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Preso usou faca para render agente

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Andrey Ricardo – Jornal de Fato

Leandro Felipe Leocádio utilizou uma faca de mesa que pegou solta pela cozinha do Presídio Federal de Mossoró como arma para render uma agente penitenciária federal e provocar o primeiro grave incidente de todo o Sistema Penitenciário Federal (SPF) do Brasil. Depois de rendida, a agente foi obrigada entregar sua pistola e seu colete à prova de balas. O preso, que apresentaria problemas mentais, utilizou bem toda a estrutura de segurança das torres de vigilância ao seu favor.

Leandro Felipe Leocádio ainda não prestou depoimentoSegundo informações passadas à reportagem por um policial que acompanhou toda a negociação e pediu para não ser identificado, as precauções adotadas pelo preso reduziram as possibilidades de uma ação de intervenção, caso ele não resolvesse se entregar – um disparo por cima ou uma invasão pela escada. De acordo com o policial, Felipe mostrou perícia e dificultou o trabalho da polícia. “Ele pode até ser doido, mas de burro ele não tem nada. Ficou o tempo todo abaixado para evitar ser alvejado (por cima) e fez a agente como escudo (no caso da invasão por baixo)”, explica.

A ação do preso foi apontada como um surto de loucura pelas autoridades que participaram das negociações, mas ele teria tido o cuidado de pegar uma faca de mesa na cozinha do Presídio Federal e a levou consigo até uma das guaritas, onde estava a agente penitenciária feita refém. A negociação foi feita durante todo o tempo com os dois dentro da torre de vigilância, segundo apurou a reportagem. Por sorte, o preso não adquiriu poder de fogo ainda maior. É que ele não percebeu que havia um fuzil na parte externa da guarita. “Aí é que o problema seria maior”, opina.

Para intimidar todos que estavam envolvidos na negociação, o preso ainda chegou a efetuar dois disparos com a pistola da agente penitenciária, mas não atingiu ninguém. “Esse foi o momento de maior tensão, mas graças a Deus não atingiu ninguém. Ele atirou só para assustar mesmo, para mostrar que ainda estava no controle daquela situação”, explica o policial. Além da equipe de agentes federais de Natal, enviados para gerenciar a crise, participaram da operação agentes penitenciários estaduais e federais de Mossoró, policiais militares e ainda os agentes federais de Mossoró.

“Nós estávamos preparados para qualquer tipo de situação, mas ele soube bem usar o que tinha ao seu favor”, explica o policial, ressaltando que pela estrutura das torres de vigilância, a possibilidade de uma invasão pela escadaria foi praticamente descartada. “Não tinha como a gente entrar pelas escadas porque perderíamos o elemento surpresa e assim colocaríamos em risco a vida da agente”, explica o policial, ressaltando que o preso poderia sentir-se ameaçado e tentar matar sua refém. “O melhor caminho mesmo foi negociar e esperar que ele desistisse do seu plano”, finaliza.

A versão oficial

Cerca de uma hora após a libertação da refém, o diretor do Presídio Federal, Kércio Silva Pinto, resolveu atender a imprensa – que passou o dia inteiro do lado de fora da prisão, proibida de entrar – para esclarecer o incidente. Ele negou que o preso tivesse utilizado algum tipo de arma branca para render a gente. Segundo o diretor, o preso conseguiu imobilizar a agente – extremamente preparada – apenas com uso da força física. Na coletiva, o diretor evitou entrar em detalhes sobre o assunto para reduzir os danos.

Especialista diz que agente penitenciária não errou

O Sistema Penitenciário Federal (SFP) foi idealizado para custodiar os presos mais perigosos do Brasil, inclusive estrangeiros que venham a ser detidos no território nacional. Porém, ironicamente, o primeiro incidente registrado em todo o STF envolveu um preso que teoricamente não representava mais riscos. Ele iria progredir do regime semiaberto para o condicional nos próximos dias, o que significa dizer que estaria apto a voltar a conviver com a sociedade. Talvez por isso é que todos procedimentos que fazem o SPF ser de “segurança máxima” não tenham funcionado.

Na opinião do delegado federal Adriano Barbosa, que hoje ocupa o cargo de chefe da Divisão de Desenvolvimento Humano da Academia Nacional de Polícia Federal, sediado em Brasília (DF), não é correto atribuir o incidente de Mossoró à agente penitenciária que foi feita refém. Ele conta que acompanhou o caso à distância, em Brasília (DF) e que se arrisca a falar que agente não pode ser responsabilizada pelo ocorrido. “Não tenho condições de emitir um parecer técnico, mas pelo que pude ver, não houve erro da parte dela. Ela foi surpreendida e não há erro nisso”, diz.

