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‘Novo código’ trava o setor mineral no RN

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Andrielle Mendes – Repórter

O Governo Federal suspendeu a concessão de licenças para pesquisa e extração de minérios metálicos – como ferro, ouro e tungstênio – atrasando a execução de projetos e ameaçando investimentos no Brasil e no Rio Grande do Norte. Só a australiana Crusader, que pesquisa minério de ouro no RN desde 2004 e pretende investir R$ 400 milhões na produção em Currais Novos, tem 167 alvarás aguardando a publicação. “Estamos no aguardo da concessão da licença de operação para meados de 2013. Qualquer atraso nessa concessão trará consequências danosas ao empreendimento”, afirma o geólogo Robert Smakman, diretor-presidente da Crusader do Brasil, sem mensurar o prejuízo.

O Departamento Nacional de Pesquisa Mineral (DNPM), vinculado ao Ministério de Minas e Energia, não publica alvarás de pesquisa e portarias de lavra de minérios metálicos desde o final de 2011. A informação foi confirmada esta semana pelo ministro de Minas e Energia, Edson Lobão. Em entrevista ao Valor Econômico, no início da semana, ele confirmou que a ordem é reter a maior parte dos pedidos até a atualização do Código de Mineração, elaborado na década de 60 e em tramitação no Congresso. “Já há um número excessivo de concessões de pesquisa e lavra. Estamos, sim, segurando as autorizações”, admitiu, na entrevista. Procurado pela TRIBUNA DO NORTE, o ministro preferiu não comentar a medida.
Mina de ouro da Crusader, em Currais Novos: investimento de R$ 400 milhões em um cenário de incertezas
O governo só tem autorizado a liberação de licenças para extração de água mineral e insumos básicos da construção civil, como areia, brita e cascalho. Segundo reportagem do Valor Econômico, havia, no início do mês, 5 mil alvarás de pesquisa e 55 portarias de lavra pendentes em todo o Brasil. No Rio Grande do Norte, o DNPM informa que 88 pedidos protocolados este ano ainda aguardam resposta. O presidente em exercício do Sindicato da Indústria de Extração de Metais Básicos e Minerais Não Metálicos do RN, Mário Tavares, critica a forma como as concessões foram suspensas. “A suspensão foi levada a cabo por ordem verbal do Ministro Edson Lobão, sem que nenhuma Portaria, Lei ou algum instrumento legal subsidiasse tal procedimento”. 

A suspensão, mesmo que parcial, provocou uma queda no número de alvarás de pesquisa publicados no estado, segundo Eliasibe Alves, geólogo e chefe do serviço de Gestão de Títulos Minerários do DNPM no Rio Grande do Norte. O número de alvarás de pesquisa – autorização concedida para quem quer pesquisar minério – publicados no RN no primeiro semestre de 2012 foi 71,6% menor que o registrado no mesmo período do ano passado. O estado, que vinha numa espiral de crescimento desde 2009, bateu recorde em 2011. Foram publicados 657 de alvarás de pesquisa, ao todo – melhor desempenho desde que a série histórica foi iniciada. Em menos de uma década, o número subiu 417,3% no estado, alcançando um crescimento quase quatro vezes maior que o registrado no país no mesmo período.

Para Fábio Rodamillans, coordenador de Desenvolvimento Mineral da Secretaria Estadual de Desenvolvimento Econômico, a suspensão impacta a economia potiguar. Os efeitos, no entanto, só serão sentidos a longo prazo. Alguns empresários já cogitam a possibilidade de repensar os investimentos. “Se tivermos realmente que adiar o início do processo de implantação, nossos custos terão que ser repensados”, afirma Smakman, da Crusader.

Antiespeculação

Ainda sem data para ser votado no Congresso, o novo Código de Mineração, entre outras regras que define, inibe a ação dos especuladores, que requerem a área, esperam o terreno se valorizar, e depois negociam. As mudanças do novo marco regulatório foram detalhadas pelo ministro de Minas e Energia, Edson Lobão, em audiência pública, ainda em 2010. O novo marco, de acordo com Edison Lobão, foi resultado de uma ampla discussão no governo e recebeu contribuições de várias entidades representativas do setor mineral brasileiro. “Essas discussões foram sustentadas na larga experiência e vivência cotidiana dos agentes do setor em torno de questões fundamentais da mineração, além de estudos da legislação de vários países”, disse o ministro. O texto em vigor, editado em 1967 e modificado nos últimos anos, precisa ser atualizado, segundo o ministro.

Investidores apontam riscos aos negócios

João Leal, diretor-presidente da Casa Grande Mineração (CGM) – maior fábrica de beneficiamento de feldspato do país e com sede no RN- teme que a suspensão das concessões atrapalhe os negócios da empresa. A medida, segundo ele, pode colocar a perder negociações mantidas com grupos estrangeiros. A CGM, que explora e beneficia vários tipos de minérios industriais não metálicos, como por exemplo, argila, caulin, feldspato, quartzo, também quer explorar minério de ferro, mas ainda não obteve autorização.

