógnita. A economia mostra um novo fôlego com desoneração fiscal – redução de impostos. E aí, como vai funcionar para gente? O cálculo não é tão simples.

Como o orçamento não traz só a arrecadação própria…
Ele ficou estagnado. A operação de crédito, que é um empréstimo, mascara o orçamento.

A arrecadação subiu e o seu peso no orçamento também. Por que nem sempre incremento na arrecadação se reflete em aumento do investimento no município?
Como se investe? Com o dinheiro que arrecadamos, pagamos todas as despesas rotineiras – custeio e folha de pagamento. O que sobra investimos. É o mesmo que o cidadão comum faz com o salário. Se você arrecada mais, mas seu custeio cresce, você não investe. Se a receita cai e o custeio se mantém, você fica no vermelho.  A receita total estagnou, porque os convênios pararam de vir a partir de 2009. Os repasses de ICMS e FPM também começaram a cair em 2010. É por isso que a Prefeitura não consegue investir. Por mais que tente enxugar o custeio, ele cresce naturalmente. A inflação corrói os contratos. Eu não posso achar que vou pagar à Urbana em 2012 o peso do lixo que paguei em 2008. Dizer ‘eu vou investir em detrimento do custeio’ é possível, mas leviano, porque cria um passivo muito grande. A Prefeitura, acredito eu, nunca teria condições de investir com recursos próprios. Você não consegue investir porque suas receitas não permitem. A não ser que o investimento passasse a ser prioridade e alguns programas fossem extintos. Esta não é uma possibilidade que a Prefeitura considera. É importante dizer ainda que essa queda na capacidade de investimento não é só em Natal. Outras cidades não conseguiram investir o que vinham investindo. Infelizmente.

O senhor sabe informar a evolução da capacidade de investimento na atual gestão?
Não. Só sei que ela cai. Só não sei quanto cai nem a razão principal dessa queda.

E em relação ao custeio, sabe dizer em quanto subiu?
Não sei. Como acompanho muito de perto a Tributação, não consigo acompanhar outros assuntos.

O valor gasto com custeio chega a ser maior que o arrecadado?
Não. Isso não pode acontecer. Não se planeja gastar mais do que se arrecada. O orçamento fecha bonitinho. A arrecadação de ICMS por parte do Estado vem crescendo. Mas uma lei sancionada em 2009 mudou a sistemática do cálculo. Com isso, perdemos valores significativos. A atividade econômica deixou de ser critério para distribuição do imposto.

Dá para dizer em quanto caiu?
Citar valores vai parecer simplista. Esta informação poderia ser usada de forma incorreta neste período eleitoral. Acho melhor falar sobre isso após os ânimos se acalmarem. Não podemos ser levianos e divulgar certas informações.  O Município tem um limite de receita. Não adianta dizer: ‘a população precisa de assistência social, educação, saúde’. A gente não pode achar que o Município vai funcionar com uma eficiência tremenda neste ponto. O aumento das receitas próprias, que fica em torno de 10 a 12%, tem sido consumido com a queda nos repasses do Estado e União. Se as receitas próprias, que representam menos de 30% do orçamento, crescem 10% e os repasses, que representam 70%, caem 10%, a redução é mais forte. O peso do ICMS é muito grande. O peso do FPM é muito grande. Todos são valores superiores a R$ 200 milhões por ano. É a mesma coisa que dizer para um funcionário que o salário dele vai cair de R$ 3 mil para R$ 2,5 mil. A casa dele vai sentir, não tenha dúvida. É mais ou menos isso que ocorre com a Prefeitura. Nosso orçamento fica praticamente no mesmo patamar. Nós não conseguimos decolar. Isso não é só em Natal. Eu dirijo uma associação de secretários de finanças do país e vejo cidades como São Paulo, Belo Horizonte, Curitiba,  Rio de Janeiro extremamente preocupadas por que o nível de atividade econômica está caindo, reduzindo a arrecadação. As finanças estão se corroendo. O Município, que é o lado mais fraco, sente mais esta pressão. Além de ser o lado mais fraco das três esferas do governo, é o mais pressionado pela população. Gestões atuais de todo o Nordeste têm enfrentado dificuldade para lidar com as contas. Cidades como Fortaleza, Recife. Salvador nem se fala – tem uma situação muito parecida com a de Natal. Se analisar de forma econômica, as pessoas, por mais que não queiram entender, podem fazer uma reflexão melhor do que aconteceu. Estão cortando o seu salário, como é que você vai manter o mesmo padrão? Não é possível.

Eu lembro de uma entrevista que o senhor concedeu à TRIBUNA DO NORTE. O senhor falava no empenho em arrecadar mais…
E conseguimos aumentar a arrecadação, mas não da forma como eu queria. Não sei se estou sendo muito perfeccionista ou idealista. Eu acho que daria para fazer mais. Mas tive alguns percalços no meio do caminho. Fico satisfeito com os números, principalmente do projeto do IPTU, que para mim foi um sucesso. Estamos deixando boas ferramentas de trabalho para o próximo gestor. Mas não consegui resolver problemas crônicos da secretaria, como o prédio. Não consegui dar mais conforto ao contribuinte. Fizemos treinamento com os servidores, mas não consegui mudar a filosofia de atendimento.  Por tudo isso, acho que poderíamos ter avançado mais. Nosso ISS é o segundo per capita do estado. Estamos atrás apenas de Recife, o que mostra que conseguimos obter recursos da atividade econômica.

Por falar em IPTU, candidatos a prefeito levantaram a bandeira da revisão do IPTU para menos. Como você enxerga isso, já que foi responsável por implementar o projeto?
Acho que desistiram da ideia, porque pararam de falar. Dá para reduzir a tributação? Dá. O que o novo gestor não pode é considerar que uma casa de 100 m² passará a ter 50 m² no IPTU. O que fizemos foi reavaliar o tamanho dos imóveis, com base na inflação. Não me incomodo de que falem do projeto. Tributação é uma bandeira muito fácil de se levantar em campanha. Se o próximo gestor quiser fazer algum ajuste, ótimo. Quanto mais justo o imposto, melhor. Se o próximo colega que sentar aqui achar que fizemos errado e quiser fazer diferente, não me importo. Não sou o dono da verdade. Agora dizer que houve aumento da tributação, é mentira.

Como o próximo prefeito encontrará o caixa da Prefeitura?
Não controlo as despesas, para falar em caixa de uma forma global, mas posso dizer que ele vai encontrar uma secretaria melhor do que a que encontrei, com maior capacidade de arrecadação. Posso afirmar que ele terá melhores condições para arrecadar.

Com aumento de custos e despesas?
Eu não controlo.

Que desafios o próximo gestor vai encontrar com relação aos tributos?
O desafio é aumentar a arrecadação sem sufocar a população. Não podemos sufocar a atividade econômica nem a população com tributos, mas temos que arrecadar.

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