O professor da academia da Polícia Federal explica que os cuidados adotados em cada situação variam de acordo com o risco que àquela determinada situação representa. No caso, Leandro Felipe Leocádio não era visto pelos agentes como um risco eminente. “Com um perfil dele, que já seria liberado, não tem nem como botar culpa na agente. Ele estava prestes a alcançar a liberdade, ninguém imaginaria que ele adotaria esse comportamento. Acho que se eu estivesse na situação dela, talvez tivesse passado pela mesma coisa”, comenta Adriano, que é referência da PF no Brasil.

“Eu tenho certeza que as condutas de segurança para aquele perfil foram executadas, mas ele se desviou disso e esse foi o elemento surpresa”, acrescenta Adriano Barbosa, que tem vasta experiência na área operacional e hoje é responsável Academia da PF, que forma delegados, escrivães, agentes, papiloscopistas, peritos e agentes penitenciários federais em todo o Brasil – ele foi delegado da divisão de Contra-Inteligência, chefiou o setor de Operação do Serviço Anti-terrorismo, chefe do Núcleo de Operações da Superintendência do DF, sempre atuando na área de gestão operacional.

Preso ainda não foi ouvido pela PF

O preso Leandro Felipe Leocádio até ontem à tarde ainda não havia prestado depoimento sobre o incidente que protagonizou no Presídio Federal de Mossoró. Até ontem ainda não havia uma definição acerca dos crimes que ele iria ser responsabilizado.

De acordo com o agente Paulo Nascimento, responsável pela assessoria de imprensa da Polícia Federal de Mossoró, até ontem ele ainda não havia prestado depoimento. Apenas os agentes penitenciários que estavam de serviço no plantão do incidente foram ouvidos.

A previsão inicial era de que Felipe prestaria depoimento e seria indiciado ainda na noite de terça-feira passada.

O inquérito que vai investigar a ação do preso será conduzido pela Polícia Federal de Mossoró, já que trata-se de um crime cometido dentro de uma instituição federal, contra um servidor público federal.

De acordo com Nascimento, o preso poderá ser indiciado pela tentativa de homicídio ou até mesmo por cárcere, já que reteve a liberdade da agente penitenciária mediante o uso da força física. “O delegado ainda vai decidir quais as providências que irá tomar”, complementou o policial.

A certeza que se tem é que o Felipe Leocádio deverá ser responsabilizado por um crime bem mais grave do que os outros dois os quais ele havia sido condenado – furto e roubo. Somadas, as penas dos dois crimes chegam a 10 anos.

Delegado não crê em rendição sem arma

A versão oficial da direção do Presídio Federal de Mossoró é de que o detento teria conseguido imobilizar a agente penitenciária federal sem o uso de nenhum tipo de arma. Entretanto, para o delegado federal Adriano Barbosa, chefe da Divisão de Desenvolvimento Humano da Academia Nacional de Polícia Federal, é praticamente impossível acreditar que um servidor tão bem preparado quanto um agente penitenciário federal tenha sido facilmente rendido.

“Em tese, não seria possível um policial federal (ou agente penitenciário federal) ser rendido por um civil. Ele é treinado para defesa pessoal. A gente tem uma disciplina de defesa pessoal que é voltada para essa área. Ele tem treinamento específico para isso”, comenta o professor da Academia da Polícia Federal.

Ele reconhece que o elemento surpresa, que na ocasião estava à favor do preso, pode ser uma vantagem, mas reafirma que é muito difícil que isso venha acontecer sem que ele tenha utilizado algum tipo de arma, como informou a direção da unidade federal.

“Eles são treinados para fazer o uso progressivo da força, mas é claro que existe o elemento surpresa, que aí qualquer um, por mais bem treinado que seja, pode ser surpreendido. Quando isso acontece, a gente perde a nossa vantagem. Pode acontecer, mas é muito difícil! Em tese, o policial é treinado para evitar isso”, complementa o delegado.

Responsável pela formação dos agentes penitenciários federais, o delegado faz questão de enaltecer o treinamento o qual eles são submetidos e rebate as críticas nesse aspecto.

“Eu arrisco a dizer que não tem instituição hoje mais bem treinada para penitenciárias do que o DEPEN (Departamento Penitenciário Nacional, que é responsável pelas prisões federais). Eles são mais bem recrutados. Não da para dizer que sejam mal-preparados. Se houve uma falha, foi uma coisa individual, pontual”, defende.

Em Brasília, a custódia dos presos que era feita pela Polícia Federal foi assumida pelo Departamento Penitenciário Nacional (DEPEN) desde quando o Sistema começou a funcionar em 2006. Segundo Adriano Barbosa, a segurança aumentou ainda mais. “O padrão de segurança é muito bom. Eu posso afirmar que quando o DEPEN assumiu a custódia dos presos no DF, nossa segurança mudou. O nível de treinamento que eles têm é muito bom. Eles são especializados nisso”, finaliza.

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