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Serviço público é berço da corrupção

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Marco Carvalho
Repórter

Recebimento de propina, apropriação de bem público, funcionários fantasmas. Fraudes em licitações, desvio de recursos e superfaturamento. Negligência e facilitação. Corrupção. Essa é apenas parte da lista de muitas investigações conduzidas pelas autoridades da segurança pública e instituições independentes, como o Ministério Público. O alvo: servidores públicos impulsionados e arquitetados por  empresários, advogados e políticos que teriam colaborado para tornar os crimes realidade.  O MP, as polícias Civil, Militar e Federal, além do órgãos controladores do Estado têm se mantido atentos a práticas delituosas. Reflexo disso é a quantidade de operações e inquéritos conduzidos visando escancarar os delitos praticados.
Maria do Livramento Miranda Clementino, cientista social e pesquisadora da UFRN
Operações Sinal Fechado, Pecado Capital, Mensalão da Vila, QI, Judas, Hefesto foram deflagradas recentemente. Ainda existem outros casos mais antigos, mas que permanecem em processo de julgamento: como Hígia e Via Ápia. Em todos esses casos, são investigadas más práticas de funcionários públicos. Eles teriam orquestrado ou facilitado, de alguma forma, diversos tipos de crimes. Há investigações correndo no Tribunal de Justiça do Estado, no Departamento de Trânsito do Estado, na Secretaria de Saúde e no próprio Governo do Estado do Rio Grande do Norte.

Chefes de departamento, diretores-presidentes, procurador jurídico e outros servidores teriam trocados os cargos de confiança, ou as carreiras estáveis, que possuíam no Estado em nome de benefícios, nem sempre regulares. Alguns foram pegos, outros certamente permanecem impunes e na atribuição normalizada das suas funções. Um detalhe comum a todos é o fato de serem de classe média e média alta e terem um elevado grau de instrução. 

Apesar das investigações em andamento, o procurador-geral de Justiça, Manoel Onofre Neto, critica o controle interno. Esses órgãos, destacou o procurador em entrevista publicada no dia 29 de janeiro na TRIBUNA DO NORTE, trabalham de “forma superficial e alegoricamente, sempre com a conivência do gestor, que não empresta a atenção devida”. Outro problema que Onofre Neto vê é a divulgação muito tímida das prestações de contas. Em 76 municípios do Estado os portais da transparência ainda não foram criados.

O procurador-geral de Justiça considera a autonomia, o fortalecimento, a valorização e a estruturação das unidades de controle interno nos órgãos como providências importantíssimas a serem observadas pelos gestores, sobretudo pela função preventiva e corretiva que elas desempenham. “Muitas vezes, o gestor encara tais unidades como emperradoras dos processos internos, o que é um grande erro”.

No final de janeiro, o juiz da 4ª Vara Criminal de Natal, Raimundo Carlyle de Oliveira parece ter dado uma resposta à altura contra a impunidade tão mal vista na sociedade. Na oportunidade, dezesseis pessoas foram condenadas após terem se corrompido em favor de empresas para alterar o Plano Diretor da cidade. Os envolvidos, dentre eles vereadores e servidores da Câmara Municipal, recorreram da condenação.

‘Corrupção é uma atividade coletiva’

“Quando você burla as leis, certamente não o faz sozinho. A administração pública possui preceitos e é aí que percebemos que o ato corrupto não é de responsabilidade de uma única pessoa”. A análise é de Maria do Livramento Miranda Clementino, cientista social, economista e chefe do Departamento de Gestão de Políticas Públicas da Universidade Federal do Rio Grande do Norte. Para a especialista, ética e transparência podem auxiliar nas reduções de casos de corrupção investigados recentemente no Rio Grande do Norte. “Ética e transparência caminham juntos. Se não tem transparência, não tem ética. Na missão do gestor público há essa obrigação”. A responsável pelo graduação de Gestão de Políticas Públicas da UFRN vai além. Cobra da população uma fiscalização mais ativa e diz que a sociedade acaba por delegar tal responsabilidade a outras instituições. “O Ministério Público é uma instituição que tem credibilidade com a população. Mas nós não podemos nos omitir do mesmo exercício de fiscalização. É o que está faltando”. Os recorrentes casos de apuração sobre indícios de corrupção na administração pública ocorre em decorrência de uma maior rigor na investigação. A interpretação da professora Maria do Livramento é detalhada na entrevista que concedeu à TRIBUNA DO NORTE. Confira:

Diversas investigações foram iniciadas durante esse ano e o ano passado em virtude de suspeitas de corrupção na administração pública. A quantidade de inquérito e ações conduzidas pela Polícia Civil, Polícia Militar, Polícia Civil, Ministério Público Estadual e Federal saltaram aos olhos. Estão “roubando” mais ou a investigação está mais rigorosa?

A minha opinião é que se está investigando mais. Isso é o resultado de processos de avanço no sistema democrático brasileiro. A constituição de 1988 completou 20 anos e os instrumentos democráticos permitidos por ela já estão em prática. Com a Constituição de 88 houve uma descentralização das políticas públicas. Na oportunidade, Houveh uma falsa impressão de que tal descentralização teria facilitado a corrupção de recursos públicos.  Os gestores públicos tem que se pautar nos princípios básicos da ética e transparência. Com isso e os controles sociais do Estado, sendo operados a contento, a corrupção se reduz.

Como os administradores encaram a responsabilidade de serem éticos e transparentes nas atividades que praticam?

Existem aqueles controles que são operados pelo próprio Estado, com instrumentos fortes regidos por lei para realizar o controle do gasto público. A Lei de Responsabilidade Fiscal, o Portal da Transparência são instrumentos que permitem dar visibilidade ao tratamento da coisa pública.

Onde é preciso melhorar?

O que a gente precisa melhorar são os controles exercidos pela população, os chamados controle social. Isso precisa avançar. A sociedade acaba delegando essa responsabilidade a outras instituições de credibilidade, como o Ministério Público. É preciso que a sociedade se organize e que os conselhos gestores funcionem efetivamente.

Como a senhora avalia o nível de transparência do serviço público no Rio Grande do Norte?

A ética e transparência caminham juntos. Se não tem transparência, não há ética. Na missão do gestor público há essa obrigação. No momento em que não dou a visibilidade necessária aos atos administrativos, estou retendo informações importantes para que o controle por parte da sociedade possa acontecer.

Algumas das investigações que estão sendo conduzidas diz respeito ao trato com a Lei de Licitações – como exemplo a operação Sinal Fechado. Licitação é um tema que demanda atenção especial quando crimes de corrupção são apurados?

Uma questão fundamental de se analisar é a manipulação dos processos licitatórios. A ausência de licitação deve ocorrer sempre em situações extremas, como calamidades públicas. É necessário o aprimoramento da legislação. O controle tem que ser coercitivo. A transparência é importantíssima.

Os esquemas expostos pela polícia judiciária e pelos ministério públicos apontaram a formação de quadrilhas para a suposta concretização dos desvios de recursos. É possível ser corrupto sozinho dentro da administração pública?

Quando você burla, o que supostamente está acontecendo em alguns casos, a corrupção não acontece com uma única pessoa. Isso por causa do princípio que rege a administração pública, a solidariedade. O ato está embasado em quem decide, quem quem faz e quem paga. A decisão coletiva é importante para a garantia do cumprimento correto dos deveres.

A senhora está à frente do Departamento de Gestão de Políticas Públicas. Como o curso criado recentemente debate essas temáticas?

Gerir que dizer  fazer, implementar. Nossos alunos são aqueles que, em algum nível da hierarquia pública, tomarão decisões. O curso está pautado nesse princípio que eu falei: ética, transparência e participação. É um curso teórico-prático. Aqui eles treinam em “laboratórios” as implementações das políticas públicas no Brasil devem postar em prática.

Operação Sinal Fechado

(Ministério Público Estadual)

O quê?

