terça-feira, 19 de março, 2024
27.1 C
Natal
terça-feira, 19 de março, 2024

Um ano bom para Cascudo

- Publicidade -

Yuno Silva – repórter

“Existe muito Cascudo ainda para ser descoberto”, disse o historiador Durval Muniz, autor de pesquisa que já dura uma década e que culminará com a publicação da biografia intelectual e multifacetada de Luís da Câmara Cascudo em 2013 – ainda sem nome, a redação da obra será trabalhada durante todo o próximo ano. A afirmação de Muniz tem razão de ser: há tempos não se via um movimento tão intenso em torno de Câmara Cascudo (1898-1986), nome constante que batiza praça, rua, avenida, escola, museu, biblioteca, memorial e lei de incentivo. E hoje, véspera do dia em que se comemora o nascimento do maior intelectual potiguar do século 20, é momento oportuno para passar a limpo o que tanto aconteceu e ainda está por vir.
Administrado pela família, o Instituto Ludovicus está inscrito em seis projetos no Prêmio BNB Cultura, nas áreas de literatura, audiovisual e patrimônio, e em editais do Ministério da Cultura.
Para marcar a passagem da data, o Luduvicus – Instituto Câmara Cascudo abriga, às 10h desta sexta-feira, lançamento da Revista do TCE, que nesta 13º edição presta homenagem a Cascudo. A publicação é toda ilustrada por imagens da casa onde viveu o professor, historiador, antropólogo, advogado, jornalista e pesquisador (que preferia não ser chamado de folclorista) localizada na Av. Câmara Cascudo (antiga Junqueira Ayres), 377, Cidade Alta.

Além do fato de seu falecimento ter completado 25 anos no mês de julho, ocasião devidamente registrada através de um mini-documentário produzido pela TNOnline e reverenciada pela Câmara Municipal, Assembleia Legislativa e Senado Federal.

Um dos acontecimentos mais importantes de 2011 para o legado cascudiano, junto com a digitalização de suas correspondências, foi Prêmio Jabuti na categoria Teoria/Crítica Literária para a obra “Câmara Cascudo e Mário de Andrade – Cartas, 1924-1944” (Global Editora) anunciado em outubro. Com organização e notas do professor e pesquisador do Instituto de Estudos Brasileiros/USP Marcos Antônio de Moraes, o livro amplifica o conteúdo histórico e cultural que permeou a troca de correspondência entre duas figuras fundamentais para a construção da identidade brasileira.

ENTREVISTA/MARCOS ANTÔNIO DE MORAES, escritor

O professor Marcos de Moraes participou, entre 1989 e 1995 no IEB-USP, do projeto de organização da correspondência até então lacrada do antropólogo e escritor Mário de Andrade. Desenvolveu Mestrado e Doutorado sobre a herança epistolar do criador de Macunaíma; e atualmente está envolvido no projeto “Correspondência reunida de Mário de Andrade”. Ganhador de outros dois prêmios Jabuti, em 1995 pelo livro “Carta ao pintor moço”, onde traz à tona correspondência de Mário de Andrade endereçada em 1940 ao pintor italiano Enrico Bianco (radicado no Brasil desde 1937) em que afirma que “toda arte é combativa”; e em 2001 com “Correspondência Mário de Andrade & Manuel Bandeira”, Moraes conversou com o VIVER:

Quando topou com as cartas trocadas por Mário de Andrade e Câmara Cascudo?

Trabalho com a correspondência de Mário de Andrade há cerca de 20 anos, e já publiquei cartas dele com Manuel Bandeira e com (o escritor mineiro) Murilo Rubião. Diante disso, tenho alguma noção de como funcionava as relações entre esses intelectuais, e posso afirmar que as cartas de Cascudo representavam uma das trocas mais ricas dentro do acervo. Eles estavam afinados, tinham uma visão crítica clara sobre o momento nacionalista que o país passava. Um período substancial para a construção da identidade nacional. A partir dessa percepção e do convite que recebi da família de Câmara Cascudo iniciei minha pesquisa.

Que percepção foi essa?

O que torna uma troca de correspondência rica, fecunda, é a troca de conhecimento: uma via de mão dupla entre dois intelectuais de grande envergadura. Considero que “Macunaíma”, obra-prima de Mário de Andrade, tem muito de Cascudo, que passou dicas e informações sobre o Nordeste, sobre o folclore. Há uma partilha, um compartilhamento de saberes. O um dizia interferia no trabalho do outro, e o período que MA passa na casa de CC, no início da década de trinta aprofunda ainda mais essa amizade. Eles estavam comprometidos com algo maior, justamente a identidade nacional.

