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Royalties: Recursos “extras” não garantem desenvolvimento

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Isaac Lira – Repórter

A divisão dos royalties do petróleo atraiu a atenção do país na última semana. Estados, municípios e a União discutiram, por vezes de forma calorosa, o destino da arrecadação com a atividade extrativa de petróleo. Cada parte procurava fundamentar de maneira incisiva o porquê de merecer uma fatia mais suculenta do disputado bolo dos royalties. Um ponto contudo passou em vários momentos ao largo do debate nacional: como são utilizados hoje os recursos dos royalties e qual o peso dessa arrecadação nos municípios e estados? No Rio Grande do Norte, os números e alguns especialistas mostram que esse dinheiro nem sempre é bem gasto. Há quem fale em uma “maldição dos royalties”. O fato é que o Estado não viu grandes modificações na realidade dos municípios potiguares “abençoadas” com a existência de petróleo em seus territórios. Nos últimos 10 anos, segundo dados do IBGE, índices de desenvolvimento social importantes não obtiveram avanços significativos.
Recursos não garantem desenvolvimento
Muito dinheiro, poucos avanços

Um levantamento realizado a partir de dados da Agência Nacional do Petróleo mostra que 15 dos principais municípios potiguares com produção de petróleo arrecadaram desde 1995 até 2012 R$ 1,3 bilhão com royalties de petróleo. Mesmo com o valor bilionário, a maioria dessas cidades permanecem com importantes índices sociais, como o nível de saneamento básico, menores que a média estadual. Para o professor Mário Jesiel, especialista no assunto, os municípios produtores do RN desperdiçam uma oportunidade de avançar na melhoria da qualidade de vida da população.

Açu, Alto do Rodrigues, Apodi, Areia Branca, Caraúbas, Carnaubais, Felipe Guerra, Gov. Dix-Sept Rosado, Guamaré, Macau, Mossoró, Pendencias, Porto do Mangue, Serra do Mel e Upanema. Esses 15 municípios têm como característica comum o repasse mensal de significativas somas por conta da exploração de petróleo e grande parte de suas receitas dependem desses repasses. Uma reportagem de 2008 nesta TRIBUNA DO NORTE já demonstrava a influência dos royalties nas receitas dos 15 municípios. O critério utilizado foi a participação dos recursos do petróleo na receita da cidade.

Ao confrontar no entanto os dados da ANP com os números do último Censo do IBGE, realizado em 2010, é possível observar uma contradição: mesmo possuindo o privilégio de receita garantida todos os meses, 13 das 15 têm níveis de analfabetismo acima da média estadual, enquanto 12 estão com porcentagens de saneamento básico inferiores à média do Estado.

Os avanços obtidos em alguns casos são tímidos. Nos últimos 10 anos, o município de Areia Branca – que conseguiu R$ 125 milhões com royalties desde 1995 – diminuiu o seu analfabetismo em cinco pontos percentuais. Já no caso de Macau, por outro lado, a porcentagem de saneamento pulou de 11% para 68%. É o município que teve o maior aumento. No que diz respeito ao analfabetismo, a melhor performance foi de Porto do Mangue, com uma diminuição de 16,6 pontos percentuais. Porto do Mangue foi uma das cidades menos beneficiada com os recursos do petróleo, dentre as 15 analisadas.

Para o professor Mário Jesiel, o recurso é claramente mal empregado. “No TCE tem sido comum processos por suspeita de irregularidades. Ao mesmo tempo, vemos prefeituras gastando milhões para contratar bandas no carnaval. A única voz moralizadora que apareceu nesse contexto recente foi do Governo Federal, quando declarou o intuito de investir recursos do pré-sal em educação”, analisa. E complementa: “O petróleo é um recurso finito e corremos o risco de ver cidades empobrecidas num futuro não muito distante. Não adianta essa briga pelos royalties se não discutirmos onde investir”.

Outro ponto que contribui com esse panorama, segundo o professor Jesiel, é a frouxidão da lei. Hoje, a legislação veda somente o gasto dos royalties com o quadro permanente de funcionários e com o pagamento de dívidas. Se terceirizar o serviço, o prefeito pode gastar até mesmo com o pagamento de salários de funcionários. “Seria interessante uma legislação mais rígida, que deixasse o cenário menos permissivo. A lei deveria direcionar as áreas onde o dinheiro deve ser gasto”, defende.

