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O legado de Paulo Freire

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Marcos Guerra – Advogado

Neste 2 de Abril celebramos os 50 anos das “40 horas de Angicos”, experiência pioneira utilizando o método de alfabetização criado por Paulo Freire.

Na última aula, com participação do Presidente Jango, todos os Governadores do Nordeste, Ministros, e o General Castelo Branco, o Sr. Antonio Ferreira, comerciante, com mais de 50 anos, quebrou o protocolo e falou em nome da turma.  Afirmou, dentre outras coisas: “Naquele tempo anterior veio o presidente Getúlio Vargas matar a fome do pessoal, a fome da  barriga, que é uma doença fácil de curar. Agora, na época atual, veio o nosso presidente João Goulart matar a precisão da cabeça, que o pessoal todo tem necessidade de aprender”.

Como honrar o legado de tão ilustre e comprometido educador?

As “40 horas de Angicos” foram realizadas em 1963 pela Secretaria da Educação do RN, no Governo Aluizio Alves, que tinha como meta alfabetizar 100.000 adultos.  Alí se fez a primeira aplicação em massa de um método inovador, que obteve resultados rápidos e a um custo accessível – menos de 40 dólares, ficando demonstrada a possibilidade de universalizar o direito à educação. Tudo a partir de palavras geradoras e situações com as quais o alfabetizando fazia uma leitura crítica do mundo, num processo chamado de “conscientização.

 Logo em seguida o Presidente Joao Goulart convidou Paulo Freire para dirigir uma ousada Campanha Nacional de Alfabetização, cuja meta era alfabetizar 6 milhões de brasileiros, numa época em que os analfabetos não podiam votar.

Tudo isto foi súbita e brutalmente reprimido pela ditadura, desde seu primeiro dia. 

Hoje no Brasil temos o acesso à educação básica. Mas nos últimos vinte anos o sistema escolar acentuou a produção de analfabetos funcionais, hoje mais de 35 milhões.  As estatísticas confirmam que diminuiu a taxa de analfabetismo (de 9,7% para 8,6% ) mas que aumentou de forma assustadora o numero de analfabetos.

O IBGE indica que existem mais de 13 milhões de analfabetos. O INAF indica que 27 % da população é analfabeta funcional. Uma surpresa, em 2012:  38 % dos estudantes universitários são analfabetos funcionais, ou seja “não conseguem realizar tarefas simples que envolvem a leitura de palavras e frases ainda que uma parcela destes consiga ler números familiares como preços e  números de telefone”.

O que aconteceu, desde os idos de Paulo Freire em Angicos? 

Venceu quem pretendia manter afastada dos benefícios da universalização da educação uma importante parcela de brasileiros. Afastados também de um emprego qualificado, e de alguns direitos constitucionais mais elementares. Vivem sem que se respeite sua dignidade.

Desde então,  grande parte das atividades que visam facilitar o acesso à alfabetização plena se tornaram mais complexas, mais caras, com duração mais longa.  Pretendendo acertar, tentam “fazer o ótimo”, sem conseguir fazer o bom, o bastante, o simples e eficaz.  Contribuem para a exclusão.

O Brasil não está sozinho neste déficit incompatível com a noção de direitos em pleno século XXI.  Falta-nos tomar consciência dos prejuízos para a economia, a cidadania, a própria democracia. Na Europa, um de cada cinco jovens demonstra competências insuficientes em leitura, matemáticas e ciências, ou seja, um milhão de jovens nesta situação, e 73 milhões de adultos. Por isto, durante 18 meses, especialistas de alto nível reuniram-se e apresentaram propostas concretas agora divulgadas.

Lá como aqui os marginalizados pela educação perdem quando tentam acessar empregos que exigem cada vez mais um nível mínimo de escolaridade.  Perdem sem poder exercer sua cidadania plena.

Honrar o legado de Paulo Freire implicaria conceber e implantar um inovador programa de EJA – Educação de Jovens e Adultos, que resolva em uma década a dívida brasileira com tão sagrado e elementar direito, o direito à educação. 

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