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O delírio alternativo dos Fanzines

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Yuno Silva
Repórter

Colaborou: CinthiaLopes
Editora

Em meados dos anos 1980, quando Natal testemunhava os últimos momentos do desbunde setentista, artistas desta esquina continental se reuniam em bandos para aprontar e dar vazão à criatividade que jorrava da ponta de pinceis e canetas. Protagonistas de um período bem antes dos blogs e redes sociais da vida, e das famigeradas restrições de comportamento impostas pelo conceito encaretador do “politicamente correto”, aquela turma encontrou nos fanzines uma forma eficiente de disseminar ideias aos quatro ventos; um capítulo cultural da história recente da capital potiguar prestes a ser contado e recontado no livro “Delírio Urbano”.
Assim como muitos fanzines da época, Delírio Urbano durou pouco. Mas marcou época junto com outros “concorrentes” da mídia alternativa, como o Cebola Faz Chorar e Folha Poética. Acima, movimento Arte Door ocupava espaços em branco dos espaços publicitários
Título de uma publicação alternativa cujo conteúdo lançava foco na poesia, nas artes visuais e na híbrida poesia visual, o Delírio Urbano teve apenas três números e circulou na província entre 1985 e 86 capitaneado pelo designer gráfico Afonso Martins, pelos poetas João (da Rua) Batista de Moraes Neto e Carlos Astral, e os artistas visuais Novenil Barros e Jota Medeiros. À frente do projeto, que será editado pelo Sebo Vermelho e passa por revisão final antes de seguir para impressão, estão Afonso, João e Jota. O trio trabalha há mais de dois anos na formatação do livro e conta com colaboradores como o jornalista Sílvio Santiago, autor de um artigo que contextualiza toda a efervescência da época.

A capa do livro de 280 páginas (muitas em cores), ainda sem data definida para lançamento, será a arte criada por Jota Medeiros para o número 4 que acabou engavetado. “Chamamos (o Delírio Urbano) de jornal poético, por ter sido feito por poetas, que trazia textos literários, poesias e um lado visual muito forte. Foi meu debute como designer”, disse Afonso Martins. O livro terá formato A4, tamanho original do fanzine, e sai com tiragem de 500 cópias.

Ele adianta que a publicação trará, além do fac-símile das três edições lançadas, o conteúdo inédito do quarto número mais uma “espécie de memória gráfica” do período. “O Delírio Urbano surgiu com a intenção de aglutinar o pessoal que vinha dos anos 1960 e 70 com a turma mais jovem. Dava liga, tinha um ‘quê’ contracultural”, explicou. 

Afonso avisa que a obra não pretende sistematizar tudo o que aconteceu, mas fazer “um recorte do que aconteceu e estava mais próximo” do círculo onde transitavam. Martins lembra que o poeta Carlos Gurgel, a atriz e dramaturga Clotilde Tavares e o poeta-elétrico Carito Cavalcanti estão entre os colaboradores do fanzine – o primeiro número saiu com 8 páginas, o segundo com 12 e o terceiro com 16 páginas. “Quando fomos editar a quarta edição o grupo acabou se dissolvendo, cada um seguiu seu caminho, e esse material ficou guardado comigo. Agora nos reencontramos para remexer nessas memórias e deixar um registro definitivo daquela fase”, acrescentou Afonso.

Documento Histórico
Afonso Martins adianta que o texto escritor por Sílvio Santiago, como posfácio, busca costurar esse contexto cultural e cita ‘concorrentes’ desse cenário de mídia alternativa como a Folha Poética, editada por Aluízio Mathias; o Cebola Faz Chorar (dos jornalistas Issac Ribeiro, Carlos Magno Araújo e Robson Eduardo); Sol o que faltava, de Max Fonseca e “que tinha o bar Chernobil, na Praia dos Artistas como quartel-general”; a revista Criação, vinculada a poesia de vanguarda e editado por Dácio Galvão, Falves Silva e Venâncio Pinheiro.

A lista também inclui A Margem, da trica Falves, Anchieta Fernandes e Franklin Capistrano; o Sarau Cata Livros; as publicações esquerdistas de Osório Almeida como o Rangal; e o jornalzinho do Sebo Vermelho. “Tinha o pessoal do heavy metal que fazia publicações temáticas, os fanzines do (jornalista) Rodrigo Hammer,  que atualmente edita o ‘K, de Cinema’… abordamos tudo a partir da perspectiva do Delírio Urbano”, informou Martins, que acredita que a descontinuidade dos títulos têm relação direta com a falta de patrocínio.

É interessante considerar que, antes de mais nada, o livro já surge como documento histórico para a nova geração saber o que rolava na época em Natal – um cenário que inclui a realização do lendário Festival de Artes do Forte. “Guardei muita coisa daquele período, cartazes e outras publicações alternativas que também ajudaram a construir essa memória contracultural”.

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