Destinação seria para infraestrutura

Royalties de petróleo são uma compensação devida pelas empresas ao Estado para ter o direito de explorar os campos terrestres ou marítimos. O princípio desta compensação é ambiental. Como a extração de petróleo é algo potencialmente poluidor, os municípios, estados e a União cobram um percentual para arcar com possíveis despesas de recuperação de áreas degradadas.
Outro ponto que fundamenta a cobrança é o fato de o petróleo ser uma riqueza finita. O RN, por exemplo, tem várias cidades produtoras do óleo, mas num futuro próximo pode ver suas reservas esgotadas. Com essa possibilidade passa a ser necessário o investimento em outras formas de geração de riqueza, sob o risco de cidades inteiras ficarem empobrecidas após o declínio natural da atividade. “O mais adequado é que se invista em educação,  infraestrutura, meio ambiente e no futuro econômico e social das cidades produtores”, aponta o professor Mário Jesiel, especialista no assunto.
Professor Mário Jesiel, especialista em royalties de petróleo
Em outros países, principalmente na Europa e nos Estados Unidos, os royalties são usados prioritariamente para investir em infraestrutura. “Estradas, acessos, pavimentação, tudo isso é o destino do dinheiro arrecadado com royalties”, aponta Jesiel. As áreas de educação e cultura são prioridade. “Existe a intenção de preservar a cultura do lugar, investindo com esses recursos. Cultura e também a educação”, complementa.

No Alasca, o dinheiro é investido no mercado de capitais. A ideia é resguardar o futuro das gerações, investindo esses recursos. Trata-se de uma perspectiva diversa da encontrada no Brasil atualmente. O Rio de Janeiro por exemplo usa parte do dinheiro para a previdência. No RN, pensa-se em consumir de forma imediata sem pensar no futuro”, encerra.

Receita do Estado vai aumentar

Com a derrubada dos vetos da presidente Dilma Rousseff, o Rio Grande do Norte poderá ter um incremento de de R$ 120 milhões este ano na arrecadação dos royalties e em 2014 de até R$ 230 milhões. A expectativa é da Secretaria Estadual de Tributação. O estado terá um incremento de 250% no valor a receber em 2013, estimado em R$ 380 milhões, se comparado com o valor distribuído em 2011, pela regra atual – R$ 109 milhões, segundo levantamento da Confederação Nacional dos Municípios.

Os royalties do petróleo representam cerca de 3% das receitas do Estado (ICMS/FPE/Royalties). A expectativa é que essa participação suba para 6%, o que, em valores nominais, corresponderia a 50% do montante arrecadado com ICMS do Estado, hoje projetado em R$ 400 milhões para 2013.

A votação no Congresso devolveu à lei dos royalties seu texto original, aprovado no Congresso. A lei altera os critérios para divisão dos royalties, o percentual do lucro obtido pelas petrolíferas pago ao Estado como compensação. As novas regras valem apenas para poços explorados no mar, imensa maioria no Brasil. Pelo texto aprovado, válido inclusive para campos já licitados, a União tem sua fatia nos royalties reduzida de 30% para 20%. Os Estados produtores terão redução de 26,25% para 20%. Os municípios produtores vão de 26,25% para 17% e chegam a 4% em 2020.

Os municípios afetados pela exploração de petróleo, mas que não são produtores – por exemplo, municípios vizinhos aos produtores ou aqueles em que há embarques de equipamento para uso com o petróleo – também sofrerão cortes: de 8,75% para 2%. Já a parte dos Estados e municípios não produtores, que era de 1,75% e 7%, respectivamente, passa, neste ano, a 21% para cada grupo, subindo a 27% em 2020.

Bate-papo – Benes Leocádio  » presidente da Federação dos Municípios do RN

Recursos são usados para “recuperação financeira”

Qual a importância dos royalties para os municípios potiguares?
Os royalties são fundamentais para realizar a recuperação das finanças municipais. Para o movimento municipalista e para mim, tem ficado evidente que os municípios têm sofrido uma grande injustiça há 20 anos, desde que a Constituição de 1988 foi instituída. Os chamados produtores, mas que não são produtores, vêm levando a maior parte dos recursos em prejuízo dos demais municípios. Quando o petróleo é no mar, o município não é produtor, mas confrontante. São coisas diferentes. E esse recurso, como o do pré-sal, deve ser distribuído de forma mais igual, como se dará com a derrubada dos vetos.
Benes Leocádio, presidente da Federação dos Municípios do RN
Que tipo de recuperação dos municípios?
A recuperação financeira das Prefeituras. Nos últimos anos, os municípios foram obrigados a lidar com aumento de pisos salariais, como os dos professores, com o aumento do salário mínimo. Enquanto os fundos de participação têm diminuído.

O senhor concorda que em muitos municípios os repasses não têm frutificado em grandes avanços sociais? Por quê?
É algo relacionado à gestão. O que nós dizemos é que é preciso haver o controle social. A sociedade precisa se organizar para dizer em quais áreas quer ver o dinheiro investido, as áreas prioritárias.

Mas o dinheiro vem sendo bem utilizado?
Há alguns casos. Em Guamaré, por exemplo, está sendo construída uma adutora. Mas muitas vezes os investimentos são de longo prazo e demoram para “aparecer”.

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