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Vestibulandos aguardam professores

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Roberto Lucena
Repórter

Amanhã, a Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN) começa a receber as inscrições dos candidatos ao Vestibular 2013. É mais um passo na vida de milhares de jovens que desejam ingressar na maior universidade do Estado. Para alguns, a preparação para disputar uma das 3.015 vagas oferecidas começou há mais de um ano. A rotina é uma maratona de estudos, leituras e aulas. No entanto, essa não é a realidade para boa parte dos alunos da rede estadual de ensino. A três meses das provas, muitos não tiveram sequer uma única aula de disciplinas como Química, Física ou Inglês.
Vestibulandos da Escola Sebastião Fernandes estão desestimulados
A falta de professores com formação específica, aponta a secretaria de Estado da Educação e da Cultura (SEEC), é a principal causa do problema. Na tentativa de contornar a situação e proporcionar mais preparação para os vestibulandos, algumas Diretorias Regionais de Educação Cultura e Esportes (Direds) estão disponibilizando “aulões” nos fins de semana. Para preencher o quadro de pessoal, o Governo do Estado anuncia, nesta semana, uma nova convocação de professores aprovados no último concurso público. Dessa vez, a lista terá 900 nomes.

Na última chamada, a SEEC convocou 1.013 professores. Deste total, 875 foram efetivados. “Os demais não compareceram ou pediram reclassificação no concurso”, explicou Joaquim Oliveira, secretário adjunto da SEEC.   “Nessa chamada, vamos priorizar justamente as disciplinas mais carentes: Química, Física e Biologia”, completou.

Alunos da Escola Estadual Sebastião Fernandes de Oliveira vivem um verdadeiro drama. No início do ano, eram duas turmas de pré-vestibular. Com o quadro reduzido de professores, a direção se viu obrigada a unir as duas turmas. Atualmente, mais de 40 alunos dividem o mesmo espaço. Na tarde da última terça-feira, um professor de Matemática dava aula de geometria analítica. A presença da equipe de reportagem da TRIBUNA DO NORTE instiga os alunos. “Não tem aula de Física”, grita um. “Também não tem Inglês nem Educação Física”, avisa outro.

Com os ânimos exaltados, a classe recebe a equipe e conta as dificuldades. “É um absurdo o que estão fazendo com a gente. Não tivemos nenhuma aula de Física, Espanhol e Inglês. Como faremos Enem e vestibular?”, questiona Luciane Sampaio, 18 anos. “Sem contar que, por conta da falta de professores, tem dias que temos três horários seguidos da mesma matéria. É muito cansativo e improdutivo”, completa a aluna que pretende  prestar vestibular para Psicologia.

Sem a oferta de aulas na escola, alguns se matriculam em cursinhos preparatórios para o Vestibular. É o caso de Calen Pacheco, 19 anos. Para concorrer a uma vaga no curso de Serviço Social, Calen paga R$ 110,00 num cursinho da cidade. “Se não fosse isso, acho que nem faria as provas. É o único jeito de aprender algumas coisa”, diz.

No Churchill, inglês só nos livros

Os alunos do terceiro ano do segundo grau da Escola Estadual Winston Churchill , um das mais tradicionais escolas da rede estadual de ensino, aguardam por outro professor. Até agora, eles não tiveram aula de inglês. A diretora da escola, Maria Eliane, informa que o problema não atinge apenas os alunos de pré-vestibular. “O único professor que atendias às turmas do ensino médio pediu licença médica no mês de março e, até agora, não recebemos o professor substituto. Já comuniquei o fato à SEEC e estou, assim como os alunos, aguardando uma solução”, disse.

Rafael Medeiros, 17 anos, e Matheus Gomes, 16, são alunos da escola. Ambos pretendem fazer vestibular no final do ano. Porém, aquele acha que irá desistir de concorrer por não se sentir preparado. “Ano passado, estudava no interior e lá tive poucas aulas de Química e Física. Vim para Natal, em busca de um estudo melhor, e estou sem aula de Inglês. Desse jeito, melhor nem fazer a prova”, diz Rafael. Matheus está mais confiante e, além do Vestibular UFRN, fará a prova do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem). “Sei que não vou concorrer em pé de igualdade com os alunos da rede privada, mas estou estudando em casa e vamos ver o que acontece”, coloca.
Alunos da Escola Estadual Winston Churchill mostram os livros de Química e Inglês, disciplinas sem professor desde o início do ano
Para ajudar os alunos, algumas Direds ofertam as aulas deficitárias aos fins de semana. De acordo com Joaquim Oliveira, a 12ª Dired, em Mossoró, é pioneira no programa. “Estamos montando aulões nas Direds, onde a SEEC disponibiliza transporte, leva professor de outro município, de outra escola, pagando hora suplementar. O quadro de hora suplementar está alto para cobrir essa deficiência”, diz. Porém, o secretário adjunto deixa claro: os aulões não resolvem o problema. “Apesar dos esforços, mesmo assim, é insuficiente para a demanda que temos”.