O historiador potiguar Marcos Silva, que leciona na USP, também pesquisador da obra cascudiana, afirma que a troca de correspondência é uma espécie de obra inacabada, que o pesquisador passa a ser coautor…

É verdade, além dos pesquisadores que completam fazendo notas, o leitor também é um elo que colabora com essa continuação. Quando vamos ler uma correspondência temos que ambientar esse diálogo. Há coisas, inclusive, que descobrimos mais tarde através de referências, cartas que ficam perdidas e depois são introduzidas; e um leitor extemporâneo tem que ter algum conhecimento prévio para compreender o contexto.

CASCUDO E MONTEIRO LOBATO

Ainda sobre o legado epistolar, na Unicamp (Campinas, SP) a professora Marisa Lajolo coordena pesquisa sobre a troca de cartas entre o potiguar e o escritor paulista Monteiro Lobato.

CARTAS DISPONÍVEIS EM 2012

Em maio o trabalho de digitalização das mais de 15 mil cartas guardadas no acervo do Ludovicus, instituição privada que guarda o acervo de Cascudo e se mantém com os direitos autorais de sua vasta obra (233 publicações entre livros e opúsculos), estava em estágio avançado de catalogação. A meta é disponibilizar, após indexação, esse material para consulta: “Estamos na fase de tratamento das imagens, antes da indexação final, e acredito que no primeiro semestre de 2012 poderemos ter esse acervo disponível para consulta– inclusive parte dele através da internet”, disse Daliana Cascudo, neta de Cascudo e diretora administrativa do instituto.

Para o historiador Durval Muniz, a digitalização  foi o acontecimento mais importante do ano com relação a Cascudo.

DICIONÁRIO: EDIÇÃO ORIGINAL 

Nos planos para 2012 também figuram a reedição do “Dicionário do Folclore Brasileiro”, tal qual foi publicado originalmente em 1952, após ter sido publicado com alterações que geraram polêmica entre os estudiosos. Também um livro com coletânea de crônicas; e o relançamento de “Uma história da Assembleia Legislativa”, com apoio da própria AL.

RETROSPECTIVA

Em agosto, mês do folclore, a ministra Ana de Hollanda esteve no Instituto para conhecer o espaço cultural e conferir a assinatura deixada por seu pai, Sérgio Buarque de Hollanda, na parede da sala do sobrado – também assinada por personalidades como Juscelino Kubitschek, Monteiro Lobato, Mário de Andrade, Assis Chateaubriand, Carlos Drummond de Andrade, Dorival Caymmi, Djalma Maranhão, entre outros.

No mesmo mês, Cascudo também foi lembrado na cidade de Olímpia (SP), onde acontece o mais tradicional Festival de Folclore do país; e o Ludovicus recebeu a comenda Fabião das Queimadas durante o Agosto da Alegria. No quesito relançamentos, houve relançamento de “Religião no Povo” (1974) e a coletânea de crônicas “Actas Diurnas”.

#saibamais#Outro acontecimento que colocou Câmara Cascudo em evidência nacional foi o evento “Pitadas de sabores e alimentos do Brasil”, promovido pelo Sesc Carmo, de São Paulo. De outubro a dezembro, a capital paulista foi palco de shows; debates sobre as influências indígena, portuguesa e africana na alimentação brasileira; entre outras atividades vinculadas ao universo de cultura popular presente na obra de Cascudo.

 Segundo Mariana Ruocco, coordenadora de Alimentação do Sesc Carmo, “o fato das atividades terem sido inspiradas na obra de Câmara Cascudo valorizou os encontros e levou o público a entender melhor a história da alimentação no Brasil, por meio das contribuições étnicas e culturais de índios, africanos e portugueses”.

“Ainda estamos concorrendo com seis projetos inscritos no Prêmio BNB Cultura, nas áreas de literatura, audiovisual e patrimônio, e em editais do Ministério da Cultura – como todo mundo que trabalha com Cultura, estamos correndo atrás”, comentou Daliana.

- Publicidade -
Últimas Notícias
- Publicidade -
Notícias Relacionadas