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ANJ debate liberdade de expressão

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Brasília – “Numa democracia se combate o excesso de liberdade com mais liberdade”, afirmou o ministro Carlos Ayres Brito, do Supremo Tribunal Federal (STF), ao presidir, o painel “O Brasil sem Lei de Imprensa”, na manhã de ontem, na sala de sessões da Primeira Turma do STF. Participaram da mesa os juristas Manuel Alceu Affonso Ferreira e Gustavo Binenbojm, e o deputado Miro Teixeira (PDT/RJ).

O jurista Manuel Affonso Ferreira iniciou o primeiro painel lembrando a Lei de Imprensa, em 1967. “Era a lei de segurança nacional ou a lei de imprensa, que tinha alguns bons preceitos como a defesa prévia, uma regulamentação minuciosa do direito de resposta e a exigência de comprovação de dolo na difusão de informações que eram tachadas como calúnia ou difamação”, disse o advogado. Para ele, no entanto, a lei tinha uma série de maus comandos como a proibição de publicação de informações contrárias ao presidente da República e outras autoridades.

Segundo o advogado, há alguns projetos em tramitação no Congresso Nacional para regrar aspectos da atuação jornalística, e listou características que devem promover a defesa da comunicação democrática, e não a repressão da atividade.

O jurista Gustavo Binenbojm lembrou que ao dar fim à Lei de Imprensa, em 2009, o Supremo Tribunal Federal indicou ao Legislativo que qualquer proposta de lei deve promover a ampliação e não a repressão à liberdade de imprensa. Binenbojm ressaltou que diversas formas disfarçadas de censura tem se manifestado nos últimos tempos, mas que têm uma característica comum, negar a si mesma como censura.

Gustavo Binenbojm criticou a primeira instância judiciária que tem sentenciado em favor da censura a alguns jornais, prestando um desserviço à liberdade de expressão e de imprensa. E discordou da edição de nova lei de imprensa, no momento, como proposta por Ferreira.

Já o deputado Miro Teixeira (PDT/RJ), que fez a defesa oral junto ao STF pelo fim da lei de imprensa, considerou que toda e qualquer lei de imprensa é nociva. Miro Teixeira defendeu, isto sim, a aprovação de uma lei de acesso a informações e documentos públicos, ampliando as possibilidades da imprensa e da sociedade em terem mais informações. Mais do que isto, considerou que deve haver um movimento internacional pela descriminalização da injúria e calúnia, que têm sido motivo de prisão de jornalistas em todo o mundo.

Finalmente, o ministro Carlos Ayres Brito se manifestou, considerando que enquanto não há lei que dê mais clareza às indenizações por calúnia e difamação, as leis atuais ajudam a administrar a situação. Considerou que a demora na aprovação se dá porque a apropriação da idéia de um direito pela população se dá aos poucos.

Ayres Brito ressaltou que democracia não existe sem imprensa e vice-versa: “são siamesas”, afirmou. Para ele, a resposta às acusações de que há excesso de liberdade é ampliar ainda mais as liberdades.

O ministro lembrou que a lei de imprensa e a Constituição de 88 eram inconciliáveis, pois a primeira tinha a proposta de fechar, uma proposta de poder, enquanto que a segunda propunha a abertura, a livre expressão. Neste sentido, afirmou que a liberdade de imprensa vai se sobrepor até ao Judiciário, que hoje de forma pontual tem dado sentenças tímidas e envergonhadas em favor da censura.

Jurista venezuelano defende imprensa livre

A liberdade de expressão é uma componente dos direitos individuais que garante e permite a todo e qualquer cidadão conhecer a opinião alheia e possa difundir as suas próprias, enfatizou, o jurista venezuelano Pedro Nikken, ex-presidente  da Corte Interamericana de Direitos Humanos. De acordo com o jurista, uma sociedade não pode se considerar livre se não é amplamente informada, pois a liberdade de imprensa é, para ele, a pedra angular da sociedade. Entre os casos que citou está o de dois cidadãos chilenos, que não aceitaram a censura ao filme “A última tentação de Cristo”, do diretor Martin Scorsese, e recorreram ao Judiciário, até a Suprema Corte chilena. Insatisfeitos com a manutenção da censura naquelas instâncias, recorreram a Corte Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) e receberam sentença favorável ao direito de verem o filme. A Corte internacional determinou ainda ao Chile que alterasse sua Constituição para adequá-la ao direito internacional.