Governo vai convocar 900 novos professores

Para suprir a necessidade das escolas que estão sem professores, a titular da SEEC, Betania Ramalho, anuncio uma série de medidas. A principal delas, é a convocação de aproximadamente 900 professores. A nomeação deve ser publicada no Diário Oficial do Estado (DOE) até a próxima quarta-feira. Além disso, de acordo com publicação no DOE da última sexta-feira, houve a prorrogação dos contratos dos professores temporários que estão em exercício.

Em nota divulgada à imprensa, a SEEC informa ainda que está dobrando o número de professores com horas suplementares, onde os servidores que já trabalham em regime de 30 horas semanais, passam a trabalhar 40. “No total, 2.197 professores do estado estão recebendo hora suplementar em 2012”, diz o informe. O Governo do Estado diz também que o remanejamento dos professores que estão fora de sala de aula continua. “Há escolas em que o número de servidores em atividades de apoio pedagógico é superior ao de professores em sala de aula e o nosso foco é a sala de aula”, explica Betania.

Para auxiliar o setor pessoal, a SEEC disponibilizou o Sistema de Gestão de Pessoal (SAGEP). A ferramenta, segundo a secretaria, foi criada para corrigir distorções e identificar onde está lotado cada servidor, qual sua função, carga horária, solicitações de licença, readaptações, férias e aposentadorias. “O SAGEP revelou que há um elevado número de professores que deveriam estar em sala de aula, mas estão em desvio de função. Enquanto isso falta professor para as disciplinas que deveriam ser ofertadas aos alunos. O novo sistema veio para corrigir essas distorções e qualificar a prestação do serviço à população escolar”, afirmou a secretária.

Escola aprova 80% dos alunos no Vestibular

A realidade das escolas públicas estaduais não é atrativa para os alunos e professores. O secretário adjunto da SEEC, Joaquim Oliveira, é taxativo ao afirmar que o modelo de ensino atual está falido. Um reflexo dessa situação é a baixa aprovação dos alunos oriundos da rede pública no Vestibular da UFRN.

Mas há exceções. É o caso do Centro Estadual de Educação Profissional Senador Jessé Pinto Freire (Cenep). De acordo com a direção da escola, no último vestibular, 80% dos alunos foram aprovados.

É fácil entender o sucesso dos alunos. O Cenep difere-se das demais escolas primeiramente na aparência. A estrutura é bem conservada. Corredores e chão estão sempre limpos. Nas salas de aula, há condicionadores de ar e os quadros são brancos. Cadeiras inteiras e alunos, na maioria fardados. O discurso destes também é diferente. Não há reclamações tão comuns em outras escolas. Pelo contrário, ao Cenep, só elogios.

“Podemos dizer  que essa escola é top. Não temos do que reclamar. Temos todas as aulas, os horários estão completos e contamos ainda com aulas de reforço”, diz Deyvika Lima, 19 anos, que irá prestar vestibular para o curso de Serviço Social.

REFORÇO

A professora de Português, Claudia Teresa, explica que os alunos do pré-vestibular recebem reforço de Literatura. “Atualmente, estamos trabalhando as obras literárias que serão cobradas no Vestibular deste ano”, diz.

No Vestibular UFRN 2013, cerca de 50 alunos do Cenep irão disputar uma das vagas oferecidas. Ano passado, dos 55 alunos inscritos, 44 foram aprovados. “E a expectativa é de repetir o sucesso novamente”, colocou.

Bate-papo

Joaquim Oliveira » secretário adjunto da SEEC

Como está o trabalho do censo na secretaria?

Tínhamos a estimativa de 1.700 funcionários que não sabíamos onde estavam. Os que se apresentaram, estavam em alguma função, está normalizado. Apareceram vários casos que cada um responde a um processo para se explicar. Temos cerca de 400 processo de sindicância abertos.

Qual o maior deficit da SEEC?

Quando foi feito levantamento, vimos que o grande déficit são nas matérias de Química, Física e Biologia. Não temos muito pessoal formado. No concurso, em alguns municípios ninguém apareceu porque realmente falta pessoal com formação. Não têm interesse também. Isso é um problema do país inteiro. O que estamos estudando é como complementar a carga horária com outros processos que não seja a forma presencial daquele professor. Ensino à distância, telecurso, tem que criar algo. Não é concurso que vai resolver. É uma carência de mercado.

E qual região do Estado mais preocupante?

A região mais preocupante é a “Tromba do Elefante” e o Mato Grande, devido à carência de mão-de-obra.

A greve do ano passado ainda reflete neste ano?

O reflexo da greve acontece na perda de aprendizagem que o aluno não traz. O reflexo é no aluno e não no calendário da escola. Toda paralisação é fatal para o processo de ensino e aprendizagem.

Por quê não interesse dos profissionais em seguir carreira como professor?

Há uma conceituação social de baixa valoração do professor. A própria sociedade pode reforçar o papel do professor porque isso repercute depois. Mas temos professores que conseguem fazer a diferença. Nós temos um dilema a resolver: trabalhamos com um modelo de escola do século XIX, com professores formados no século XX e alunos do século XXI. É um nó que a sociedade não desatou ainda. O modelo de escola está falido. A escola não atrai mais diante do avanço das tecnologias e mídias. A escola não atrai mais. Então, que proposta colocar para esse nova geração e que professor preparar para esse nova geração?

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