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Tinha dois pombos no meio do caminho

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Nivaldete Ferreira
Nivaldete Ferreira ([email protected])

Vou partilhar com vocês essa experiência por certo insignificante diante de tanta coisa barulhenta, faiscante e ‘grandiosa’ neste mundo.

Saindo de um supermercado, eis que dois pombos aparecem à frente do carro, caminhando calmamente naquele andar que me lembrou andar de top model: um pé sempre à frente do outro (como as galinhas fazem também)… Parei, claro, e dei uma buzinada de leve. E nada de os dois saírem da frente! Continuaram a andar, cabecinhas erguidas, olhando para um lado e para outro, menos para trás… Caminhavam gentilmente, não como nós, mortais consumidores, que olhamos o relógio, procuramos a pestinha do ticket do estacionamento, falamos apressadamente com algum conhecido… Então fiquei esperando… A essa altura havia uma pequena plateia: três funcionários do supermercado estavam assistindo ao menor espetáculo do mundo e sorrindo. A moça gritou: arranque que eles voam!…  Arrancar?… Não, jamais eu faria isso. Não queria que eles voassem. Estavam me fazendo uma companhia tão inesperada quanto leve, de todas as maneiras. Pelo tamanho deles e pelo que me passavam, pelo desligamento suave que operavam na minha máquina de levar choques do mundo -uns ótimos; outros, terríveis. Decididamente, aquelas duas criaturas não estavam ali à toa.  Acho que vieram para espantar o excesso de mundo que se alojou em mim durante todo o ano. Pareciam me guiar para outro caminho, o da leveza, da liberdade, da alegria, para o caminho do “não se importe tanto com as coisas. Não leve ninguém a sério demais, nem a você mesma. Desça daí e vá tomar uma água de coco. E não se esqueça de brincar com as crianças”.

Sim, pareceu ser este o recado… Eles mesmos estavam brincando comigo, brincando de pedestres que pareciam dizer: vamos à frente dessa sua estranha lata com rodinhas até quando quisermos, e não temos medo porque, em caso de perigo, podemos voar, coisa que vocês sem asa não podem, e estão sempre aflitos dentro dessas engenhocas, conferindo semáforos e com medo de assalto…

Enfim, avistei os dois mudando de direção, mas em vez de alívio tive a sensação de estar sendo abandonada por eles. Ó pombos… Quando nos encontraremos de novo?… Improvável. Não serei capaz de reconhecê-los… E se isto que digo soar ridículo, respondo: ridículo é não ter pombos como mestres. Só a mídia.

E licença, Drummond:

Tinha dois pombos no meio do caminho.

“Nunca me esquecerei desse acontecimento na vida de minhas retinas tão fatigadas”…

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