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Uma casa para Nísia

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Yuno Silva
repórter

“Uma mulher à frente de seu tempo”. A frase pode até estar desgastada, mas define o perfil de Dionísia Gonçalves Pinto. Natural de Papari, Dionísia ganhou o mundo na pele de Nísia Floresta Brasileira Augusta e deu os primeiros passos na luta pela valorização do papel da mulher dentro da sociedade; sua obra desperta o interesse de pesquisadores de todo o mundo e suas ideias refletem até hoje nas conquistas pela igualdade de direitos. Nísia também levantou questões consideradas tabus no século 19, como a defesa dos direitos dos índios, o fim da escravidão e a instituição de uma nação republicana.
Antes de ser inaugurado, Museu Nísia Floresta vem promovendo oficinas culturais e já recebe visitantes de outros países
Apesar do pioneirismo e do indiscutível reconhecimento, a educadora e escritora potiguar ainda é pouco conhecida na própria cidade rebatizada com seu nome – infortúnio que pode ser revertido a partir da criação de um museu em sua homenagem, o primeiro do gênero no Rio Grande do Norte. Previsto para ser inaugurado até dezembro deste ano, o projeto foi aprovado em 2009 no edital “Mais Museu” (Iphan/MinC) em segundo lugar num universo de 290 inscritos.

“A decisão para se criar o museu surgiu em 2009, a partir de uma demanda identificada durante a realização de um fórum cultural em Nísia Floresta”, lembra Raimundo Melo, um dos coordenadores do Centro de Documentação e Comunicação Popular, instituição proponente do projeto orçado em R$ 125 mil. A criação do museu conta com parceria da Arquidiocese de Natal, da Paróquia Nossa Senhora do Ó e a prefeitura daquele município distante cerca de 30km da capital.

Melo contou que o cronograma de implantação teve que ser prorrogado por oito meses, por mudanças no endereço original da proposta. “Assim que recebemos a notícia da aprovação, surgiu um fator novo: a Paróquia verificou que não poderia ceder o centro pastoral por 20 anos – período previsto no edital –, então começamos a buscar uma alternativa junto com a prefeitura de Nísia Floresta e Arquidiocese. A solução encontrada foi desalojar a secretaria Municipal de Educação de um antigo casarão (Casa Marista) na praça principal da cidade”, disse Raimundo. Segundo ele, a prefeitura se comprometeu a custear o aluguel e a pintar todo o imóvel pertencente à igreja.

Desocupado em novembro de 2010, as obras de reformas do sobrado iniciaram em março deste ano casa – e como não estavam previstas no projeto inicialmente apresentado, a equipe responsável terá que firmar parceria para garantir não só a instalação como também sua manutenção. “O desafio agora é sensibilizar a Fundação José Augusto e a Secretaria Estadual de Turismo para não só incluir o museu no roteiro, como ajudar na manutenção que garanta o funcionamento do espaço cultural”, verifica Raimundo Melo, ressaltando que o valor aprovado (R$ 125 mil) é apenas para instalação do equipamento.

Mobilidade e interação

No momento há um profissional contratado pelo Iphan, Hélio Oliveira, concebendo o projeto museográfico. “Paralelamente estamos buscando acervo com pessoas que ainda resistem em compartilhar parte desse capítulo importante da nossa história”, adianta a professora Rejane de Souza, nascida em Nísia Floresta e uma das coordenadoras do museu. “Nossa intenção é criar um espaço multiuso para integrar toda a comunidade, com espaço para exibição de vídeos, galeria de arte, sala de leitura e biblioteca”, complementa.
Museu (casa verde, à esquerda) ficará na praça central, ao lado da Escola Nísia Floresta e em frente à igreja matriz
Para fugir do lugar comum, a proposta para movimentar o Museu Nísia Floresta inclui elementos multimídia e formas interativas de apresentar o acervo. “Temos que pensar em maneiras de tornar o espaço atrativo não só para visitantes para a própria população da cidade. Queremos atender as escolas da região e oferecer oportunidade aos professores trabalharem assuntos que envolvem a memória, a identidade cultural e a própria auto-estima da população”, planeja Rejane. Dentro da proposta ainda há previsão de se criar uma sala para desenvolvimento de pesquisas sobre Nísia Floresta e seu legado  e aquisição de equipamentos, “que irão tornar o museu atraente não só para estudiosos como para jovens interessados em produzir conteúdo audiovisual”, aposta Raimundo Melo.

Intercâmbio cultural

Antes mesmo de começar a funcionar, o Museu Nísia Floresta já movimenta a cidade: entre dezembro de 2010, quando o endereço do espaço cultural foi enfim definido, e março de 2011, início da reforma do imóvel, uma série de atividades foram realizadas pelos coordenadores do projeto.

“Promovemos oficinas de artes, exibição de filmes, contação de histórias e apresentações culturais. Recebemos a visita de escolas, da professora e pesquisadora gaúcha Graziela Rosa (que estuda o legado de Nísia Floresta), e iniciamos o intercâmbio com jovens da Alemanha, país visitado por Nísia Floresta quando ela morou na Europa – inclusive há um livro sobre essa viagem publicado em francês de 1857”, esclareceu Rejane de Souza. Essa interação com  os alemães será intensificada em janeiro de 2012, quando o museu já deverá estar funcionando.  

Entre os parceiros do museu figuram o Canal Futura e a Programadora Brasil, que irão contribuir com a movimentação da sala audiovisual; e a Fundação Banco do Brasil, colaboradora do acervo do museu. “A Fundação BB já autorizou a utilização das pesquisas publicadas em 2006 no ‘Projeto Memória’”, comemora Raimundo Melo.

Cidadã do mundo, Nísia Floresta (1810-1885) lançou 15 títulos e seu primeiro livro, “Direito das mulheres e injustiça dos homens”, foi publicado quando tinha apenas 22 anos. Morou em Recife, Porto Alegre e Rio de Janeiro antes de ir morar na Europa em 1856 – onde publicou livros em francês e italiano, e  permaneceu por duas décadas antes de voltar ao Brasil para temporada de três anos. Em 1875 retorna ao Velho Continente, onde falece dez anos mais tarde. Seus restos mortais são trazidos para o Brasil apenas em 1954, e são definitivamente sepultados em mausoléu na cidade que leva seu nome.

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