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Sintonia de veteranos

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Tádzio França – repórter

Três décadas selam a relação de amizade e parceria musical entre Pedro Mendes e Sueldo Soaress. Em julho de 1982, os dois cantores e compositores dividiram o mesmo palco pela primeira vez no Teatro Alberto Maranhão, combinando vozes e talentos no show “Tinta viva”. Trinta anos depois, os músicos sentiram que era o momento de reviver aquele encontro que marcou oficialmente a entrada deles na tortuosa estrada da música feita em Natal. Há um mês a dupla resolveu registrar suas apresentações em conjunto, devidamente acompanhados de uma banda afiada, visando reunir um material  que será lançado em disco e show  até o fim do ano. Histórias para contar e cantar não faltam.
Em julho de 1982, os dois cantores e compositores dividiram o mesmo palco pela primeira vez no TAM.  Neste sábado, voltam a se reunir para primeiras gravações do DVD
NOVO SHOW

“Já nos apresentamos em formato voz e violão, mas com uma banda completa ainda não. Podemos aprontar mais”, diz Sueldo Soaress, no estúdio em Mirassol onde está ensaiando com Pedrinho e demais músicos. A primeira apresentação a ser gravada será neste sábado, às 22h, no espaço Crepe 1, na entrada de Pium. A banda é formada por Ismael Miranda (contrabaixo), Darlan Marley (bateria) e Ricardo Baia (guitarra). “Os shows vão misturar nosso material autoral mais representativo, com as versões de músicas de outros artistas que gostamos de tocar. Será um grande flashback”, completa. A ideia é conciliar os períodos que Sueldo estará em Natal – ele trabalha embarcado, por uma empresa de petróleo – para a gravação de shows locais. O próximo será em agosto.

“Queremos que essas apresentações se tornem um disco. E quem sabe no show, em dezembro, ele se torne um DVD. Já estamos aceitando patrocinadores!”, brinca Pedro Mendes. Os músicos contam que o retorno dessa parceria aconteceu graças a um show acústico que Sueldo realizou em junho passado, no Bardallos, Cidade Alta. A sugestão de convidar Pedrinho foi logo aceita. A sintonia entre os velhos amigos foi tão fina, que a ideia de reviver o encontro de trinta anos atrás surgiu naturalmente.

OS GRANDES SUCESSOS

Montar o repertório para essa série de shows foi o retorno no tempo perfeito. Sueldo lembra de sua “Tulipa negra”, canção que ele compôs na metade dos anos 80, e que chegou às rádios em 1992, quando foi lançada no disco do mesmo nome. “A música já era um hit nos meus shows, mas quando entrou no rádio foi redescoberta e caiu no gosto de muito mais gente. Naquela época era super difícil um artista local tocar na FM”, diz. Pedro Mendes complementa: “Outro lance é que a letra era exótica, meio poesia marginal. Muito legal que tenha virado um sucesso”.

Quando o assunto é o repertório de Pedrinho, não há como fugir dela, “Linda baby”. “Eu compus essa música aos 18 anos, em 1981. Gravei em 86 no disco ‘Esquina do continente’ e foi aquele estouro. É uma música que me persegue. Às vezes esqueço de tocá-la de propósito nos shows, só para o povo me lembrar no final. Já fizeram versão em reggae, frevo, forró, balada romântica…sem falar das paródias para comerciais. Até o ABC já usou, mas devem ter tirado quando descobriram que sou americano”, diverte-se.

Pedro Mendes sabe que “Linda baby” se tornou quase um hino alternativo da cidade, e que a canção aparece em material escolar, livros e comerciais diversos – na maioria das vezes, sem sua autorização. “Acontece é que, das 50 vezes que minha música aparece em algo, só cinco são autorizadas e pagos os meus direitos autorais. A música aparece em todos os vídeos de turismo, mas nunca sou convidado para eventos turísticos. Já vi a música em agendas escolares e livros de geografia. Mas ninguém me comunicou”, diz.

O caso mais engraçado com “Linda baby”, segundo Pedrinho, foi quando um condomínio evangélico pediu que ele mudasse a letra para uma propaganda. “Eles disseram que não acreditavam nessa história de ‘terra de um deus mar’, pois só existe um Deus”, brinca. Sueldo lembra de quando uma música composta por ele e Pedro – chamada “Raça” – foi premiada no II Festival de Música e Poesia da UFRN, em 1985. “O prêmio era uma viagem a Salvador. Mas estamos esperando por ele até hoje”, brinca. “Essa parceria já tem 27 anos! Tá na hora de fazer outra, hein!”, complementa Mendes.

MIGRAÇÕES E DIFICULDADES

O cenário musical em Natal, inconstante, exige que os músicos normalmente busquem outros espaços ou ocupações. O caso é antigo. “Quando a gente começou, nos anos 80, a geração anterior, como Liz Noga e Nazareno Vieira, já falavam isso. É reclamação velha”, diz Sueldo. Ele mesmo passou 12 anos fora de Natal, a partir de 1995, no Rio de Janeiro. “Natal é uma cidade cruel com a classe artística. Hoje em dia há essa falsa ideia de facilidade, com editais, leis de incentivo e tudo mais. O projeto é aprovado, mas quando corremos atrás dos patrocinadores, é outra loucura”, afirma. Quando Sueldo voltou, em 2006, pôs o terceiro ‘esse’ no sobrenome, sugestão de uma amiga numeróloga para dar sorte.

Pedrinho passou uma curta temporada entre Brasília e Pirinópolis no ano passado, de agosto a outubro. “Pensei até em morar por lá, mas tinha tanta coisa a realizar por aqui, que resolvi ficar. Natal é madrasta com os artistas. Às vezes tenho vontade de fazer o reverso de ‘Linda baby’, sem os elogios à cidade”, diz. Segundo Mendes, estar em outros lugares faz com que o artista sinta o respaldo que não encontra em sua terra. “Em Brasília ou em Milão, onde já estive, a plateia pira no que a gente faz. As pessoas dizem ‘Em Natal tem isso? Não sabia!’ Ou seja, um talento que já tem aqui e a própria terra não investe”, explica.

Sueldo afirma que a solução para o cenário artístico é mais simples do que parece. “Muito mais inteligente e até barato valorizar os nossos talentos. Mas aqui se insiste nessa coisa travada, raquítica. Não existe o reconhecimento do poder público. Eu não duvido que na Copa chamem alguém de fora, tipo o Michel Teló, para fazer um show de abertura”, lamenta. “Acho que em Mossoró já existe uma consciência pública, um bairrismo saudável. Natal ainda não conta com isso”, completa.

As histórias de Sueldo e Pedro podem ser estendidas a todos os outros de sua geração – e mesmo das novas gerações. “A gente sempre mantém contato com colegas como Cleudo, Babal, Galvão, Manassés, Romildo, Valéria…Só não encontramos mais o mesmo público daquela época”, diz Pedro. Segundo Sueldo, não é apenas pelo fato da idade ou de muita gente já ter filhos, netos, e outras ocupações. É falta de onde ir. “O povo da nossa época não sai pra festa de suingueira, sertanejo universitário, forró cearense e as baladas de hoje. Há falta de opções legais mesmo”, ressalta. Alguém discute?

Serviço: Sueldo Soaress, Pedro Mendes e banda. Sábado, às 22h, no Crepe 1, Pium. Entrada: R$10. Tel.: 9922-8188/9151-7783.

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