Investiga dois casos de fraudes em licitações públicas ligadas ao Departamento Estadual de Trânsito (Detran). A operação chamou atenção pelas autoridades que nela acabaram envolvidas. O suplente de senador João Faustino chegou a ser preso. Os ex-governadores Vilma Maria de Faria e Iberê Ferreira de Souza tiveram o nome diretamente ligados. Empresários, advogados e ex-gestores de repartições públicas ficaram detidos e tiveram que prestar esclarecimentos aos promotores de Justiça.

Quem?

O líder do esquema seria o advogado George Anderson Olímpio da Silveira. Atuava junto a diretores do Detran, como o ex-diretor da autarquia Carlos Theodorico Bezerra e o procurador jurídico Marcus Vinícius Furtado da Cunha. Pessoas eram subornadas com propinas para supostamente facilitar a autação do grupo dentro do Detran. No total, além dos já citados, foram denunciados pelo MP à Justiça 31 pessoas. Empresários e outros advogados compõem a lista.

Como?

São investigadas duas fraudes distintas no Detran. A primeira seria irregularidade no registro de contrato de financiamento de carros junto a cartórios. Apesar de já proibida, a atividade continuava ocorrendo e rendeu milhões a suposta quadrilha. Também foi alvo de uma tentativa de fraude a licitação para a contratação do Consórcio Inspar, que realizaria a inspeção veicular no RN.

Em que ponto está o caso?

O Ministério Público já ofereceu denúncia à 6ª Vara Criminal do RN. A juíza Emanuella Cristina Pereira Fernandes aguarda o remetimento da defesa prévia, a qual tem direito alguns dos denunciados. A investigação do MP pode ser recusada, aceita integralmente ou em parte. A partir daí, tem início os trâmites jurídicos para a realização do julgamento. O advogado George Anderson Olímpio da Silveira e o empresário  Édson Cézar Cavalcante permanecem presos.

Operação Pecado Capital

(Ministérios Públicos Federal e Estadual)

O quê?

O caso apura irregularidades e desvios no Ipem/RN no período de 2007 a 2010.

Quem?

Foram presos Rychardson de Macedo,  Rhandson Rosário de Macedo Bernardo, Adriano Flávio Cardoso Nogueira, Aécio Aluízio Fernandes de Faria, Daniel Vale Bezerra

Como?

O IPEM contratava pessoas que nunca iam trabalhar. O salário era dividido entre o funcionário fantasma e o esquema. As contratações eram realizadas através da empresa FF Construções e Serviços ME, no valor de R$ 1,4 mil. Desse montante, R$ 1,1 mil ficava com o esquema e R$ 300 com o funcionário fantasma. Nesse bolo, foram contratados “amigos, namoradas, ex-namoradas, parentes de amigos e apadrinhados políticos” de Rychardson de Macedo Bernardo

Em que ponto está o caso?

Rychardson foi liberado durante o mês de janeiro do alojamento em que era mantido na sede do Comando-geral da Polícia Militar. A Operação  entrará em nova fase a partir do dia 13 de fevereiro juiz federal Janilson Bezerra Siqueira, que substitui Walter Nunes da Silva Júnior, definiu a data como início dos depoimentos dos réus e de testemunhas

Operação Judas

(Polícia Civil e Ministério Público Estadual)

O quê?

São investigados  suspeitos de desvios na divisão de precatórios do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte. Foram presas durante essa semana. Além da prisão, foi decretado a quebra dos sigilos fiscal, bancário e telefônico dos seis suspeitos e o seqüestro dos bens, incluindo as contas bancárias, casa em Natal e na praia de Baía Formosa, carros de luxo, entre outros.

Quem?

Foram presas cinco pessoas, entre elas Carla Ubarana, ex-chefe do setor de precatórios do TJ, e seu marido, George Leal. Além disso, a operação, que contou com sete equipes compostos por promotores, delegados e agentes, realizou busca e apreensão em sete locais. Também foram detidos Carlos Eduardo Palhares, Cláudia Suely Silva e Pedro Luís Neto .

Como?

Suspeita-se que guias de pagamento eram duplicadas e valores milionários eram depositados na conta de laranjas.

Em que ponto está o caso?

A investigação permanece ocorrendo por membros do Ministério Público e Polícia Civil. Agora ocorre a análise dos documentos.

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