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Sampa em mais um movimento

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Dácio Galvão [ [email protected] ]

Tinha algo no cartaz na Central da 38ª Mostra Internacional de Cinema de São Paulo, no Conjunto Nacional. Trazia impressa uma fotografia do cineasta espanhol inquietando induzindo o olhar. Fosse pela caligrafia fosse… Fui me aproximando fixando mais e mais a retina. O algo se desfazia. Era a assinatura dele. De Pedro. Ele, no foco, teria quinze de seus filmes exibidos. Constava entre os quais “Mulheres a beira de Nervos”, de 1988. Exibição de Carlitos, de Charles Chaplin celebrando cem anos. Vários dos pré-indicados filmes ao Oscar. Jia Zhangke: Um homem de Fenyang de Walter Sales. Mostra fotográfica de Luís Buñuel. Os vencedores dos Festivais de Brasília e Gramado respectivamente “Branco sai, preto fica” de Ardiley Queiroz e “Sinfonia da Necróple“ de Juliana Rojas. Mais de trezentas exibições de filmes! Estava mesmo na expectativa de assistir “Luneta do Tempo” com direção roteiro e músicas de Alceu Valença. O amigo que havia marcado encontro se atrasaria. Perdi o horário do filme e terminamos numa mesa de café.

Perna direita meio travada locomoção comprometida me dirigi ao consultório médico. Asséptico e amplo. Móveis em linhas retas. Espantado, olhava a chamada decoração de interiores. Várias fotografias em preto e branco. Todas abstratas. Algumas acentuadamente verticais. Fazia remessa ao abstracionismo das “Pinturas Cegas”, de Tomie Otake, que havia visto no Museu de Arte do Rio de Janeiro – MAR. Alguns livros na mesa da sala de espera. Peguei um para folhear. Era do contemporâneo e experimental Man Ray das célebres fotos de Jean Cocteu, de Pablo Picasso e da enigmática “Lábios nos lábios”. Ray em 1917, foi co-fundador do movimento Dada de Nova Iorque e desenvolveu contatos em Paris, em 1921, onde morou, com vários ativistas de ações Surrealistas. Um desenho me chama a atenção. Procuro visualizá-lo mais de perto. E… Não acreditando, me deparo com um quadro modernista do arquiteto Flávio de Carvalho. Duas figuras femininas de pernas muito grossas não sensual traços vazados. Ambas de cabelos compridos. Uma quase de pé pernas semi-flexionadas e a outra em posicionamento quadrúpede. Carvalho foi que fez o projeto “experiência nº 3”: saia de nilon, uma camisa bufante, um chapéu e uma meia de modelo arrastão com sandálias de couro para uso em dias de temperaturas elevadas. Fez desfile em São Paulo com esse protótipo em outubro de 1956. Futurismo para moradia. O homem “selvagem com todos os seus desejos, toda sua curiosidade intacta e não reprimida como era pela conquista colonial. Em busca de uma civilização nua!”. Conexão antropófaga oswaldiana. Enfim surpreso com a ambiência.

 Logo em seguida sou convidado para adentrar noutro ambiente. Depois do diagnóstico clínico a opção é o internamento imediato. Atravesso a avenida e no dia seguinte o procedimento. Dr. Kalil: -Isso é dor precordial. Você não deve estar andando por aí! Dr. Lemos: – faremos cateterismo. Angustia angina tem derivação filológica comum deriva de “angst”. Indicação de implantação de stent. Susto tensão. Me senti como diria nosso maior compositor de frevo, saudoso Dozinho: “Eu não vou / Vão me levando…”

Durante o internamento, converso em visita com Gereba Barreto sobre projeto em andamento há pelo menos cinco anos que é o “Poemúsicas 2”. Ritmos variados e faixas entremeiadas por outras de sotaques experimentais de quase-música ou de não-música como quis John Cage. Hermeto Paschoal seria assim uma face tupiniquim e intuitiva do grande mestre autor de célebre peça “4’33”.  E aí entre pensando no capítulo onde Gilberto Freyre faz narrativas de ganhos e contributos históricos portugueses e claro pelos momentos ali vivenciados, canetei:“quantas espumas/quantas caravelas/ quantas jangadas navegar / meu coração / descalibrado / não mais está vida a aguentar / amoroso choro incontido / quantas lágrimas do mar / onde a quilha / onde o leme / a proa e o remar?”

Enviei, via whatsapp, ao parceiro Barreto que já engatilhou para Zeca Baleiro, que assim nos respondeu: “Oi, Gereba e Dácio. Linda a música. Parabéns! Já estão salvos os arquivos. Esta semana gravo. Zeca”. E aí já entrou Milton de Mori (cavaco e bandolim), Toninho Ferragutti (acordeon)… Está assim.

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