Pio Sacchi, diretor-presidente da Mhag Mineração, que está em fase final de negociação com grupos financeiros para voltar a explorar minério de ferro no estado, também aguarda a concessão dos alvarás de pesquisa. Segundo Pio, que também busca parceiros fora do país, vários negócios já estão paralisados. “O governo está equivocado em fazer uma alteração dessa magnitude com uma enormidade de processos em andamento”, diz.

Para o empresário, os processos que estão em andamento deveriam ser analisados sob a égide da legislação vigente. “Empresas sérias que estão investindo em pesquisa serão imensamente prejudicadas. Elas já efetuaram grandes investimentos”, afirma. Só a Mhag, que deixou de explorar minério de ferro em 2007, diz ter investido R$ 100 milhões em pesquisa no RN nos últimos anos.

A Crusader, com 300 alvarás de pesquisa espalhados pelo país, admite que enfrentará problemas para explorar minério de ouro no Rio Grande do Norte, com a suspensão. O australiano Robert Smakman, diretor-presidente da empresa, conhece outros estrangeiros na mesma situação. “Conheço uma outra empresa australiana de mineração que entrou recentemente no Brasil. Eles tem vários pedidos de licença. Muitos deles para o Nordeste, sendo que nenhum foi ainda concedido. Esta demora significa prejuízo nas operações. Como consequência, eles deverão reconsiderar seu investimento no Brasil”. Nenhum dos investidores conseguiu mensurar o prejuízo ocasionado pela suspensão. O DNPM no Rio Grande do Norte também não possui nenhum levantamento neste sentido. “O que sabemos é que vai gerar um impacto na economia”, afirma Eliasibe Alves, do DNPM.

Tributos

Prestes a instalar a quinta maior mina de ouro do Brasil no Rio Grande do Norte, o australiano Robert Smakman, da Crusader, reclama dos altos tributos do setor, que podem ficar ainda mais altos se o novo texto for aprovado sem alteração. “O aumento de impostos obviamente faz do Brasil um destino menos atraente para investimentos, uma vez que a carga tributária já é bastante elevada, enquanto, em muitos casos, a infraestrutura existente é deficitária, desfavorecendo a logística dos negócios. Da mesma forma, a incerteza gerada no setor também é bastante prejudicial à atração de investimentos”.

O fato de não haver nenhuma previsão para as licenças voltarem a ser analisadas é muito ruim para o setor e para a imagem do Brasil, acredita o australiano, cujo empreendimento aumentará 62.000 vezes o volume de ouro extraído no estado, passando de 47,65 gramas, valor registrado pelo Departamento Nacional de Pesquisa Mineral em 2009, para 3 toneladas a partir de 2013. “Há muitos projetos em andamento que não podem simplesmente ficar parados esperando a votação do Código no Congresso. Colocar as áreas de exploração em um leilão, por exemplo, é outro fator que só aumenta as incertezas de investidores em relação ao Brasil. O setor mineral está em pleno crescimento e precisa de estabilidade para poder se desenvolver mas, o que temos agora é um cenário repleto de insegurança”, angustia-se Smakman.

Pio Sacchi, da Mhag Mineração, pensa parecido. “Esta suspensão prejudica o setor de mineração como um todo, os investidores internacionais já estão questionando como será esta nova legislação e diante das incertezas todos os negócios em andamento estão paralisados. O setor de metálicos, principalmente no caso do minério de ferro, que já é penalizado por uma inexistência de logística, agora irá novamente ser penalizado com um imposto mais elevado, sem que o governo faça a sua parte neste processo”.

O Novo Código de Mineração, ainda em votação…

Define prazo de 5 anos, prorrogável por até 3 anos uma única vez para pesquisa de minério, se comprovada necessidade. (O código atual define prazo de 3 anos, prorrogável indefinidamente, desde que se comprove a necessidade);

Define prazo de 35 anos para atividades de Lavra (extração de minério). O novo prazo poderá ser prorrogado. (O código atual não define prazo para atividade de lavra);

Cria o Instituto da Autorização de Lavra, destinado a extração de minérios independente da realização de pesquisa mineral prévia, revogando o atual Regime de Licenciamento, criado pela Lei nº 6.567, de 1978;

Mantém a exigência de pagamento, pelos titulares de direitos minerários, de taxa por ocupação, incluindo sua progressividade. O objetivo é incentivar os empreendedores e inibir a ação de especuladores improdutivos. (O código atual não prevê progressividade da taxa por ocupação);

Exige um investimento mínimo na área objeto da autorização de pesquisa mineral. Esse mecanismo visa inibir a especulação improdutiva com direitos minerários. (O código atual não exige investimento mínimo);

Cria Áreas Especiais de Mineração, para pesquisa mineral e lavra, em áreas que contenham minerais considerados estratégicos para o País e que deverão ser submetidas a regras licitatórias, com prazo determinado para a escolha do empreendedor e determina que a oferta pública de áreas seja feita a partir de Licitações Públicas e Contratos. (O código atual não prevê a oferta pública de áreas a partir de Licitações Públicas e Contratos. Ganha o direito de pesquisar e extrair minério quem requere a área primeiro);

Cancela o título minerário após a instauração do competente Processo Administrativo se detectado descumprimento de obrigação fundamental. As sanções foram alteradas para permitir a punição adequada do minerador que descumprir com suas obrigações. (O código atual não prevê a sanção).