Nikken exemplificou, ainda, com a Corte Européia, que definiu serem as leis aprovadas pelos poderes legislativos, e não normas de status jurídico inferior, o único instrumento válido para a implantação de novas regras sobre temas relacionados à liberdade de expressão. Ele questionou se o desacato seria questão de responsabilidade civil ou penal e lembrou que, na Europa, casos vinculados a honra do funcionário público até porte médio são julgadas conforme o código civil. Já as situações consideradas extremas, tais como ofensas a honra de altos funcionários, passam pelo código penal. A Corte Interamericana, entretanto, não acolhe o delito de desacato e considers que funcionários e personalidades públicas têm “muro” mais baixo, exposição maior e devem ser mais tolerantes a críticas.

A advogada e consultora da Folha de São Paulo, Taís Gasparian, a segunda participante do painel, citou casos envolvendo jornais brasileiros que enfrentaram problemas no exercício da liberdade de expressão e lembrou que, apesar de alguns processos contra censura prévia estarem há mais de um ano esperando julgamentos, o artigo 13 da Convenção Americana de Direitos Humanos veda a censura prévia e admite apenas a responsabilização ulterior por informações publicadas, restrições ao acesso de crianças e adolescentes e a penalização dos que fizerem apologia ao ódio.

Já o advogado Alexandre Jobim lembrou que a Corte Interamericana, a partir de 2001, julgou diversos casos relacionados à liberdade de expressão de um modo geral com decisões mais liberais que as das cortes nacionais. Em relação ao Brasil, ele destacou que o direito de resposta não é usado para fazer a defesa, mas fazer outra ofensa , e considerou que o país deve preparar-se para mudar a legislação eleitoral, que está defasada.

Ao fechar o painel e o Fórum Internacional, o diretor do Comitê de Relações Governamentais da ANJ, Paulo Tonet Camargo, considerou o evento extremamente produtivo, permitindo a troca de experiências com outros países e aí, possivelmente, a constatação de que o Brasil está menos preocupado com turbulências políticas ou no judiciário por estar em uma situação de normalidade institucional.

Lembrou que o dia foi muito significativo devido à afirmação do presidente do STF, Cezar Peluso, de que a liberdade de expressão é a pedra angular do estado de direito, o que eleva o valor institucional e o compromisso político com essa liberdade, fomentada com o fim da lei de imprensa em 2009. Tonet Camargo enfatizou a importância do “Norte dado pelo Supremo para a autorregulamentação” e sugeriu que este seja o melhor caminho para a solução de conflitos.

Luta do Clarín é reconhecida pela ANJ

O jornal Clarín, da Argentina, recebeu ontem o Prêmio ANJ de Liberdade de Imprensa. A presidente da Associação Nacional de Jornais, Judith Brito, justificou a escolha lembrando que o Clarín simboliza os problemas que a imprensa argentina enfrenta para exercer sua missão da melhor forma um jornalismo independente, de qualidade e não submisso a governos.  Judith citou Ruy Barbosa com a frase “jornais são os olhos e ouvidos de uma Nação”, na cerimônia realizada na sala de sessões da Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal, em Brasília, com a presença do presidente do STF, Cezar Peluso, e do ministro Ayres Brito, que relatou o processo que declarou inconstitucional a Lei de Imprensa de 1967.

Judith Brito convidou os filhos do recentemente falecido (16/03) vice-presidente de Relações Institucionais do Grupo Abril, Sidnei Basile, Juliano e Felipe para entregarem o Prêmio ANJ ao presidente do Grupo Clarín SA, Hector Magnetto e ao editor-geral Ricardo Kirschbaum. Segundo a presidente da Associação e os filhos do jornalista, antes de falecer Basile se manifestara motivado com a realização do evento na sede do Supremo, e era ferrenho defensor da liberdade de imprensa e de expressão.

O diretor-presidente do Clarín, Hector Magnetto, disse que na Argentina, hoje, importam as conexões e influências políticas e jurídicas, “mas a história me ensinou que para fazer democracia é necessário ter justiça independente e imprensa livre, e esse prêmio de hoje tem a ver com esses requisito básico: a liberdade”.

O editor-geral Ricardo Kirschbaum lembrou que receber o prêmio lhe deu orgulho porque a indicação veio de jornalistas que vivenciaram a repressão promovida pelos regimes militares e lutaram pela liberdade de expressão, lembrando-se do Clarín neste momento. Kirschbaum apontou o descrédito em setores de jornalismo oficial ou vinculados, que tem trazido descrédito ao governo de Cristina Kirchner, cuja marca é o fervor por excluir mais do que incluir cidadãos.

Os ataques à liberdade de imprensa e de expressão foram citados pelo editor-geral que afirmou ser prática “atacar o mensageiro sem ler a mensagem”, mas definiu seu espírito de luta ao informar que o compromisso está com seus filhos, em entregar um país melhor a eles. Os premiados pela ANJ desde 2008 são o ministro do STF, Carlos Ayres Brito, em 2009 o deputado Miro Teixeira (PDT/RJ), e em 2010 a Sociedade Interamericana de Imprensa/ SIP.

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