Entrevista: Patrícia Molino – sócia da área de Consultoria em Pessoas e Mudanças da KPMG no Brasil

Em artigo recente, a senhora comenta que houve uma desaceleração nas contratações de pessoal no setor mineral. O ritmo de contratações estaria mais lento porque alguns projetos estão estagnados. Há números que mostrem essa desaceleração?
Não temos um levantamento, mas temos visto as grandes companhias de Mineração colocarem um freio nas contratações e aguardarem para ver como o mercado vai se comportar nos próximos meses. É uma situação muito diferente de um ano atrás quando havia um grande número de oportunidades de trabalho disponíveis, com ofertas de salários competitivos

Essa desaceleração é reflexo apenas de fatores internacionais ou tem algum ingrediente nacional?
Esses três fatores – Crise europeia, preço do minério e desaceleração no mercado chinês – são os principais condicionadores atuais do setor, já que a China é um mercado muito relevante, o preço da commodity impacta diretamente a receita e a rentabilidade da indústria, bem como o apetite e viabilidade de projetos e investimentos. Um grande empecilho “brasileiro” é a liberação das concessões ambientais, processo demorado e burocrático, além de outros menos específicos como a complexidade tributária, a falta de infraestrutura logística do país, a qualificação versus o custo da mão de obra e as obrigações trabalhistas.

Como a suspensão da publicação de alvarás e de portarias de lavra afeta o mercado de trabalho no setor?
Não temos como isolar as consequências deste fato e medir o impacto desta decisão isoladamente.

Segundo o artigo que a senhora escreveu sobre o mercado de trabalho da Mineração, os investimentos q’ue estão sendo anunciados deverão superar os que vinham sendo feitos antes da crise, “quando o susto passar”. Que fatores sinalizam essa retomada forte no investimento?
O Brasil vive um momento positivo e, entre os países que integram o bloco dos BRICS, é o que tem maior potencial de crescimento. Ele está na rota de investidores estrangeiros que querem uma fatia do mercado, o que inclui também a indústria de mineração. Os investimentos previstos para o segmento continuam. O que vivemos agora é um momento de stand by em que as grandes companhias de mineração estão trabalhando com bastante cautela.

E quando o susto vai passar? O setor demorará quanto tempo para retomar os empregos ‘represados’?
A retomada do crescimento dependerá da profundidade da crise europeia, do ritmo de crescimento da China e da equação demanda / preço dos minérios. Não sabemos quanto tempo a desaceleração vai durar. O preço do minério pode começar a subir de uma hora para outra. E assim que houver o primeiro sinal de recuperação, as empresas vão retomar o seu portfólio de projetos, o que vai voltar a demandar mão de obra para trabalhar na área.

Para o governo, momento é de insegurança

Para Fábio Rodamillans, coordenador de Desenvolvimento Mineral da Secretaria Estadual de Desenvolvimento Econômico, as mudanças propostas pela nova legislação mineral, que entre outras coisas limita o período de exploração do minério e aumenta os impostos, geram insegurança entre os investidores nacionais e estrangeiros. “Ninguém sabe ao certo o que vai acontecer”.

O problema, segundo Otacílio Carvalho, mestre em Geologia pela Universidade de Brasilia (UNB) e professor de Geologia do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do RN (IFRN), não é apenas o conteúdo, mas o tempo que o novo texto levará para ser aprovado. “O projeto está tramitando no Congresso. Não dá para prever quando vai ser aprovado. Não há um consenso sobre a nova legislação. Assim fica muito difícil saber quando isso vai terminar”. O impacto da suspensão das concessões e as mudanças no Código da Mineração, lembra Otacílio, serão discutidos durante uma mesa redonda na sede da Federação das Indústrias do RN (Fiern) no dia 19 de outubro.

O presidente em exercício do Sindicato da Indústria de Extração de Metais Básicos e Minerais Não Metálicos do RN, Mário Tavares,  defende que o Congresso não vote o novo texto antes de abrir uma ampla discussão com todos os interessados no assunto. O novo Código, segundo Tavares, que critica uma série de pontos, cria um monopólio ‘branco’ ao estabelecer que áreas com minerais considerados estratégicos sejam objeto de licitações públicas, limitando assim a disputa à grandes empresas.

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